Uma tecnóloga médica coloca amostras em uma máquina de PCR (reação em cadeia da polimerase), em 23 de fevereiro de 2006, em Ithaca, Nova York ( Stam Honda/AFP / )

O diagnóstico por PCR é usado há anos para a varíola do macaco, entre outras doenças

Publicações que ironizam a velocidade com que supostamente foram desenvolvidos os testes de PCR para detectar o vírus da varíola do macaco e que advertem sobre resultados “falsos positivos, como o da covid” foram compartilhadas dezenas de vezes em redes sociais desde 24 de maio de 2022. No entanto, esse tipo de teste já era utilizado para diagnosticar essas e outras doenças. Além disso, especialistas explicaram à AFP que, assim como na detecção do SARS-CoV-2, a probabilidade de se obter “falsos positivos” é quase nenhuma.

“Os chineses são tão rápidos que já é possível identificar o vírus Monkeypox através de testes PCR, os mesmos usados para o covid19”, diz uma das publicações que circulam no Facebook e Twitter (1, 2).

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Captura de tela feita em 1° de junho de 2022 de uma publicação no twitter ( . / )

Conteúdos similares também são compartilhados em espanhol.

A varíola do macaco, chamada também de “ortopoxvirosis símia", é uma doença viral zoonótica que foi identificada pela primeira vez em humanos em 1970 na República Democrática do Congo e atualmente é considerada endêmica em dezenas de países africanos.

No entanto, a sua aparição em 2022 nos países em que a doença não é endêmica preocupa especialistas. Até o momento, os casos confirmados nas áreas não endêmicas são, em sua maioria, leves e não causaram mortes.

No último 27 de maio a Argentina se tornou o primeiro país da América Latina a registrar casos. O Brasil tem três casos suspeitos, segundo o Ministério da Saúde. Um está no Ceará, outro em Santa Catarina e outro no Rio Grande do Sul.

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Ficha sobre os sintomas e dados disponíveis sobre varíola do macaco. ( AFP / John SAEKI, Gabriel CAMPELO)

A Organização Mundial da Saúde explica que a forma mais adequada de diagnosticar a varíola do macaco, além do diagnóstico clínico, é mediante um teste de PCR. Isso ocorre dessa forma há anos (1, 2), muito antes da pandemia de covid-19, quando essa ferramenta se tornou uma das mais usadas para detectar o SARS-CoV-2.

O PCR é uma técnica biológica molecular que é utilizada desde a década de 1980.

“A metodologia mais sensível e específica que existe para diagnosticar enfermidades ou o agente causador de uma doença, seja ele vírus, bactéria ou outro microorganismo, é o PCR, que basicamente se baseia no desenvolvimento de moléculas que vão reproduzi-las unicamente, vão reconhecer a sequência genética desse microrganismo", disse à AFP Álvaro Fajardo, doutor em Ciências Biológicas e pesquisador do Laboratório de Virologia Molecular (LVM) do Centro de Investigações nucleares do Uruguai.

A virologista chilena Vivian Luchsinger, acadêmica da Universidade do Chile, explicou que “é uma técnica que permite detectar o fragmento do genoma do vírus ou bactéria”.

“O que faz com que se busque um fragmento de genoma do SARS-CoV-2, do vírus da varíola do macaco ou de qualquer outro agente? Umas sequências que se chamam partidores [ou primers]”, detalhou. “Estas sequências são complementares, se desenham especificamente com a sequência do que se quer amplificar. Isso dá a especificidade. Se eu quero buscar o SARS-CoV2 uso divisores para detectar genes do sars-cov-2, se quero detectar o vírus da varíola do macaco uso divisores específicos para ele”.

Kits sob medida

Juan Sabatte, médico e doutor em microbiologia do Conselho Nacional de Pesquisas Científicas e Técnicas da Argentina, disse à AFP: “É possível fabricar kits de diagnóstico baseados na técnica do PCR para diferentes microorganismos, desenhando cada PCR de tal forma que se reconheça uma sequência de DNA particular do microorganismo que se tenta detectar”.

Algumas das publicações virais se referem ao lançamento no mercado de testes PCR para a varíola de macaco pela gigante farmacêutica Roche. Estes testes permitem detectar o orthopoxivirus, gênero que inclui o que causa a varíola do macaco. Kits desse tipo já haviam sido desenvolvidos antes da pandemia de covid-19(1, 2, 3).

“Posso buscar o agente que quiser utilizando distintos partidores. Não é nenhuma novidade que se realize um PCR para o vírus varíola do macaco, como se realiza para o sarampo, rubéola ou o que seja”, assegurou Luchsinger.

Fajardo, por sua vez, observou que, apesar da técnica ter ficado muito conhecida durante a pandemia de covid-19, ela existe há mais de 20 anos. “É uma técnica que se utilizava em muitos laboratórios de biologia molecular anteriormente à pandemia”, disse.

As afirmações falsas de que os testes PCR levam a “falsos positivos” ao detectar outros elementos diferentes do SARS-CoV-2, foram verificadas em diferentes oportunidades pela AFP Checamos (1, 2)

Esse argumento se repete agora em referência ao vírus causador da varíola do macaco.

Kenneth Witwer, professor de Patologia e Neurologia Molecular e Comparativa da Escola de Medicina da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, disse à AFP em janeiro de 2020 que não é certo que a maioria desses testes produzam falsos positivos porque quem, como ele, trabalha com o PCR toma “medidas para garantir que os testes sejam extremamente específicos”.

Sabatte, por sua vez, assegurou que “a detecção de falsos positivos é praticamente nula”.

Luchsinger explicou que em teoria os testes poderiam dar esse tipo de resultado em caso de contaminação das amostras, mas explicou que, no procedimento, os laboratórios utilizam diversos controles antes de informar o resultado, justamente para preveni-lo.

Sobre o uso do PCR em possíveis casos de varíola do macaco, Fajardo expressou: “No contexto atual, em que começaram a aumentar o número de casos a nível mundial, é provável que mais laboratórios no mundo e mais países possam ter a técnica específica para diagnosticar”.

O AFP Checamos já verificou outras peças de desinformação sobre a varíola do macaco (1, 2).

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