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Consumir vitamina C e água morna com limão não previne contra o novo coronavírus
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- Publicado em 12 de março de 2020 às 20:29
- 4 minutos de leitura
- Por Sadia MANDJO, AFP Brasil
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“O vírus Corona ou COVD-19 chegará a qualquer país mais cedo ou mais tarde, e não há dúvida de que muitos países não possuem nenhum kit ou equipamento de diagnóstico sofisticado. Por favor, use o máximo de vitamina C natural possível para fortalecer seu sistema imunológico”, diz parte da mensagem, replicada mais de 95 mil vezes em postagens que circulam desde 29 de fevereiro no Facebook (1, 2, 3).
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Captura de tela feita em 11 de março de 2020 mostra publicação no Facebook
Compartilhado também no WhatsApp, o texto continua dizendo, “é importante ter maior conhecimento da doença: o professor Chen Horin, CEO do Hospital Militar de Pequim, disse: ‘Fatias de limão em um copo de água morna podem salvar sua vida’”.
Embora a vitamina C reforce o sistema imunológico, “seu consumo excessivo nunca demonstrou eficácia contra o coronavírus”, explicou à AFP Henry Chenal, diretor do Centro Integrado de Pesquisa Bioclínica de Abidjã, na Costa do Marfim.
“Além disso, o limão não é a fruta que contém mais vitaminas C. É o kiwi. Então, se essa história tivesse fundamento, era essa fruta que deveria ser consumida”, afirmou.
O médico avalia que, atualmente, “o único remédio para evitar a propagação do coronavírus é lavar as mãos antes e depois das refeições, antes e depois de ir ao banheiro e se isolar em caso de sintomas”.
A OMS também lista em seu site recomendações de como se proteger do coronavírus.
A mensagem viralizada, que também circula amplamente em francês, inglês e espanhol, contém diversas outras incoerências.
Universidade de Zanjan na China
O texto compartilhado nas redes sociais é atribuído a uma pessoa chamada “Laila Ahmadi da China” que estudaria na “Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Zanjan”.
Uma busca no Google mostra, no entanto, que não existe uma universidade de Zanjan na China. Uma faculdade do mesmo nome existe no Irã, na cidade de Zanjan, no noroeste do país.
Uma pessoa chamada Leila Ahmadi (e não Laila, como escrito nas publicações viralizadas), trabalha no departamento de Ciências Médicas desta instituição.
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Captura de tela do site da universidade de Zanjan feita em 9 de março de 2020
No site da universidade, ela é citada como professora-pesquisadora na área hospitalar e mestre em Obstetrícia, aparentemente sem qualquer relação com a China ou com a medicina epidemiológica.
A AFP tentou entrar em contato com Ahmadi e com a universidade de Zanjan, mas não recebeu uma resposta até o fechamento desta matéria.
Origem animal do novo coronavírus
O texto afirma que a Covid-19, doença provocada pelo novo coronavírus, “parece ser causada pela fusão do gene entre uma cobra e um morcego”.
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Até o momento, as origens do vírus são desconhecidas. O morcego é considerado como uma fonte provável, uma vez que um estudo recente apontou que os genomas do coronavírus e daqueles que circula neste animal são 96% semelhantes.
No entanto, pesquisadores acreditam que um outro animal desempenhou papel intermediário na transmissão do vírus ao homem, como explica esta matéria da AFP.
No início da epidemia, a cobra aparecia na lista de animais que poderiam ter participado da propagação do coronavírus. No entanto, essa hipótese foi rapidamente descartada.
Limão com água morna não cura o câncer
Na segunda parte, o texto viralizado afirma que a água morna com limão pode igualmente ser utilizada para tratar o câncer.
Essa informação falsa foi verificada pela AFP em dezembro de 2019. Na época, a alegação havia sido compartilhada mais de 190 mil vezes no Facebook.
Em algumas versões, a receita era creditada ao médico “Tcheo Horin”, indicado como diretor-geral do Hospital do Exército de Pequim - semelhante ao “Chen Horin” mencionado nas postagens atuais. Nesta verificação, a AFP não encontrou registros da existência de um médico com este nome.
Por outro lado, o médico Guillermo de Velasco, secretário científico da Sociedade Espanhola de Oncologia Médica (SEOM) disse à AFP que “não existe um único alimento que possa ser utilizado para curar o câncer”, recordando que a alimentação “é importante” diante da doença.
“O corpo humano é complexo e o câncer ainda mais, por isso as respostas simples geralmente não existem, como a de que uma combinação como o limão e a água quente pode determinar o desenvolvimento ou a cura”, acrescentou.
A equipe de checagem da AFP já verificou outras informações viralizadas a respeito do novo coronavírus.
Desde que foi detectado na cidade chinesa de Wuhan no final de 2019, o novo coronavírus deixou mais 4 mil mortos no mundo, com 117 mil casos de contaminação confirmados.
Em resumo, é falso que tomar “o máximo de vitamina C natural” bebendo água morna com limão previna o novo coronavírus. O texto que traz esta recomendações possui, ainda, diversas outras incoerências.