Este mapa não mostra a propagação do novo coronavírus, mas sim rotas de voos
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- Publicado em 28 de fevereiro de 2020 às 17:40
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- Por AFP Austrália, AFP Espanha, AFP Brasil
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“A Universidade de Southampton usou big data para desenhar um mapa que mostra para onde foram as pessoas que fugiram de #Wuhan antes do bloqueio. Os pesquisadores estimam que 6 milhões de pessoas chegaram em ~ 382 cidades na Ásia, Europa, EUA e Austrália. O surto de #Coronavírus pode acontecer nos próximos 3 meses!”, assinalam as publicações, compartilhadas no Facebook (1, 2, 3) e no Twitter centenas de vezes desde a metade do mês de fevereiro.
Captura de tela feita em 27 de fevereiro de 2020 no Facebook
Em espanhol, a mesma ilustração circulou, inclusive, em um artigo da página Alerta Geo, que diz em seu texto: “O incrível gráfico revela como cinco milhões de residentes de Wuhan fugiram da zona zero antes que a cidade chinesa fosse fechada”.
E, sem dar mais detalhes, indica que os dados são baseados “nos celulares e dados de voo de 60.000 dos cinco milhões de habitantes que fugiram de Wuhan”, localidade chinesa considerada o foco da atual epidemia do novo coronavírus.
O mapa, vinculado aos movimentos de residentes de Wuhan, também circulou em inglês, em um tuíte de 12 de fevereiro.
Estas alegações apareceram igualmente em matérias que informavam sobre um novo estudo do potencial de expansão do novo coronavírus em meios de comunicação ingleses (1) e australianos (1, 2, 3). O mesmo mapa, com um texto semelhante, também foi visto nesta postagem do Facebook e nestes tuítes.
Pesquisa universitária
As publicações mencionadas - em português, espanhol e inglês - atribuem o mapa ao Projeto WorldPop, uma equipe de pesquisa da Universidade de Southampton, no Reino Unido, que elabora diferentes mapas de população e estatísticas.
Em janeiro passado, a equipe publicou um estudo, atualizado em 5 de fevereiro, no qual identificava cidades e províncias na China, assim como outras cidades e países que têm alto risco de registrar casos do novo coronavírus.
No texto, contudo, não aparece o mapa com os traços vermelhos viralizado em fevereiro.
A origem do mapa
A imagem mostra, na realidade, as rotas de voos ao redor do mundo, de acordo com as fontes consultadas pela equipe de checagem da AFP.
“O mapa simplesmente mostra a rede aérea global e a conexão entre países utilizando esta forma de viajar”, explicou por e-mail à AFP um porta-voz da Universidade de Southampton, em 13 de fevereiro passado. “Creio que tenha sido usado como ilustração geral em um tuíte e, de algum modo, a história incorreta saiu dali”, acrescentou o porta-voz.
O mapa dos voos foi utilizado em um tuíte de 5 de fevereiro, agora apagado, pela conta da WorldPop para ilustrar a atualização do relatório sobre o risco de expansão do novo coronavírus dentro e fora da China.
Muitas pessoas criticaram a escolha deste mapa, considerando que era “irresponsável” e “alarmista”. Depois de apagar o tuíte, a conta publicou esta explicação, traduzida do inglês: “Compreendida a preocupação - simplesmente pretendia ser uma ilustração da rede aérea global, mas podemos republicar com uma nova imagem”.
No tuíte apagado pela conta da WorldPop aparece uma resposta do pesquisador italiano e especialista em estudo de dados Michele Tizzoni assinalando que o mapa “mostra apenas a rede aérea em todo o mundo” e “todas essas conexões em vermelho o tornam um pouco alarmista, mas sem dar esta explicação” sobre as conexões de voos.
Contatado pela AFP, Tizzoni, que não está envolvido no projeto WorldPop, forneceu este link de 2012 como fonte original da ilustração, onde explica-se que as linhas vermelhas são rotas de voo em 2011, traçadas usando a ferramenta VBD-AIR.
Captura de tela feita em 26 de fevereiro de 2020 da publicação com data de 2012
Em 28 de fevereiro, o balanço da epidemia do novo coronavírus superava os 2.700 mortos na China, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), embora já existam cerca de outros 50 países afetados, com um balanço provisório de mais de 4.000 contágios e mais de 60 mortos, informou a AFP neste artigo.
Em resumo, as publicações que contêm o mapa juntamente com a afirmação de que ele mostra a propagação do novo coronavírus são enganosas, pois, na verdade, a ilustração apresenta trajetos aéreos e não têm nenhuma ligação com a epidemia da COVID-19.