Funcionária posa junto a dois cartazes que apontam para um centro de vacinação contra a covid-19 no edifício do governo metropolitano de Tóquio, em 15 de julho de 2021 ( AFP / Behrouz Mehri)

O Japão não parou a vacinação nem aprovou o uso de ivermectina contra a covid-19

Publicações nas redes sociais compartilhadas dezenas de vezes ao menos desde o final de outubro de 2021 afirmam que o Japão parou de vacinar a sua população contra a covid-19 e está usando o antiparasitário ivermectina para enfrentar a pandemia. Essa seria a razão, segundo as alegações, da redução no número de contágios no país asiático entre agosto e outubro deste ano. Mas isso é falso. Em novembro de 2021, o Japão continuou a aplicar os imunizantes contra a covid-19 e não autorizou a ivermectina como tratamento para o coronavírus.

“O JAPÃO SAE DA CAMPANHA DE VACINAÇÃO E MUDA PARA IVERMECTINA. COVID DESAPARECE EM MENOS DE UM MÊS”, dizem as legendas de algumas das publicações viralizadas no Facebook (1, 2), no Twitter (1) e em sites (1).

Parte das postagens replica um artigo escrito originalmente em italiano.

Image
Captura de tela feita em 22 de novembro de 2021 de uma publicação no Facebook ( . / )

Conteúdo com alegações semelhantes circulou igualmente em espanhol e em inglês (1).

A campanha de vacinação contra a covid-19 no Japão teve início em 17 de fevereiro de 2021 e não parou até a data de publicação deste artigo. As autoridades colocaram à disposição dos residentes os imunizantes da Pfizer, Moderna e AstraZeneca, em um processo totalmente gratuito e financiado pelo Estado japonês.

Até 22 de novembro de 2021, 99,5 milhões de residentes no Japão tinham tomado pelo menos a primeira dose e 96 milhões completaram o esquema vacinal, segundo dados oficiais.

Aqueles que contam com pelo menos a primeira dose da vacina contra a covid-19 representam 79% da população japonesa, de acordo com dados do projeto Our World in Data, da Universidade de Oxford.

O primeiro-ministro japonês, Fumio Kishida, anunciou em sua primeira coletiva de imprensa após tomar posse do governo, em 4 de outubro de 2021, que iria estabelecer um pacote abrangente contra a covid-19 e fortaleceria a vacinação e a capacidade médica, “assumindo e estimulando todos os tipos de cenários possíveis”.

O Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar Social (MHLW) do Japão aprovou no último dia 11 de novembro a terceira dose de reforço da vacina Pfizer para maiores de 18 anos, que começaria a ser administrada às equipes médicas da linha de frente em dezembro. Além disso, a farmacêutica norte-americana Moderna está aguardando aprovação para a terceira dose de sua vacina no país.

A quinta onda e a queda de casos

Até 22 de novembro, o Japão havia registrado mais de 1,7 milhão de contágios desde o início da pandemia, segundo dados oficiais do Ministério da Saúde nipônico.

Entre junho e agosto de 2021, o Japão viveu uma quinta onda de casos de coronavírus, a pior até o momento em termos de contágios, agravada pela propagação da variante delta.

Diante do aumento de casos e às vésperas dos Jogos Olímpicos de Tóquio, no final de julho o governo japonês voltou a declarar estado de emergência na capital e em outras quatro regiões, uma medida que foi prorrogada até 31 de agosto de 2021.

Em 20 de agosto de 2021, o Japão atingiu o pico de contágios por dia, com 25.975 novos casos. Desde então, o número diminuiu gradualmente até chegar em 75 novos casos relatados em 1º de novembro de 2021, a menor cifra de infecções por dia em 2021, de acordo com os dados divulgados até o momento pelo MHLW do Japão.

Em 28 de setembro de 2021, o país anunciou o fim do estado de emergência após o controle e a queda da quinta onda de contágios. O então primeiro-ministro, Yoshida Suga, informou que “a ocupação de leitos hospitalares em todas as regiões voltou a menos de 50%” e que os casos graves de covid-19 estavam diminuindo.

A assessora de políticas de saúde na organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) Angela Uyen Cateriano explicou à AFP que o sucesso do país no controle dos contágios se deve à rapidez de seu processo de vacinação e à campanha de conscientização dos jovens levada à frente pelo governo diante da pandemia (1, 2).

“O Japão tem uma alta taxa de vacinação e eles têm tido uma administração muito boa focada no rastreamento de contatos e na detecção precoce de casos”, indicou a especialista.

Além disso, Uyen salientou que os países asiáticos estão em vantagem sobre os países ocidentais em termos de transmissão e gerenciamento do vírus porque essa “não é uma situação nova para a Ásia. As últimas epidemias, como a SARS em 2003 (especialmente China, Hong Kong e Taiwan) e a MERS, em 2015, levaram muitos países asiáticos a investir em infraestrutura sólida de atendimento médico e saúde pública”.

Atualmente, o Japão se prepara para uma possível sexta onda de contágios durante o inverno no hemisfério norte fortalecendo seu sistema médico, a vacinação com as doses de reforço e testes PCR gratuitos para aqueles que não podem ser vacinados devido a razões médicas.

A ivermectina não é um tratamento aprovado

As publicações viralizadas mencionam a ivermectina, um antiparasitário de amplo espectro, para “prevenir e curar” o coronavírus. Entretanto, esse remédio não está na lista de produtos médicos aprovados para tratar a covid-19 da Agência Japonesa de Produtos Farmacêuticos e Dispositivos Médicos (PMDA), encarregada de supervisionar e regulamentar os medicamentos no país.

“Segundo os relatórios, o ensaio clínico da ivermectina está em andamento. Contudo, a ivermectina não está aprovada para tratar a doença causada pela infecção pelo SARS-CoV-2 (covid-19)”, disse um porta-voz da PMDA à AFP por e-mail em 9 de novembro de 2021.

Além disso, o ex-ministro da Saúde e membro da Câmara de Representantes do Japão Norihisa Tamura assinalou durante um comitê parlamentar em agosto de 2021 que eram necessárias mais provas para demonstrar que a ivermectina é eficaz para que seja prescrita no tratamento da covid-19.

Em 31 de março de 2021, a Organização Mundial da Saúde (OMS)desaconselhou o uso da ivermectina para tratar a covid-19 após revisar os dados reunidos de 16 testes controlados e concluir que seus benefícios eram “muito pouco confiáveis”.

Da mesma forma, a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) não aconselha o uso da ivermectina para a prevenção ou o tratamento da covid-19, e só a aprova para tratar algumas infestações parasitárias e condições de pele como a rosácea.

A EMA informou em 22 de março de 2021 que eram necessários mais estudos aleatorizados “bem concebidos” para tirar conclusões sobre a eficácia e a segurança do produto.

Um artigo da Agência de Medicamentos e Alimentos (FDA) dos Estados Unidos, atualizado em 14 de setembro de 2021, levanta uma série de questões sobre o uso da ivermectina no tratamento do coronavírus e reitera que “a FDA não autorizou nem aprovou o uso da ivermectina para prevenir ou tratar a covid-19 em humanos ou animais”. Inclusive, orienta que “tomar grandes doses de ivermectina é perigoso”.

O especialista em virologia e membro da Sociedade Mexicana de Saúde Pública (SMSP) Andreu Comas explicou à AFP que a ivermectina pode afetar a saúde das pessoas porque “aquelas que tomaram essas doses por tempo prolongado apresentaram quadros de toxicidade, sobretudo cardíaca e renal”.

O Checamos já verificou diversas alegações sobre a eficácia da ivermectina no tratamento da covid-19 (1, 2, 3).

Esta verificação foi realizada com base em informações científicas e oficiais sobre o novo coronavírus disponíveis na data desta publicação.

Há alguma informação que você gostaria que o serviço de checagem da AFP no Brasil verificasse?

Entre em contato conosco