Não existem provas de que os incêndios na Califórnia em 2025 foram causados por armas a laser

Em meio aos incêndios florestais que começaram em Los Angeles, na Califórnia, em 7 de janeiro de 2025, e que deixaram pelo menos 27 mortos, usuários compartilham alegações errôneas de que as chamas foram causadas por “armas a laser”. Embora até o momento da publicação desta verificação as causas do evento não sejam conhecidas, especialistas consultados pela AFP afirmam que as alegações nas redes sociais fazem parte de teorias da conspiração e que a gravidade dos incêndios se deve a fatores como as condições de seca e os ventos de Santa Ana.

“O DEW pode ter sido usado em Los Angeles? A arma a laser pode ter sido direcionada para queimar todos os lugares escolhidos em Los Angeles, CA, mas também evitado queimar outros locais determinados... O objetivo da agenda globalista é mais uma vez destruir para depois construir melhor, transformar o que foi destruído em mais uma cidade resiliente, uma cidade que será controlada pelos globalistas, as cidades de 15 minutos ou smart cities”, afirmam publicações que circulam no Facebook, no Instagram, no X e no TikTok.

Publicações semelhantes também circulam em espanhol.

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Captura de tela feita em 16 de janeiro de 2025 de uma publicação no Facebook (.)

Pelo menos 27 pessoas morreram e milhares de casas foram destruídas nos incêndios florestais que devastaram partes de Los Angeles, na costa oeste dos Estados Unidos.

Segundo o Departamento Florestal e de Incêndios da Califórnia (Cal Fire, em inglês), o primeiro incêndio começou no bairro de Pacific Palisades, em Los Angeles, em 7 de janeiro de 2025. As chamas se espalharam até as montanhas de Hollywood e mais de 180 mil pessoas chegaram a evacuar a região.

As armas de energia dirigida (DEW, Directed Energy Weapons, em inglês) usam energia eletromagnética concentrada disparada na velocidade da luz. A tecnologia ainda está em desenvolvimento nos Estados Unidos e em outros países para defesa contra drones e mísseis.

Teorias da conspiração

Algumas publicações virais mostram um vídeo de 1 minuto e 45 segundos em que aparecem diversas imagens de locais supostamente afetados pelo incêndio em Los Angeles, onde as armas de energia dirigida teriam sido usadas.

No vídeo, lê-se nos primeiros 17 segundos: “Fizeram com Los Angeles igual fizeram com o Havaí e outros. E vai vir mais por aí. Abra os olhos enquanto é tempo”. Em seguida, é mostrada uma imagem que compara esse desastre natural a outros incêndios, como os ocorridos no Havaí em 2023, nos quais morreram centenas de pessoas e que foram permeados de desinformação.

O especialista no movimento QAnon e autor do livro “Jewish Space Lasers”, Mike Rothschild, explicou à AFP que “a teoria das ‘armas de energia dirigida’ remonta aos incêndios da Califórnia de 2018 na cultura conspiratória dominante, e mais atrás nas periferias”

“Isso se origina na falta de compreensão de como os incêndios se espalham, que as brasas podem atingir uma casa e não outra, e que as árvores vivas não queimam porque estão cheias de água”, comentou o especialista em 8 de janeiro de 2025, acrescentando que “servem como uma explicação fácil para os incêndios que muitos crentes não querem vincular às mudanças climáticas”.

O diretor do Centro de Iniciativas de Segurança Nacional da Universidade do Colorado e especialista em armas de energia dirigida, Iain Boyd, disse à AFP em 9 de janeiro de 2025 que “um novo tipo de teoria da conspiração surgiu nos últimos anos, alegando que entidades malignas usaram lasers de alta energia no ar para provocar incêndios florestais na Califórnia, no Havaí e no Texas”.

De acordo com o especialista, que compartilhou com a AFP um artigo que escreveu sobre o tema, isso “é pouco provável” porque “o nível de potência necessário para incendiar a vegetação com um laser de alta energia do céu exigiria uma grande fonte de energia instalada em um grande avião”

“Uma aeronave desse porte teria sido altamente visível pouco antes do início dos incêndios”, complementou Boyd. 

Publicações que circulam em espanhol compartilham um vídeo do incêndio e algo voando, apontando que seria uma evidência de armas teledirigidas. No entanto, segundo Michael Gollner, professor associado de Engenharia Mecânica da Universidade de Berkeley, na Califórnia, que pesquisa a dinâmica do fogo, trata-se simplesmente de “algo em chamas se movendo pelo ar”. “Há um rastro de fumaça. Um laser seria perfeitamente reto e contínuo. Os incêndios liberam milhões de brasas que se elevam e espalham o fogo, embora esse pareça maior”, disse.

Condições de seca

Embora os investigadores ainda estejam tentando descobrir o gatilho exato dos incêndios, especialistas concordam que a gravidade deles se deve a uma combinação de fatores, como as condições de seca e os ventos de Santa Ana, secos e quentes, característicos dessa época do ano na região.

“O combustível seco produzido pela falta de chuva e os ventos extremos fazem com que os incêndios se espalhem muito rápido”, apontou Gollner à AFP. 

O especialista disse que “não importa quão pequena seja a faísca que os inicia, porque os ventos são tão fortes e a vegetação é tão seca que os bombeiros não conseguem fazer nada, então eles se espalham até que os ventos diminuam”. “Ventos fortes, toneladas de combustíveis secos, estruturas muito inflamáveis muito juntas: é uma receita para o desastre”, acrescentou.

No passado, os ventos de Santa Ana já foram associados a incêndios florestais extremos na Califórnia, incluindo o incêndio Thomas em dezembro de 2017, que foi o maior registrado no estado até aquela data e atingiu uma área de 1.140 quilômetros quadrados.

Segundo o especialista de Berkeley, a maioria das operações de combate a incêndios nessas condições “só pode proteger estruturas individuais ou proteger áreas laterais”.

Joe McNorton, cientista da Seção de Modelagem do Sistema Terrestre do Centro Europeu de Previsões Meteorológicas em Médio Prazo, também observou que “os incêndios florestais de inverno no sul da Califórnia não são incomuns, especialmente durante a temporada de ventos marinhos”

Entretanto, acrescentou que “a combinação de seca prolongada, altas temperaturas e rápida propagação do fogo perto de áreas povoadas faz com que esse evento seja particularmente preocupante”.

A AFP já verificou anteriormente alegações errôneas sobre o uso de armas a laser para provocar incêndios.

Referência

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