Biden não disse em Bruxelas que está "disposto a pagar" o custo para a UE de cortar o gás russo

Publicações compartilhadas mais de 790 vezes em redes sociais desde 25 de março de 2022 asseguram que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, disse que o corte do gás russo à Europa iria prejudicar o bloco, mas que esse é um preço que ele estava “disposto a pagar”. Segundo os usuários, a afirmação foi feita durante a coletiva de imprensa que o mandatário concedeu junto à presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, naquele mesmo dia. Mas Biden não assumiu o peso das consequências de tal decisão.

“Joe Biden: ‘Cortar o gás russo vai prejudicar a Europa, mas esse é o preço que estou disposto a pagar’”, teria dito o presidente norte-americano, segundo as publicações compartilhadas no Facebook (1, 2), Twitter (1, 2) e Instagram.

Alguns usuários criticam, ainda, o poder que os Estados Unidos estariam demonstrando ter sobre a União Europeia (UE) com essas palavras.

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Captura de tela feita em 4 de maio de 2022 de uma publicação no Twitter ( . / )

Nas publicações pode-se ver uma captura de tela ou um vídeo da entrevista coletiva de 25 de março de 2022 transmitida pelo canal TRT World, um meio de comunicação turco de notícias em inglês, cujo logotipo aparece na parte superior à direita.

Conteúdo semelhante circula em inglês, catalão e espanhol. Além disso, a suposta declaração de Biden foi compartilhada em formato de texto (1, 2) sem qualquer referência à data em que foi feita tal alegação.

Outros usuários também comparam (1, 2) essas palavras com uma cena do filme de animação “Shrek” em que Lorde Farquaad, antes de uma batalha, afirma - ironicamente - de um balcão que alguns morrerão, mas que este é um “sacrifício” que ele está disposto a fazer.

O que Biden disse?

Em 24 de março de 2022, um mês depois do início da invasão russa da Ucrânia, Joe Biden participou em Bruxelas de uma cúpula da Otan, outra do G7 e de uma terceira com os mandatários da União Europeia para reforçar a posição ocidental e analisar a possibilidade de redução da dependência europeia do gás russo.

No dia seguinte, concedeu uma entrevista coletiva conjunta com Ursula von der Leyen.

No trecho viralizado, Biden diz, em inglês: “Senhora presidente, sei que eliminar o gás russo terá um custo para a Europa, mas não é apenas o correto do ponto de vista moral, como nos colocará em uma base estratégica muito mais forte”.

Essa declaração não coincide com as palavras que os usuários das redes sociais atribuem ao presidente dos Estados Unidos.

Tanto na transmissão em vídeo da Comissão Europeia, quanto na transcrição em inglês de seu discurso divulgada pela Casa Branca, é possível constatar que o presidente não disse que o prejuízo que o corte do gás russo causará à Europa é um custo que ele está “disposto a pagar”.

Na cúpula em questão, Estados Unidos e União Europeia acordaram medidas para reduzir a dependência do bloco europeu do gás russo, enquanto a Alemanha adiantou que quer prescindir do carvão e petróleo comprados da Rússia.

O país norte-americano se comprometeu a fornecer à União Europeia pelo menos 15 bilhões de metros cúbicos de gás natural liquefeito. O forte aumento dos preços da energia causou alarde na UE já no final de 2021, embora a situação tenha piorado com o conflito russo-ucraniano.

Estima-se que a União Europeia compre anualmente da Rússia cerca de 150 bilhões de metros cúbicos de gás, pouco mais de 40% das importações europeias desse combustível. No primeiro semestre de 2021, o gás dos Estados Unidos representou cerca de 6% das importações europeias.

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