O aumento repentino de votos para Joe Biden em Michigan e Wisconsin não é uma fraude

Dois gráficos que mostram um aumento vertical para o democrata Joe Biden nos estados de Michigan e Wisconsin na apuração dos votos das presidenciais nos Estados Unidos foram compartilhados centenas de vezes nas redes sociais desde o último dia 4 de novembro em publicações que os utilizam para alegar a existência de uma fraude eleitoral. Mas isto é falso: os aumentos mostram o momento em que foram computados os votos dos condados de Wayne (Michigan) e Milwaukee (Wisconsin), redutos tradicionalmente democratas.

“Então, ao que parece, quando a coisa se encaminhava favoravelmente à vitória de Donald Trump, certos Estados resolveram suspender a contagem, e no regresso surgiram curvas verticais e milagrosas a favor de Joe Biden”, assinala o texto que acompanha os gráficos em uma publicação no Facebook, que registra mais de 770 compartilhamentos.

Estas ilustrações também circularam no Twitter (1) e Instagram, com muitos comentários de usuários indignados com a suposta fraude a favor de Biden e contra Trump.

O primeiro gráfico, em inglês, explica a situação no estado de Wisconsin, com 89% dos votos apurados às 6h23 do dia 4 de novembro. As linhas mostram um aumento vertical para o democrata Joe Biden (linha azul).

O segundo gráfico, semelhante ao anterior, é de Michigan e pode-se observar igualmente um aumento vertical da curva azul de Biden, com 86% dos votos apurados às 7h17 de 4 de novembro.

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Captura de tela feita em 9 de novembro de 2020 de uma publicação no Instagram

Afirmações semelhantes circularam amplamente em inglês em um artigo no site Gateway Pundit, compartilhado cerca de 2,6 mil vezes no Facebook, de acordo com a ferramenta CrowdTangle. Também foram encontradas publicações na mesma rede social, no Twitter e Instagram.

Em espanhol, algumas postagens compartilham os gráficos separadamente, mas com alegações similares.

Quatro dias após a realização das eleições norte-americanas, Joe Biden foi confirmado como o 46º presidente dos Estados Unidos. Isso se deu após o democrata alcançar uma liderança intransponível no estado-chave da Pensilvânia e apesar das acusações de fraude na votação feitas pelo atual presidente Donald Trump.

Saltos na apuração

O gráfico de Wisconsin foi publicado pela jornalista Maggie Koerth em uma atualização às 8h27 de 4 de novembro durante a cobertura ao vivo das eleições presidenciais dos Estados Unidos do site de informação política FiveThirtyEight, pertencente à ABC News.

Segundo explicou Koerth, o aumento vertical da curva azul de Biden se deve aos resultados da votação em Milwaukee, anunciados às 3h56 de 4 de novembro.

O gerente de publicidade da ABC News, Curt Villarosa, por sua vez, afirmou à equipe de checagem da AFP por e-mail que “não há nada ‘mágico’ nestes saltos de votos: os condados simplesmente publicaram uma grande quantidade de resultados de uma vez”.

“Além disso, estes votos não foram 100% para Biden”, acrescentou. “Atrás da linha azul está também a linha vermelha, que representa milhares de votos ganhos por Trump”.

Os resultados não oficiais às 3h56 do dia 4 de novembro no condado de Milwaukee, que inclui a cidade de mesmo nome e outras 18 municipalidades, mostravam que Biden recebeu 69,13% dos votos, enquanto Trump obteve 29,28%.

“Não foram encontradas cédulas no meio da noite”, assegurou a diretora da Comissão Eleitoral de Wisconsin, Meagan Wolfe, durante uma ligação com jornalistas.

Villarosa também disse que este tipo de salto na apuração dos votos não beneficia apenas Biden. “Também existem exemplos do contrário, no qual a linha de Trump sobe repentinamente quando são acrescidos votos favoráveis a ele”.

Esta publicação da editora do FiveThirtyEight, Laura Bronner, mostra que Trump obteve vantagem em saltos verticais na apuração, como mostram os gráficos do Kansas (por volta de 21h30), de Montana (meia-noite) e Ohio (cerca de 22h00).

Michigan

O gráfico de Michigan que circulou nas publicações viralizadas com a contagem das 7h17 e com 86% dos votos apurados também foi publicado em um tuíte de Bronner.

A explicação do salto de votos a favor de Biden é similar ao caso de Wisconsin. Em atualizações na cobertura ao vivo do FiveThirtyEight, às 8h27 e às 9h17 de 4 de novembro, o analista eleitoral Geoffrey Skelley explica que o aumento de Biden se deve à incorporação à apuração dos votos do condado de Wayne, um reduto democrata, por volta de 6h30.

Nestas atualizações, Skelley publicou gráficos da contagem às 6h59, com 83% dos votos apurados, e às 9h03, com 89% apurado. “O ponto de importância em Michigan é o condado de Wayne, onde está Detroit, a maior cidade do estado. Biden lidera ali com 67%, diante de 32% [...], assinalou Skelley na primeira de suas atualizações.

Biden finalmente se impôs com 68,12% dos votos frente aos 30,65% de Donald Trump no condado que representa o salto nos gráficos.

Neste vídeo, Bronner explica, juntamente com outros jornalistas do FiveThirtyEight, os saltos na apuração de Michigan e Wisconsin (a partir de cinco minutos de gravação).

Afirmações falsas sobre a fraude eleitoral circulam desde o dia seguinte à eleição, 4 de novembro, impulsionadas pelo presidente Donald Trump, sua equipe de campanha e seus seguidores, que fazem acusações infundadas sobre supostas irregularidades.

Os encarregados da apuração enfrentaram uma avalanche de votos de ausentes e por correio, motivados pela situação da pandemia de covid-19, o que provocou atrasos na contagem. O presidente Trump afirmou repetidas vezes e erroneamente que a votação por correio leva a uma fraude generalizada.

Em resumo, os saltos nos gráficos na linha de votos de Joe Biden na apuração da eleição nos estados de Michigan e Wisconsin se devem à incorporação dos votos dos condados de Wayne e Milwaukee aos resultados eleitorais. Em ambos os condados, Biden ganhou por uma ampla margem de mais de 30 pontos percentuais.

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