As emissões de CO2 têm maior impacto na mudança climática do que os testes nucleares
- Publicado em 28 de outubro de 2024 às 18:49
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- Por Ede ZABORSZKY, Katharina ZWINS, Ivan FISCHER, AFP Hungria, AFP Áustria, AFP Croácia, AFP Peru
- Tradução e adaptação Carla DIAZ , AFP Brasil
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“Desde 1945, mais de 1000 testes termo-nucleares foram realizados na atmosfera. Claro que nenhum deles causou o aquecimento global, mas o seu fogão a lenha é outra coisa!”, diz uma das publicações que circulam no Facebook e no Instagram.
Conteúdos semelhantes circulam em espanhol, francês, búlgaro, húngaro, alemão, croata, tcheco e polonês.
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), mais de 2 mil testes nucleares foram realizados em todo o mundo de 1945 a 1996, quando foi assinado o Tratado de Proibição Completa de Testes Nucleares (CTBT).
O tratado estabeleceu a proibição total de testes nucleares em qualquer lugar do mundo, seja na superfície terrestre, debaixo d'água ou na atmosfera. A proibição contempla ações com finalidades militares ou pacíficas. Porém, desde então, foram realizados 10 testes nucleares, a maioria deles pela Coreia do Norte.
Gases do efeito estufa
As emissões provocadas pela combustão dos materiais fósseis constituem a principal causa do aquecimento global. O fenômeno não se deve diretamente ao calor liberado durante a combustão, mas à liberação de gases do efeito estufa durante a combustão.
O último informe do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), publicado em 2021, detalha a maneira como diferentes gases contribuem no processo de aquecimento, no qual a atmosfera acumula mais calor do que irradia. O IPCC estabelece uma “relação quase linear” entre as emissões de CO2 e o recente aquecimento global.
“O aquecimento global é causado pela emissão de gases do efeito estufa como o CO2, que retêm na atmosfera o calor refletido pela superfície terrestre, impedindo que este calor saia da atmosfera. Isso não tem relação com a energia emitida por fogões a lenha, mas com os gases do efeito estufa liberados durante a combustão”, explicou Malte Göttsche à AFP, professor de ciências naturais e pesquisa para a paz do Departamento de Física da Universidade Técnica de Darmstadt, na Alemanha.
Essas emissões aumentaram durante o último século.
Explosões nucleares não liberam gases do efeito estufa
As explosões nucleares provocam efeitos nocivos ao meio ambiente, mas não foram responsáveis pelo aquecimento global. É o que confirmou Göttsche à AFP: “Os numerosos testes com armas nucleares causaram, de fato, prejuízos ambientais consideráveis. Alguns lugares, como as Ilhas Marshall, seguem sendo inabitáveis devido à contaminação radioativa ao redor (...) No entanto, eles não resultaram na emissão de gases do efeito estufa relacionados ao aquecimento global”.
Ainda assim, o especialista explicou que se “centenas de armas nucleares, ou mais, fossem utilizadas em uma futura guerra e explodissem próximas à superfície terrestre, produziriam grandes incêndios. Devido à dispersão de fuligem, menos luz solar atingiria a superfície da Terra”. Com isso, detalhou, haveria um efeito de resfriamento, cujas consequências poderiam ser catastróficas, e não um aquecimento.
Gerald Kirchner, chefe do departamento do Carl Friedrich von Weizsacker Center para a Ciência e Pesquisa para a Paz da Universidade de Hamburgo, destacou que as datas dos ensaios nucleares também mostram que são os gases do efeito estufa, e não os testes, os responsáveis pela mudança climática.
“Em 1958 e 1961 houve numerosos testes. Em 1963, foi assinado um acordo entre os Estados Unidos e a antiga União Soviética para proibi-los. Isso significa que esses testes não poderiam, de forma alguma, explicar o aquecimento massivo da Terra entre os anos 2000 e 2010. Este aquecimento deveria ter sido observado nos anos 1970. Portanto, está absolutamente claro: essas duas coisas não estão relacionadas”, detalhou à AFP em 15 de outubro de 2024
Diana Ürge-Vorsatz, pesquisadora climática e vice-presidente do IPCC, também confirmou à AFP que as emissões de gases do efeito estufa impulsionam a mudança climática.
“Não é a combustão em si que aquece o clima, mas os gases liberados durante a combustão, como o dióxido de carbono, que retêm a energia solar”, explicou.
A pesquisadora destacou ainda que o excedente de energia absorvida pela atmosfera devido aos gases do efeito estufa derivados da ação humana representa “centenas de milhares de vezes a quantidade liberada durante os testes nucleares”, no século XX.
Em um artigo publicado em maio de 2023, pesquisadores da Universidade de Nova Gales do Sul, na Austrália, indicaram que “o efeito das emissões de gases do efeito estufa pela humanidade durante os 50 anos anteriores a 2020 representam aproximadamente 25 bilhões de vezes a energia emitida pela bomba nuclear de Hiroshima”.
John Cook, pesquisador do Melbourne Centre of Behaviour Change, oferece em seu site, dedicado à conscientização sobre o aquecimento global, um contador interativo que indica o calor acumulado na atmosfera desde 1998 em equivalentes a bombas nucleares de Hiroshima. Atualmente, o contador supera os 3,4 bilhões.
O AFP Checamos já verificou outras alegações sobre as mudanças climáticas.