É falso que a Pfizer tenha registrado patente de tecnologia para rastrear vacinados contra a covid

  • Publicado em 10 de outubro de 2023 às 20:41
  • Atualizado em 13 de outubro de 2023 às 21:36
  • 5 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
As vacinas contra a covid-19 não contêm componentes que possibilitam o rastreamento de imunizados. Diferentemente do que alegam publicações visualizadas mais de 27 mil vezes nas redes sociais desde 2 de setembro de 2023, a farmacêutica Pfizer não tem uma patente registrada para rastrear vacinados. O registro citado nas postagens é, na verdade, da empresa israelense Ehrlich e trata sobre o monitoramento de pessoas para prevenir a superpropagação de doenças. A empresa responsável pela patente confirmou à AFP que a Pfizer não tem nenhum envolvimento com a invenção.

“‘Pfizer admite que vacinados possuem marca que emite sinal de geolocalização’ (...) Patente registrada nos EUA em AGOSTO 2021. RASTREAMENTO DE VACINADOS VIA SATÉLITE. Isso mesmo que vc leu: ‘RASTREAMENTO’ Patent Nº: US 11.107.588 B2”, diz a legenda de publicações no Instagram, no Facebook, no Telegram e no Kwai.

Publicações que compartilham a mesma alegação circulam nas redes sociais desde 2021 e voltaram a ser compartilhadas em setembro de 2023.

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Captura de tela feita em 5 de outubro de 2023 de uma publicação no Telegram ( .)

O vídeo viral mostra um homem dizendo que a Pfizer teve uma patente aprovada, em 31 de agosto de 2021, “para rastrear seres humanos pessoas inoculados com o lixo que ela fabrica em todo o mundo por meio de micro-ondas e grafeno”, se referindo à vacina contra a covid-19. Em outro trecho, ele chama o imunizante de “injeção da morte”.

Em meio à pandemia da covid-19, o autor do vídeo divulgou outros conteúdos com alegações falsas sobre as vacinas contra a doença, que chegaram a ser desmentidos por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP).

Algumas publicações de setembro de 2023 são acompanhadas de um código da patente e um link, intitulado “Métodos e sistemas para priorizar tratamentos, vacinação, testes e/ou atividades enquanto protege a privacidade dos indivíduos”.

Embora seja atribuída à farmacêutica, os únicos nomes listados no documento do registro são Gal Ehrlich e Maier Fenster, ambos advogados de patente do grupo Ehrlich, empresa israelense de propriedade intelectual.

A única citação feita a Pfizer no documento é em uma lista de “vacinas candidatas em avaliação clínica”.

Em outubro de 2021, quando a alegação começou a circular, Gal Ehrlich explicou por e-mail à AFP que a patente foi produzida entre abril e maio de 2020, antes mesmo das vacinas contra covid-19 estarem disponíveis para a população.

Em resposta a um questionamento do AFP Checamos em outubro de 2023, Gal Ehrlich e Maier Fenster confirmaram que a patente foi criada sem vínculo com qualquer entidade.

“A patente também não tem dispositivos de rastreamento na vacina. É exatamente o oposto: permitir que as pessoas sejam alertadas sobre o risco de serem portadoras ou infectar outras pessoas de maneira COMPLETAMENTE anônima, usando apenas celulares”, explicou Fenster em 12 de outubro por e-mail.

Ehrlich confirmou não ter conhecimento sobre o interesse da Pfizer ou de qualquer outra farmaceûtica pela tecnologia: “O usuário do método inventado deve ser uma organização de cuidados de saúde, e não um fabricante de medicamentos, porque tem a ver com a forma como o medicamento é distribuído entre as pessoas após sua produção, e não com o próprio processo de produção, ou o produto final do medicamento”.

Uma busca combinando o nome da Pfizer com a data da suposta aprovação da patente vinculada a ela nos principais bancos de patentes — INPI, Espacenet e USPTO — não levou a nenhum resultado.

Procurada pelo AFP Checamos, a assessoria de imprensa da Pfizer Brasil confirmou que a empresa não é a dona da patente citada nas publicações.

“A Pfizer não confirma registro de patente e nenhum componente que faça o rastreamento dos vacinados”, aponta a nota enviada em 4 de outubro de 2023.

Patente não tem relação direta com vacinação da população

Diferentemente do que alegam as postagens, a patente não descreve a possibilidade de rastrear pessoas através da imunização, mas sugere um sistema que utiliza o Bluetooth em dispositivos móveis para determinar o potencial de infecção individual com base na movimentação do usuário.

Ehrlich explicou à AFP em 2021 que a intenção era que a invenção combatesse a disseminação da covid-19 por meio da tecnologia Bluetooth ao detectar membros socialmente ativos de uma comunidade para que vacinas e medicamentos fossem direcionados a eles.

Ainda segundo o inventor da patente, essa abordagem de “priorização” seria feita através da contagem das interações sociais monitoradas por Bluetooth entre os celulares dos usuários de forma semelhante ao que é conhecido como rastreamento de contato digital.

“Com uma grande diferença: contatos de indivíduos aparentemente saudáveis são monitorados para priorização da administração de medidas, como vacinas, se, onde e quando estas estiverem em falta”, continuou.

No contexto em que foi desenvolvida, o objetivo da invenção era, também, que as vacinas fossem administradas primeiro naqueles que tinham maior interação social para evitar a superpropagação do vírus e melhorar o resultado epidemiológico geral, apontou Ehrlich.

No documento da patente é possível observar que a invenção é desenvolvida como dispositivo, não havendo nenhuma menção à inoculação de qualquer substância no corpo de usuários para o rastreamento.

É falso que vacinas contenham grafeno

No vídeo viral é apontado, ainda, que o suposto sistema de rastreamento das vacinas seria possível através do grafeno, nanomaterial condutor à base de carbono, que estaria presente no imunizante. Essa alegação é falsa.

A ligação do ingrediente com a vacina da Pfizer é apontada desde 2020 e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) se retratou após divulgar a alegação. A própria Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) desmentiu que as vacinas aprovadas contra a covid-19 contenham grafeno.

Uma consulta à bula da vacina contra covid-19 produzida pela Pfizer permite observar que não há nenhuma menção ao material ou ao seu derivado, óxido de grafeno.

O AFP Checamos já verificou anteriormente alegações (1, 2, 3) sobre o grafeno e os imunizantes contra a covid-19.

Referências

13 de outubro de 2023 Acrescenta respostas de Gal Ehrlich e Maier Fenster

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