A FDA não mudou de posição nem passou a recomendar a ivermectina contra a covid-19

A Agência de Medicamentos e Alimentos dos Estados Unidos (FDA) não autorizou o uso da ivermectina para tratar ou prevenir a covid-19, como alegam usuários nas redes sociais. As publicações, visualizadas mais de 300 mil vezes desde 14 de agosto de 2023, distorcem a posição do órgão norte-americano, que já afirmou que os testes clínicos para mostrar a segurança e eficácia da droga contra o coronavírus fracassaram.

“Depois do massacre de centenas de milhares nos últimos 3 anos, o FDA agora passa a recomendar a ivermectina para tratar a COVID-19... Será que com a enxurrada de evidência refutando a insana campanha deles contra o antiviral, eles estão passando a temer judicialização? Vamos ver”, diz uma das publicações compartilhadas no X (antes Twitter), no Facebook, no Instagram e no Kwai.

Conteúdo semelhante circula em inglês, francês, espanhol, alemão, holandês, croata e sérvio.

Algumas postagens incluem um vídeo em que a apresentadora da Fox Business Maria Bartiromo conversa com o senador do Partido Republicano Ron Johnson, do estado de Wisconsin, que afirma que a ivermectina “foi um medicamento ganhador do Prêmio Nobel de Medicina que poderia ter salvo centenas de milhares de vidas”.

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Captura de tela feita em 23 de agosto de 2023 de uma publicação no X (antes Twitter) ( .)

A ivermectina é aprovada nos Estados Unidos para uso em animais e para tratar condições humanas causadas por vermes parasitas, além de piolhos e rosácea. Mas a FDA nunca autorizou ou recomendou o seu uso para a covid-19.

Declaração da advogada da FDA

As alegações compartilhadas são baseadas no depoimento dado em um caso de três médicos que alegam terem sido “prejudicados” pela FDA em seus esforços para tratar os pacientes.

Especificamente, o processo aponta que a FDA ultrapassou os limites ao “repetidamente direcionar o público — incluindo profissionais de saúde, organizações e pacientes — a não usar ivermectina para a covid-19”.

Em contrapartida, Ashley Cheung Honold, advogada do Departamento de Justiça que representa a FDA, disse durante uma audiência em 8 de agosto de 2023 que a agência reguladora “reconhece explicitamente a autoridade de médicos de prescreverem ivermectina para tratar a covid-19”.

Questionada sobre o depoimento, a FDA enviou à AFP a uma sequência de publicações no X (antes Twitter), com data de 16 de agosto, em que afirma: “Os profissionais de saúde geralmente podem escolher prescrever uma droga aprovada em humanos para um uso não aprovado quando eles julgarem ser clinicamente apropriado para um paciente específico”.

No entanto, a FDA reiterou que “não autorizou ou aprovou a ivermectina” para prevenir ou tratar a covid-19 — “nem declarou ser segura e eficaz para esse uso”.

Em comunicados anteriores sobre o medicamento, a FDA deixou em aberto a possibilidade de tomar a ivermectina de modo off label, dizendo: “Se seu médico lhe prescrever o uso da ivermectina, compre-a através de uma fonte legítima, como uma farmácia, e tome-a exatamente como prescrito”.

Em setembro de 2021, a Associação Médica Americana, a Associação Americana de Farmacêuticos e a Sociedade Americana de Farmacêuticos do Sistema de Saúde indicaram ser “radicalmente contra a regulamentação, prescrição ou distribuição da ivermectina para prevenir ou tratar a covid-19 sem ser em um ensaio clínico”.

Em resposta a relatos de 2021 de pacientes que precisaram de atendimento médico após se automedicarem com ivermectina, a FDA apontou os riscos de superdosagem, incluindo “náuseas, vômitos, diarreia, hipotensão (baixa pressão arterial), reações alérgicas (coceira e urticária), tontura, ataxia (problemas de equilíbrio), convulsões, coma e até mesmo a morte”.

“Sem embasamento científico”

Um estudo de 2020 descobriu que a ivermectina inibe a replicação do coronavírus in vitro, estimulando a realização de testes clínicos ao redor do mundo para determinar se o remédio deveria ser usado para tratar e prevenir a covid-19.

Mas um guia dos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA atualizou, em março de 2023, as suas recomendações contrárias ao uso.

“As concentrações necessárias do plasma para a eficácia do antiviral detectada in vitro requerem uma administração de doses 100 vezes maior do que as aprovadas para uso em humanos”, disse a agência.

A farmacêutica Merck, fabricante da ivermectina, declarou em 2021 que não constatou “nenhum embasamento científico para um potencial efeito terapêutico [do medicamento] contra a covid-19”.

Um ensaio clínico com 1.500 pacientes nos Estados Unidos descobriu que “entre pacientes ambulatoriais com sintomas leves a moderados de covid-19, o tratamento com ivermectina (…) comparado com o placebo não apresentou uma melhora significativa no tempo de recuperação”.

Outro estudo norte-americano administrou doses maiores de ivermectina a pacientes e analisou que essas pessoas tiveram o mesmo tempo de recuperação das que receberam o placebo.

Uma revisão de diversos estudos ao redor do mundo falhou em encontrar evidências de benefícios a pacientes com covid-19.

O AFP Checamos já verificou alegações semelhantes (1, 2) anteriormente.

Referências

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