Cidade de Chapecó não “esvaziou” leitos de UTI com tratamento precoce contra covid-19
- Este artigo tem mais de um ano
- Publicado em 7 de abril de 2021 às 23:26
- 6 minutos de leitura
- Por AFP Brasil
Copyright © AFP 2017-2025. Qualquer uso comercial deste conteúdo requer uma assinatura. Clique aqui para saber mais.
“Maravilha! Chapecó esvazia leitos de UTI com tratamento precoce”, diz texto amplamente compartilhado no Facebook (1, 2, 3) desde o último dia 3 de abril. “Prefeito de Chapecó zerou UTi's com o tratamento precoce!! Mas vc não vai ver na mídia, porque para eles, notícia boa é gente morrendo!!”, escreveu outro usuário.
Outras versões - difundidas inclusive pela deputada federal Carla Zambelli (PSL) - compartilham um vídeo em que o prefeito de Chapecó, João Rodrigues (PSD), mostra uma unidade hospitalar vazia e asseguram: “Prefeito de Chapecó zera internações na UTI por covid-19! Conseguem adivinhar como?”.
Em 7 de abril, o presidente Jair Bolsonaro visitou a cidade catarinense, elogiando a maneira como o governo local lidou com a pandemia e o tratamento precoce.
Não é verdade, no entanto, que Chapecó não tenha mais pacientes internados com covid-19 em Unidades de Tratamento Intensivo.
Ocupação de UTIs
Segundo registrado no boletim epidemiológico da própria Prefeitura de Chapecó, neste dia 7 de abril de 2021 há 116 pacientes com covid-19 em leitos de UTI da cidade. Isso corresponde a uma taxa de ocupação de 93% dos leitos de UTI públicos e de 90% dos privados, ainda de acordo com a Prefeitura.
Do dia 1º até 6 de abril, o número de internados com coronavírus em Unidades de Tratamento Intensivo era, respectivamente, de: 131, 132, 130, 130, 129 e 121 pessoas - levando a uma média diária de 127 pacientes em leitos de UTI, incluindo os dados do último dia 7.
A média correspondente ao mesmo período nos meses anteriores de 2021 era inferior.
Nos sete primeiros dias de março, por exemplo, foi registrada a média de 113 pacientes em UTIs, ainda de acordo com os dados da Prefeitura. Já na primeira semana de janeiro e fevereiro, a média era respectivamente de 37 e 39 pacientes em leitos de tratamento intensivo.
Os leitos vazios exibidos pelo prefeito João Rodrigues no vídeo viralizado não eram de UTI, mas da Unidade de Tratamento Semi-Intensivo (UTSI) do Centro Avançado de Atendimento Covid-19, um hospital de campanha inaugurado no último dia 24 de fevereiro. Desde o início, o objetivo do centro era funcionar como um “local de passagem”, atendendo pacientes que aguardavam vagas em outros hospitais.
Segundo informou a Prefeitura, toda a estrutura do hospital de campanha pôde ser desativada neste mês de abril devido à alta de 100 pessoas, mas também devido à transferência de 85 pacientes para outros centros médicos.
Desde que o Centro Avançado de Atendimento Covid-19 foi inaugurado, foram criados 26 novos leitos de UTI no Hospital Regional do Oeste - principal hospital público da região -, o que pode ter ajudado a diminuir a procura pelo centro elaborado como “local de passagem”.
Casos ativos e medidas restritivas
O que realmente foi registrado em Chapecó em abril deste ano foi uma queda acentuada no número de casos ativos de covid-19 em relação a março. Neste dia 7 de abril, há 569 casos do novo coronavírus na cidade, contra 4.244 no mesmo dia do mês anterior. Não é possível afirmar, no entanto, que essa redução se deva ao tratamento precoce.
Ao longo desse período, o governo local realmente estimulou a rápida medicação de pessoas com covid-19, mas não somente.
Em 5 de março, por exemplo, Chapecó acatou decretos estaduais determinando toque de recolher das 22h às 5h, limitando o horário de funcionamento de bares e proibindo o consumo de bebidas alcoólicas em áreas públicas. No dia 9 do mesmo mês, foi instituída uma barreira sanitária na cidade, medindo a temperatura e testando aqueles que desejassem entrar em Chapecó.
No dia 11, foram instauradas medidas mais rígidas por um final de semana, proibindo o funcionamento de serviços considerados não essenciais e limitando a comercialização de alimentos e bebidas a serviços de entrega ou à retirada nos estabelecimentos.
Até o último dia 5 de abril, ainda estavam vigentes diversas medidas restritivas.
Quando o número de casos ativos começou a cair, em meados de março, o secretário-adjunto da Saúde, Jader Danielli, atribuiu a melhora a uma série de fatores, como registrado no site da Prefeitura.
“Isso é fruto de um conjunto de medidas tomadas pela Administração Municipal, como uma melhora na eficiência operacional, isolamento, tratamento mais adequado com a abertura de mais leitos, mais profissionais e equipamentos”, disse. “Pedimos que a população continue tomando cuidado para que esses números não voltem a crescer. Quem não precisar sair de casa, não saia. Se sair, vá sozinho, use máscara e mantenha o distanciamento”, acrescentou.
Tratamento sem comprovação
Além do tratamento precoce não ter sido a única medida implementada pela Prefeitura de Chapecó, não há evidências de que essa estratégia seja capaz de combater o novo coronavírus.
Embora o governo local não detalhe quais medicamentos estão sendo indicados para lidar com a doença, o chamado tratamento precoce costuma incluir combinações de hidroxicloroquina, ivermectina, vitamina C e zinco - substâncias que não são recomendadas por organizações de saúde para tratar a covid-19.
Remédio comumente utilizado para tratar a malária, a hidroxicloroquina foi alvo de diversos estudos durante a pandemia de covid-19.
Em 5 de junho de 2020, por exemplo, pesquisadores da Universidade de Oxford compararam a evolução de pacientes de covid-19 que receberam hidroxicloroquina com aqueles que receberam o tratamento usual, concluindo que não houve diferença significativa na taxa de mortalidade ou redução no período de internação hospitalar.
Em outubro de 2020, a hidroxicloroquina também não se mostrou capaz de reduzir substancialmente a gravidade de sintomas em pacientes ambulatoriais com covid-19 leve e inicial.
Para a Agência Europeia de Avaliação de Medicamentos (EMA) não somente não há evidências de efeitos benéficos do uso do medicamento contra a covid-19, como este pode “causar alguns efeitos colaterais, incluindo problemas cardíacos”.
Já a eficácia da ivermectina - medicamento utilizado para tratar algumas infecções parasitárias - ainda está em estudo. Enquanto isso, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que o remédio não seja utilizado contra o novo coronavírus, a não ser em ensaios clínicos.
A OMS também destaca que micronutrientes como a vitamina C e o zinco são cruciais para o funcionamento correto do sistema imunológico, mas que não há, até agora, orientação para o seu uso como um tratamento contra a covid-19.
Conteúdo semelhante a este também foi verificado pelos sites Aos Fatos e Agência Lupa.