OMS não vincula aborto à idade gestacional

  • Publicado em 20 de junho de 2024 às 22:07
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  • Por AFP Brasil
Em 12 de junho de 2024, a Câmara dos Deputados aprovou urgência para um projeto de lei que equipara aborto de gestação acima de 22 semanas ao crime de homicídio. Desde então, publicações nas redes sociais com mais de 500 compartilhamentos defendem a proposta alegando que a Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica aborto como a interrupção que acontece até a 22ª semana de gestação e que, a partir desse período, o feto seria considerado natimorto. Isso é enganoso. As atuais diretrizes da OMS definem aborto induzido como uma interrupção deliberada que não depende da duração da gravidez.

O PL 1904/24 pune abortamento provocado após a 22ª semana (5 meses) de gestação. Isso porque a própria OMS entende o conceito de aborto como sendo até a 22ª semana. A partir desse período, mesmo que haja morte intrauterina do feto, o bebê é considerado natimorto”, diz a legenda de uma publicação que circula no Facebook e no X.

As mensagens são acompanhadas da captura de tela de uma norma técnica sobre violência sexual, elaborada pelo Ministério da Saúde em 2012, com a seguinte frase destacada: “Embora o conceito de abortamento preconizado pela Organização Mundial da Saúde estabeleça limite de 22 semanas de idade gestacional”.

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Captura de tela feita em 17 de junho de 2024 de uma publicação no X (.)

O conteúdo começou a circular após a Câmara dos Deputados aprovar, no último dia 12 de junho, urgência para o Projeto de Lei 1904/24, que equipara aborto de gestação acima de 22 semanas ao crime de homicídio. A proposta gerou manifestações contrárias em diversas cidades por criminalizar o aborto em casos previstos em lei. 

O artigo 128 do Código Penal permite aborto em casos de risco à vida da gestante e em casos de estupro. Além disso, em 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que aborto em caso de anencefalia do feto também não é crime, já que manter a gravidez implicaria em risco à saúde física e psicológica da mãe. 

Nos casos legais, não há definição sobre o limite da idade gestacional para a interrupção da gestação.

A OMS também não adota um limite na definição de aborto induzido.

O que diz a OMS 

A norma técnica do Ministério da Saúde usava como referência o guia da OMS de 2003 intitulado “Aborto seguro: orientação técnica e política para sistemas de saúde” que traz informação para indução do aborto em gestações de até 22 semanas. Em 2012, o documento ganhou uma segunda edição, que apresenta métodos de aborto para até 24 semanas de gravidez.

O guia de 2012 foi atualizado em 2022 pelo documento “Diretriz sobre cuidados no aborto: resumo”. Nesse material, a OMS desaconselha “leis e outras regulamentações que proíbam o aborto com base nos limites da idade gestacional”. O guia também traz procedimentos abortivos para até 28 semanas de gestação.

De acordo com a 11ª Classificação Internacional de Doenças (CID-11), elaborada pela organização, “natimorto é a expulsão ou extração completa de um feto de uma mulher, após sua morte antes da expulsão ou extração completa, com 22 ou mais semanas completas de gestação”. 

Contudo, a CID-11 também define aborto induzido como “expulsão ou extração completa de uma mulher de um embrião ou feto (independentemente da duração da gravidez), após uma interrupção deliberada de uma gravidez em curso por meios médicos ou cirúrgicos, que não se destina a resultar em um nascimento vivo”.

A classificação pontua ainda que “abortos induzidos são distintos dos casos de aborto espontâneo e natimorto”.

Procurada, a assessoria de comunicação da OMS reiterou os conceitos estabelecidos pela CID-11 e destacou que “cabe aos países definir em quais situações o aborto é ou não realizado, conforme suas legislações e normas”

As recomendações da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e da Organização Mundial da Saúde (OMS) aos seus Estados Membros sobre esse e outros temas de saúde pública são baseadas nas principais evidências disponíveis”, completou.

Referências

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