Vídeo mostra protesto no Egito em 2013, e não palestinos se fingindo de mortos em 2023

Milhares de civis foram mortos em ambos os lados da guerra entre Israel e o Hamas, desencadeada após o ataque supresa do movimento islamita palestino em 7 de outubro de 2023. Publicações com mais de 70 mil visualizações nas redes sociais compartilham um vídeo de pessoas deitadas no chão cobertas com lençol alegando que palestinos estariam fingindo suas mortes. Contudo, o vídeo não mostra palestinos e tampouco é recente. O jornalista responsável pela gravação confirmou à AFP que se trata de um protesto de estudantes no Cairo, capital do Egito, em 2013.

“Os palestinos mortos falam e se mexem….. Quanta mentira!”, é o que aponta publicações compartilhadas no X (antes Twitter) e no Facebook. O mesmo vídeo circula com mensagens similares no Kwai, no TikTok e no Instagram.

A alegação também circula em inglês, espanhol e francês.

Em 2018 esse conteúdo já circulava, quando Israel e Hamas estavam em conflito, que era considerado o pior desde 2014.

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Captura de tela feita em 9 de novembro de 2023 de uma publicação no X ( .)

O vídeo viral mostra pessoas deitadas no chão como se fossem cadáveres cobertos com um lençol branco, que contém escritos em árabe. Enquanto a maioria das pessoas deitadas permanece parada, é possível ver outras se movendo enquanto a câmera passa por elas.

A sequência é compartilhada após um ataque realizado pelo Hamas em Israel, em 7 de outubro de 2023, que matou pelo menos 1.400 pessoas, em sua maioria civis, e deixou mais de 200 reféns, segundo as autoridades israelenses.

Isso desencadeou uma guerra que, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, gerido pelo Hamas, matou mais de 10.500 pessoas na região.

Embora o vídeo viral mostre pessoas como se fossem cadáveres, ele não está relacionado com o conflito atual entre Israel e Hamas, e tampouco é recente.

Protesto no Egito

Uma busca reversa por fragmentos da sequência levou a uma versão mais longa publicada pelo canal oficial do jornal egípcio El-Badil no YouTube em 28 de outubro de 2013.

No título do vídeo, em árabe, é possível ler, em tradução livre para o português: “Uma representação de mortos dentro da Universidade Al-Azhar”.

A descrição do registro aponta que se trata de um ato iniciado por dezenas de estudantes da Irmandade Muçulmana na Universidade Al-Azhar. Na ocasião, eles entoaram palavras de ordem contra o Exército e a polícia.

As universidades do Egito se tornaram redutos de protestos depois que o então presidente Mohamed Mursi, que foi membro da Irmandade Muçulmana, sofreu um golpe militar em julho de 2013, desencadeado por manifestações contra o seu governo, que durou um ano.

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Comparação de capturas de tela feita em 7 de novembro de 2023 entre uma publicação no X e o vídeo no canal do jornal El-Badil no YouTube (D) ( .)

A sequência publicada no canal do jornal El-Badil é creditada ao jornalista multimídia Mostafa Darwish, que confirmou à AFP, em 2 de novembro de 2023, a data de gravação: “Eu filmei esse vídeo para o jornal El-Badil em 2013”.

Um vídeo similar do mesmo protesto, mas filmado de outro ângulo, foi publicado no canal da Akbar Al yom TV no YouTube. No título, a circunstância em que ele foi gravado é indicada: “Estudantes da Al-Azhar invadiram o prédio administrativo da universidade na cidade de Nasr”, em tradução do árabe para o português.

Na gravação da Akbar Al yom TV, a partir do minuto 1:21, é possível observar a fachada de um prédio. O fotógrafo da AFP Khaled Kamel, que fez imagens dos protestos em outubro de 2013, também registrou o mesmo edifício visto próximo ao local onde os estudantes realizaram o ato.

Nas imagens, é possível notar as mesmas janelas, ar-condicionado, escritos nas paredes e o símbolo da Irmandade Muçulmana.

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Combinação de capturas de tela feita em 7 de novembro de 2023 entre o vídeo no canal da Akbar Al yom TV no YouTube (E) e uma fotografia da AFP ( .)

Na foto da AFP, os vidros do edifício aparecem quebrados, enquanto no vídeo do jornal egípcio são vistos intactos. Isso se deve ao fato de a sequência ter sido feita em 28 de outubro de 2013, enquanto a fotografia foi tirada em 30 de outubro, momento em que as tensões tinham se intensificado.

O vídeo viral circula em meio a questionamentos sobre os números de vítimas da atual guerra entre Hamas e Israel, que não podem ser verificados de forma independente. O presidente norte-americano, Joe Biden, por exemplo, expressou dúvidas no final de outubro sobre os dados do Hamas, embora os Estados Unidos reconheçam que as vítimas palestinas estão na casa “dos milhares”.

Em 26 de outubro, o Ministério de Saúde do Hamas decidiu publicar uma lista identificando o gênero, a idade e o número de identidade dos quase 7.000 palestinos mortos até aquele momento para “revelar os detalhes e os nomes ao mundo inteiro para que possam saber a verdade”.

Em 27 de outubro, o comissário-geral da Agência da ONU para os Refugiados Palestinos (UNRWA), Philippe Lazzarini, destacou que o número de mortos publicado pelo Ministério de Saúde do Hamas na Faixa de Gaza “nunca foi contestado” em conflitos anteriores.

Esses números são utilizados também pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em seus relatórios sobre a situação nos Territórios palestinos.

O AFP Checamos já verificou outros conteúdos que circulam atrelados ao conflito entre o Hamas e Israel em 2023.

Essa alegação também foi verificada pelo Uol Confere.

Referências

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