Vídeos gerados por IA alegam falsamente que café, água e Coca-Cola no Brasil foram “contaminados” por metanol

  • Publicado em 9 de outubro de 2025 às 21:08
  • 4 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
Em meio à crise provocada pela intoxicação por metanol após o consumo de bebidas alcoólicas, publicações somam mais de 35 mil interações nas redes sociais compartilhando vídeos da jornalista Renata Vasconcellos, apresentadora do Jornal Nacional, em que supostamente noticia que o Brasil também teria confirmado a presença dessa substância no café, na água e na Coca-Cola. Mas as gravações foram geradas por inteligência artificial (IA), e o Ministério da Saúde informou à AFP que até o momento não foi registrado nenhum caso de adulteração com metanol em bebidas não alcoólicas.

“Cuidado também estão vendendo coca cola com metanol”, diz uma das publicações que circulam no Facebook, no Instagram e no Threads. O vídeo contém a marca d’água de uma postagem — já excluída — do perfil “@observador_nacional” no TikTok.

Publicações semelhantes, que circulam no Instagram e no Kwai, mostram a apresentadora do Jornal Nacional supostamente anunciando que a substância também foi detectada na água e no café. “Água contaminada com metanol por todo o país” e “Café contaminado por metanol por todo o Brasil”, dizem as postagens.

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Combinação de capturas de tela feita em 7 de outubro de 2025 de publicações no Instagram, no Kwai e no Facebook (.)

Nas gravações virais, a jornalista Renata Vasconcellos supostamente diz que o país teria registrado a presença de metanol no café, na água e na Coca-Cola. As publicações são acompanhadas por narrações semelhantes entre si, nas quais é indicado que a contaminação pela substância provocou uma explosão de casos e mais de 20 mortes nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. 

As postagens circulam em meio à onda de casos de intoxicação por metanol após o consumo de bebidas alcoólicas no país. De acordo com dados oficiais do Ministério da Saúde, já foram registradas cinco mortes pela ingestão da substância, todas em São Paulo. Até o momento, o país tem 24 casos confirmados e outros 235 estão em investigação.

A perícia criminal realizada pelo Centro de Exames, Análises e Pesquisas do Instituto de Criminalística de São Paulo (IC/SP) apontou que as concentrações de metanol encontradas nas garrafas analisadas indicaram que a substância foi adicionada aos produtos, eliminando a possibilidade de contaminação por uma destilação natural malfeita.

No entanto, ao contrário do que alegam as publicações virais, até o momento nenhum caso de intoxicação está relacionado ao consumo de bebidas não alcoólicas, como café, água e Coca-Cola.

Vídeos gerados por IA

Uma busca no Google pelas frases “café contaminado por metanol”, “água contaminada por metanol” e “Coca-Cola contaminada por metanol” não levou a nenhuma reportagem desse teor. Uma pesquisa realizada no portal oficial do Jornal Nacional tampouco trouxe resultados compatíveis.

Uma análise das gravações virais mostrou que as postagens sobre a suposta contaminação em lotes da Coca-Cola contêm, no canto inferior esquerdo, uma marca d’água em inglês com a inscrição “AI-generated” (“gerado por IA”, em português), indicando que os materiais foram produzidos por inteligência artificial.

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Captura de tela feita em 7 de outubro de 2025 de uma publicação no Facebook com detalhe destacado pela AFP (.)

O AFP Checamos submeteu os vídeos, ainda, à plataforma InVid-WeVerifty, que permite identificar o uso de IA em conteúdos. O plugin de verificação indicou 98% de probabilidade e provas “muito sólidas” de manipulação.

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Captura de tela feita em 7 de outubro de 2025 do resultado obtido no plugin de verificação InVid-WeVerify (.)

Procurada pelo AFP Checamos em 7 de outubro de 2025, a assessoria de imprensa da Coca-Cola afirmou que “são falsos os vídeos que circulam nas redes sociais associando a Coca-Cola a bebidas adulteradas com metanol” e informou que não existe nenhuma investigação nesse sentido sobre a companhia. 

Em um comunicado enviado à AFP no mesmo dia, a multinacional indicou que não utiliza metanol em nenhum processo relacionado à fabricação das suas bebidas e que os refrigerantes não têm formação de metanol nas reações químicas. “Reafirmamos que todas as nossas bebidas seguem rigorosos padrões de qualidade e segurança e são 100% seguras para consumo”.

A Minalba Brasil, marca de água mineral exibida nas gravações virais, também negou a presença de metanol em seus produtos e informou que sua produção segue os padrões de qualidade e segurança em conformidade com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). “A Minalba Brasil reitera seu compromisso com a transparência e a segurança dos consumidores, assegurando que suas bebidas são 100% seguras para o consumo”, disse a empresa, em 9 de outubro de 2025, à AFP.

O mesmo reportou à AFP, em 8 de outubro de 2025, a Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), que afirmou nunca ter constatado um método de falsificação no café com metanol. 

“Apesar de o café ser um alimento da cesta básica e sofrer, eventualmente, com adulterações e falsificações, a ABIC desconhece o uso de metanol no produto. As fraudes já monitoradas no café nada tinham a ver com metanol, e não chegam a provocar essa gravidade que temos visto com as bebidas alcoólicas”, disse, em nota, a entidade.

À AFP, o Ministério da Saúde também assinalou, em 7 de outubro de 2025, que não foi notificado sobre nenhum caso de intoxicação por metanol em bebidas não alcoólicas, como café, água e Coca-Cola.

Conteúdo semelhante foi verificado por Estadão Verifica, Reuters e UOL Confere.

Referências

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