Vídeo de 2023 circula como se provasse que abertura de comportas causou a tragédia no RS
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- Publicado em 28 de maio de 2024 às 21:29
- 4 minutos de leitura
- Por AFP Brasil
“ALERTA URGENTE. Homem diz que comportas das Barragens em Rio Grande do Sul foram abertas, não foi as chuvas. 14/05/24 às 16:40”, diz a legenda sobreposta ao vídeo que circula no Instagram, no Kwai e no TikTok.
O mesmo vídeo também foi publicado no X sem indicação temporal, mas associado à atual situação no Rio Grande do Sul.
Na sequência, um homem filma um rio, enquanto narra: “Eis aí a prova máxima: estamos sobre o rio das Antas, no Belvedere, onde está a usina 14 de Julho (...) O lago da barragem, completamente normal. Da barragem pra baixo (...) destruição total, óbvio, abaixo da barragem. (...) Essa é uma das cinco barragens que foi aberta”.
A gravação circula em meio às fortes chuvas que atingem o Rio Grande do Sul desde o final de abril de 2024. O desastre climático afetou 469 municípios, provocando mais de 160 mortes e deixando cerca de 580 mil pessoas desalojadas.
Mas o vídeo viral não foi gravado em 2024 para provar que as enchentes foram causadas pela abertura de comportas.
Vídeo de 2023
A versão viral que circula sem indicação temporal contém uma marca d’água com o nome de usuário do TikTok. Ao consultar o perfil, foi possível identificar que a gravação foi publicada em 12 de setembro de 2023.
Nesse período, fortes chuvas também atingiram o estado gaúcho devido a um ciclone extratropical, impactando mais de 100 municípios. Na época, o episódio foi considerado a segunda maior cheia da história do rio Taquari, afetando mais de 35 mil pessoas e deixando mais de 40 mortos.
No vídeo viralizado, o narrador faz uma citação ao comentarista Alexandre Garcia ao dizer “isso aqui é Brumadinho gaúcho”. A menção deve-se à declaração de Garcia sobre a situação do estado em setembro de 2023.
Na época, o comentarista alegou que a tragédia não havia sido causada somente por chuvas, mas também pela “abertura” das comportas de três represas, construídas “em governos petistas”.
Em resposta, o governo federal publicou uma nota desmentindo a alegação e o ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, pediu a abertura de uma investigação contra o comentarista por “campanha de desinformação”.
Posteriormente, Garcia teve que ler um direito de resposta da AGU informando que “as três usinas [citadas] são do tipo vertedouro de soleira livre, não possuindo comportas para armazenamento ou retenção de água para a geração de energia, não controlando, portanto, o fluxo de água nos rios”.
À época, o AFP Checamos verificou uma alegação similar sobre uma outra barragem.
Barragens em 2024
Devido às fortes chuvas e ao aumento da vazão do rio das Antas, a barragem da usina 14 de Julho, a mesma citada no vídeo viral, rompeu parcialmente em 2 de maio de 2024. Os moradores foram alertados para deixarem a região.
Em 4 de maio, a Companhia Energética Rio das Antas (Ceran), que administra a barragem, informou sobre a abertura gradual e controlada das comportas com o objetivo de diminuir a pressão. Segundo a Ceran, a usina 14 de Julho tem comportas de vertedouro que são abertas somente “quando a água já está passando sobre a crista da barragem, para não sobrecarregar as estruturas, não alterando a vazão do rio”.
Ao AFP Checamos, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), responsável pelo monitoramento das barragens, informou que essa vazão não é capaz de intensificar as cheias do rios: “As barragens das usinas do Rio das Antas são do tipo soleira livre, ou seja, não possuem capacidade de armazenamento e regularização de cheias, são usinas do tipo ‘fio d'água’. Em outras palavras, as vazões afluentes são totalmente defluidas, portanto não há como agravar as cheias”.
A última atualização sobre a situação das barragens no rio das Antas, até a publicação desta checagem, foi feita em 12 de maio de 2024. Na ocasião, a Ceran informou que as barragens estavam estáveis e seguras.
O governo estadual também monitora a situação das barragens nos municípios e publicou, em 26 de maio, uma atualização colocando a usina 14 de Julho em nível de alerta, ou seja, “quando as anomalias representam risco à segurança da barragem, exigindo providências para manutenção das condições de segurança”.
A alegação viral é um dos conteúdos que circula nas redes sociais que criam teorias sobre a origem das inundações no Rio Grande do Sul.
Esse vídeo também foi checado por Estadão Verifica e Agência Lupa.
Referências
- Notas da Ceran sobre a barragem da usina 14 de Julho (1, 2, 3)
- Nota do governo estadual
- Alexandre Garcia lê direito de resposta da AGU
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