Biden propôs o aborto legal com base na decisão Roe vs Wade, ou seja quando o feto não é viável

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  • Publicado em 28 de outubro de 2020 às 21:11
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  • Por AFP México
  • Tradução e adaptação AFP Brasil
Publicações compartilhadas mais de mil vezes em redes sociais desde o início de outubro afirmam que Joe Biden, candidato democrata à Presidência dos Estados Unidos, prometeu legalizar o aborto em qualquer momento da gestação. Na verdade, Biden disse que, se eleito presidente, irá propor uma lei baseada na decisão Roe vs Wade, da Suprema Corte norte-americana em 1973, que permite o aborto enquanto o feto não é viável.

“Biden promete que aborto em qualquer mês de gestação vire lei nos EUA”, diz o título do artigo de um site de informação cristã, compartilhado mais de 1.900 vezes no Facebook, segundo a ferramenta de monitoramento CrowdTangle.

Conteúdo semelhante circula em outros portais (1, 2, 3), assim como no Facebook (1, 2, 3) e em postagens em espanhol.

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Captura de tela feita em 28 de outubro de 2020 de uma publicação no Facebook

Alguns dos textos compartilhados nas redes indicam que a suposta promessa de Biden foi feita quando o democrata respondia a uma pergunta de uma estudante chamada Cassidy Brown.

Uma busca no Google pelas palavras-chave “Biden + Cassidy Brown” levou à transcrição em inglês de um encontro organizado pela emissora NBC em Miami no último dia 5 de outubro, no qual a jovem questionou Biden sobre seus planos para proteger os direitos reprodutivos das mulheres nos Estados Unidos, considerando a nomeação da juíza Amy Coney Barrett à Suprema Corte.

Indicada pelo presidente e candidato republicano, Donald Trump, Barrett ocupará o cargo deixado por Ruth Bader Ginsburg, que faleceu em setembro deste ano e que se caracterizou por seu apoio aos direitos da mulher.

Barrett, vista como uma representante da direita religiosa, assegurou que sua fé católica não pesará em suas decisões, mas se negou a opinar sobre a decisão da Suprema Corte no caso Roe vs Wade, que legalizou o aborto nos Estados Unidos em 1973.

Biden, também abertamente católico, mas hoje favorável à interrupção da gravidez, disse em resposta a Cassidy Brown que desconhecia o que a juíza faria sobre este assunto, “mas que as expectativas são de que ela pode anular Roe [...]. E a única resposta responsável a isso seria aprovar uma legislação que faça de Roe uma lei federal [Law of the Land, em inglês]. É isso que eu faria”.

Na noite do evento, Trump enfatizou este ponto em um tuíte, no qual incluiu um vídeo da conversa de Biden com Cassidy Brown.

A resolução Roe vs Wade, considerada emblemática, foi uma decisão em que a Suprema Corte dos Estados Unidos reconheceu o direito das mulheres de interromper a gravidez enquanto o feto é considerado não viável, ou seja, quando não pode sobreviver fora do útero.

Por outro lado, quando o feto é viável, estabelece que os estados podem regular e, inclusive proibir o aborto, exceto em casos em que a saúde ou vida da mulher esteja em risco.

Na transcrição do evento organizado em Miami não há registro de que Biden tenha se referido a uma proposta que legalize a interrupção da gravidez em qualquer mês. Declaração semelhante tampouco foi reportada por meios de comunicação que noticiaram a fala do democrata (1, 2, 3).

Leis contra o aborto 

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Ativistas a favor e contra o aborto em uma manifestação em frente à Suprema Corte dos Estados Unidos em Washington, em 24 de janeiro de 2020

Os estados republicanos dos Estados Unidos têm conduzido uma ofensiva contra o aborto, com a aprovação de leis que vão contra a decisão Roe vs Wade.

Nos últimos anos, Georgia, Ohio, Mississippi, Kentucky, Iowa e Dakota do Norte promulgaram leis que proíbem a interrupção da gravidez a partir do momento em que é detectado o batimento cardíaco fetal, aproximadamente nas seis semanas de gestação.

Mas a decisão de 1973 da Suprema Corte permitiu que várias destas leis fossem bloqueadas por juízes federais, como aconteceu em 2019 no Mississipi, ou na Louisiana neste ano.

Nesse contexto, Biden propôs apresentar uma lei baseada na decisão Roe vs Wade “que reverta a agressão por parte do governo Trump e dos estados contra o direito das mulheres de escolher”, como diz em seu plano de saúde pública.

O candidato democrata, indica o plano, trabalhará para deter as leis estatais que violam o direito constitucional do aborto, como as chamadas “trap laws” (leis de armadilha), que prevêem ações como notificar os pais, períodos de espera obrigatório e a exigência de ultrassons, dificultando o acesso à interrupção da gravidez.

Uma lei federal invalidaria as leis estaduais sobre o aborto, já que a lei federal se aplica a todas as pessoas que vivem nos Estados Unidos e seus territórios.

Em resumo, não há registro de que Biden tenha proposto legalizar o aborto em qualquer mês da gestação. Na verdade, o candidato democrata afirmou que, se eleito presidente, legalizará o aborto enquanto o feto não for viável, transformando em lei federal um direito estabelecido pela Suprema Corte em 1973.

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