Um carro elétrico não pode ser recarregado instalando dínamos em suas rodas

Publicações compartilhadas mais de 120 mil vezes em redes sociais ao menos desde fevereiro de 2021 asseguram que é possível aproveitar a energia produzida por um carro elétrico ao instalar um gerador em suas rodas. No entanto, especialistas consultados pela AFP explicaram que o método não funcionaria, já que o consumo de energia do gerador seria maior do que o produzido.

“Pra quem não entendeu esse ai é um chevrolet bolt, um carro elétrico, o maluco adaptou um gerador de energia pra carregar as baterias com o giro da roda! Ou seja autonomia infinita…”, dizem publicações no Facebook (1, 2, 3), Instagram (1, 2, 3) e Twitter que compartilham uma foto do sistema atrelado a uma roda.

“O miserável é um gênio”, elogiam alguns dos usuários. Mensagem semelhante também circulou em espanhol, francês, inglês e russo.

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Captura de tela feita em 12 de janeiro de 2022 de uma publicação no Facebook ( .)

A equipe de checagem da AFP não conseguiu localizar a origem da imagem que acompanha as publicações, mas verificou que o registro circula ao menos desde dezembro de 2019 em um fórum no Reddit.

A foto foi publicada por um usuário que perguntou em inglês qual seria o motivo para o uso desse equipamento nos pneus, o que deu início a um debate sobre a possibilidade de se instalar um gerador como esse para que não fosse mais necessário carregar um automóvel elétrico em um terminal.

Não poderia funcionar

Embora usuários tenham valorizado a iniciativa nas redes sociais, o método não poderia funcionar na prática, segundo especialistas consultados pela AFP.

Para recarregar as baterias do veículo com esse método, a eletricidade produzida pela energia mecânica das rodas do carro e captada pelo gerador teria que ser maior do que a consumida pelas baterias do automóvel.

“Embora seja verdade que a instalação de um gerador permitiria recuperar a energia produzida pela rotação das rodas do automóvel, a publicação não especifica que um artefato como esse exigiria que o veículo consumisse ainda mais energia, o que reduziria sua autonomia”, explicou à AFP Adrien Lomonaco, engenheiro especializado em Novas Tecnologias.

O processo proposto nas publicações viralizadas vai contra uma regra da física: “O primeiro princípio da termodinâmica indica que a energia é conservada e que um processo de loop infinito é impossível se considerarmos as perdas por atrito entre o motor e as rodas, depois entre as rodas e o dínamo [gerador que converte força mecânica em corrente elétrica], explicou em 4 de agosto de 2021 Driss Laraqui, engenheiro de Energia.

Além disso, ao passar pelas diferentes partes do veículo, a energia produzida pelo gerador se dissiparia.

“O gerador conectado à roda produziria perdas na forma de calor”, explicou à AFP Frédéric Sirois, professor do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Polytechnique Montreal. “Como consequência, parte da energia extraída da bateria do automóvel terminaria inevitavelmente se dissipando em forma de calor, e isso não pode ser recuperado pela bateria”, acrescentou.

O serviço de checagem da Radio Canada também verificou a afirmação compartilhada nas redes.

Sistema de freio regenerativo

Para muitos veículos elétricos e híbridos, já foram desenvolvidos mecanismos que permitem utilizar a energia mecânica das rodas para economizar bateria e assim ampliar sua autonomia.

“É preciso saber que o motor do carro elétrico é reversível, ou seja, também pode funcionar como gerador, o que torna ainda mais inútil colocar um gerador externo na roda”, explicou Sirois.

Da mesma forma que o motor transforma a corrente elétrica em energia cinética para gerar as rodas, quando um motorista freia ou desce uma ladeira, ele gira no sentido contrário. Assim, o motor recupera energia cinética que é convertida em eletricidade para recarregar parcialmente a bateria.

Veículos elétricos em alta

Os carros completamente elétricos representaram 7,5% das vendas de novas unidades na Europa no segundo trimestre de 2021, frente a 3,5% no segundo trimestre de 2020, segundo a Associação Europeia de Fabricantes de Automóveis (Acea).

“Existe uma divisão entre a acessibilidade dos carros elétricos entre a Europa Central e Oriental e a Europa Ocidental, assim como uma divisão Norte-Sul”, destacou no início de julho de 2021 o diretor-geral da Acea, Eric-Mark Huitema.

As vendas de carros elétricos foram muito boas naquele semestre na Espanha, Alemanha e França em particular, mas também na Áustria e na Bélgica. Países de fora da União Europeia, como o Reino Unido e a Noruega, também registraram um forte aumento.

Mas o resto do continente europeu não segue essa tendência, sobretudo em países com uma renda per capita inferior a 17 mil euros, que se mantêm abaixo dos 3% das vendas de veículos elétricos.

A Comissão Europeia propôs em 14 de julho reduzir a zero as emissões de CO2 dos novos automóveis da União Europeia a partir de 2035. Se esse projeto de regulamento se concretizar, interromperia as vendas de veículos de gasolina e diesel para favorecer 100% os de motores elétricos, o que deveria estimular ainda mais o crescimento desse setor.

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( AFP / Jonathan WALTER, Laurence SAUBADU, Giulio FURTADO)

Na América Latina, estima-se que a venda de veículos elétricos e híbridos triplique até 2025, segundo projeções do Wilson Center, dos Estados Unidos.

No continente, a Costa Rica é um dos países mais avançados na promoção do uso desse tipo de automóvel e várias instituições públicas o incluíram em suas frotas, de acordo com as metas do Plano Nacional de Descarbonização.

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