Estas imagens não mostram a “tecnologia 7D” em um zoológico no Japão, nem em parques temáticos em Dubai
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- Publicado em 3 de dezembro de 2019 às 14:30
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- Por AFP México, AFP Paquistão, AFP Brasil
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“Japão faz apresentação de nova tecnologia 7D, Incrível [sic]”, lê-se na legenda de um dos vídeos, publicado em 13 de fevereiro de 2017 no YouTube, visualizado mais de quatro milhões de vezes e compartilhado mais de 4 mil, de acordo com a ferramenta CrowdTangle. Esta gravação aparece no Facebook ao menos desde fevereiro de 2016, mencionando a “TECNOLOGIA HOLOGRAMA 7D. INCRÍVEL!”, e com diferentes trechos em uma série de vídeos (1, 2).
Um site que compartilhou a informação e os vídeos diz que eles mostram a “nova tecnologia 7D” criada pela empresa “Magic Leap e consiste em projetar espécies de holograma com movimentos e cores claras e vívidas que conseguem refletir uma imagem hiper-realista. Mas esta tecnologia não é apenas sobre imagem, ela procura incorporar odores, sons surround e sensações”.
E assinala que esta tecnologia está sendo usada em espaços públicos em países como o Japão e cidades como Dubai. No Japão, aponta, existiria um zoológico sem animais reais, contando apenas com a tecnologia 7D.
Algumas gravações são compostas por fragmentos de várias: pode-se ver um golfinho que sai do chão de um museu, uma baleia na quadra de uma escola, um casal de pandas, uma girafa e um elefante caminhando em um shopping, um dinossauro indo na direção de uma família, uma orca se aproximando de uma criança e seus pais.
Estes fragmentos foram usados em diferentes edições do vídeo em espanhol, inglês, francês e russo. Todas estas publicações têm comentários de usuários que acreditam que existam projeções de realidade aumentada - neste caso de animais - que podem ser vistas normalmente e com as quais se pode interagir.
“Este compêndio de vídeos tenta mostrar uma experiência imersiva, ou seja, que uma pessoa interage de maneira direta com um elemento virtual, mas é falso… é algo que hoje em dia não existe”, afirmou em entrevista à AFP Alejandro García Romero, coordenador do laboratório de inovação tecnológica da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM).
Sobre este vídeo, García Romero comentou: “Há um fenômeno que se chama ‘design fiction’, no qual vários criadores simulam uma situação futurista. Acho que este vídeo não é mal intencionado, mas um exemplo de ‘design fiction’, de algo que hoje em dia não é real, mas que pode chegar a ser”.
Os vídeos
Por meio da busca reversa* de cada fragmento do vídeo, a AFP conseguiu encontrar a sua origem:
1 - O golfinho
O fragmento onde se vê um golfinho saltando apareceu neste vídeo no YouTube, publicado em 2013 pelo National Geographic. Na descrição do mesmo é explicado que ele foi gravado na estação de trem de Roterdã, na Holanda, como parte de uma mostra de realidade aumentada para celebrar o 125º aniversário da National Geographic Society.
2 - A baleia na quadra da escola
Uma baleia sai do piso da quadra de uma escola e um grupo de jovens se espanta ao vê-la. Este vídeo é atribuído à empresa especialista em tecnologia Magic Leap que, em 2016, publicou-o como um promocional do projeto no qual estavam trabalhando, como assegurou o seu fundador Rony Abovitz em sua conta no Twitter.
3 - Pandas, girafa e elefante
As três buscas reversas dos fragmentos onde apareceram estes animais mostraram como resultado este vídeo. Em uma publicação no VIMEO, de março de 2015, explica-se que a gravação foi feita no shopping Złote Tarasen, em Varsóvia, na Polônia, pela empresa Lemon&Orange, dedicada a criar softwares, para uma campanha de realidade aumentada nesse país.
4 - Um dinossauro diante de uma família
O registro mais antigo deste vídeo na Internet data de 3 de abril de 2014 e assegura que se trata de “uma mostra de animais em laser 7D em um shopping em Dubai”. No entanto, de acordo com este vídeo no YouTube, é uma exibição de realidade aumentada feita pela National Geographic no centro comercial Seef, localizado em Manama, capital do Bahrein, a 865 quilômetros de Dubai.
5 - A orca
Esta imagem aparece na sequência deste vídeo também publicado na plataforma VIMEO em janeiro de 2016. Em sua descrição, explica-se que foi gravado em Hong Kong pela empresa de tecnologia INDE.
Por e-mail, Livia Jozsa, diretora de marketing da INDE, assegurou à AFP que esse vídeo e estes dois (o dos ursos polares vistos sobre a suposta tecnologia 7D em versões em inglês) foram feitos por sua empresa.
“Posso confirmar que esses três foram capturados por nossa tela com sistema de realidade aumentada, BroadcastAR. As experiências de realidade aumentada incluem conteúdo 3D que foi criado completamente por nós”, disse Jozsa.
“Cada uma de nossas experiências BroadcastAR que podem ser vistas no vídeo foram instaladas para diferentes clientes, em locais e momentos distintos (Londres, Roterdã e Hong Kong), mas nenhuma foi instalada em um parque temático ou no Japão”.
A tecnologia 7D
Ao fazer uma busca no Google pelos termos “7D cinema” foi encontrado um vídeo intitulado “Simulador 7D” desta empresa italiana — que se autodenomina líder em atrações de realidade virtual — no qual um grupo de pessoas usa óculos 3D enquanto seus assentos se mexem, e cai água e espuma neles.
A loja on-line Alibaba vende, por sua vez, material com a descrição de tecnologia “7D”.
O engenheiro García Romero explicou à AFP que as projeções 2D, 3D, 4D e 5D foram assim denominadas pela indústria cinematográfica.
Os filmes 2D são “os normais”, os 3D incluem profundidade nos cenários onde se passa a produção e no 4D é agregado apenas o movimento dos bancos do cinema. As projeções 5D somam ambientação à sala: se na trama chove, o usuário será respingado com água, por exemplo.
No entanto, García Romero explica que os usuários ainda precisam de lentes ou visores para fazer parte das projeções 3D, 4D e 5D.
Para o especialista, a tecnologia atualmente se encontra na fase do 5D, embora possa chegar a ser chamada de diferentes maneiras pelas empresas especializadas.
Em resumo, os fragmentos de distintas gravações que fazem parte dos vídeos viralizados não mostram uma tecnologia com a qual se pode sentir e cheirar as projeções ou hologramas de realidade aumentada, já que isso ainda não existe. Tampouco foram gravadas em Dubai ou no Japão, pois tratam-se de diferentes vídeos feitos para publicizar projetos de realidade aumentada.
*Uma vez instalada a extensão InVid no navegador Chrome, clica-se com o botão direito sobre a imagem e o menu que aparece oferece a possibilidade de pesquisa da mesma em vários buscadores.