Vídeo de 2019 é distorcido para alegar que Kamala Harris disse que fechará o X nos Estados Unidos

A vice-presidente norte-americana e candidata democrata nas eleições presidenciais de novembro de 2024, Kamala Harris, não afirmou que fechará o X nos Estados Unidos caso seja eleita, ao contrário do que indicam publicações visualizadas milhares de vezes nas redes sociais desde 31 de agosto. O vídeo utilizado para embasar as alegações é de 2019 e, na ocasião, ao ser questionada sobre o possível banimento de Donald Trump da plataforma, então conhecida como Twitter, Harris opinou que sua suspensão seria correta, pois o ex-presidente teria utilizado a rede para intimidar testemunhas.

“ÚLTIMAS NOTÍCIAS: Kamala Harris pede a censura de X nos Estados Unidos , no estilo do Brasil e da Venezuela, se ela for eleita presidente em novembro: ‘Ela perdeu seus privilégios e deveria ser suspensa, já que sua mensagem chega a bilhões de pessoas.’ A vitória de Trump é urgente!”, diz uma das publicações compartilhadas no Facebook, no Instagram, no Threads, no Telegram e no Bluesky.

Alegações similares foram compartilhadas em espanhol e inglês — inclusive pelo proprietário do X, Elon Musk, e pelo ex-candidato presidencial independente Robert F. Kennedy Jr.

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Captura de tela feita em 5 de setembro de 2024 de uma publicação no Telegram (.)

As publicações circulam em meio ao bloqueio do X no Brasil, ordenado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes após a empresa não cumprir a determinação de nomear um representante legal no país, como exige a legislação brasileira.

Vídeo de 2019

Na gravação viralizada, Harris aparece conversando com o jornalista da CNN Jake Tapper, e afirma que as empresas de redes sociais devem ser mais responsáveis e compreender o poder que detêm. Ela diz: “Perdeu seus privilégios e deveria ser suspendido”, mas a sequência é editada de forma a recortar a quem ou a quê ela faz referência.

Uma busca por fragmentos do vídeo no Google conduziu à mesma filmagem, publicada em 17 de outubro de 2019 no perfil do jornal The Hill no X.

Uma nova pesquisa no Google, dessa vez limitada a essa data e incluindo palavras-chave da fala da vice-presidente, além de “CNN” e “Jake Tapper”, conduziu à transcrição do evento da emissora, que consistiu em uma análise do debate das primárias democratas de 15 de outubro de 2019.

No registro completo, Tapper questiona Harris sobre um dos tópicos que ela havia escolhido para falar no debate — a defesa de que o X, então Twitter, deveria suspender a conta do ex-presidente Donald Trump.

Em resposta, a então senadora acusa Trump de intimidar testemunhas após saber que a Câmara de Representantes abriria uma investigação formal contra ele, depois de um informante denunciar que Trump teria pedido para a Ucrânia investigar Joe Biden, seu principal adversário eleitoral em 2020. Harris afirmou:

“Donald Trump tem 65 milhões de seguidores no Twitter. Ele já provou que está disposto a obstruir a Justiça — pergunte a Bob Mueller. Você pode olhar o manifesto do atirador em El Paso para saber que o que Donald Trump diz no Twitter impacta a percepção das pessoas sobre o que elas deveriam ou não fazer.

E estamos falando de uma empresa privada, o Twitter, que tem termos de uso, e, na minha opinião, acho que a maioria das pessoas diria, incluindo membros do Congresso que foram ameaçados por ele, que ele perdeu seus privilégios e deveria ser suspendido”.

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A então senadora democrata da Califórnia Kamala Harris durante debate das primárias democratas da campanha presidencial de 2020 em Westerville, Ohio, em 15 de outubro de 2019 (AFP / SAUL LOEB)

Em uma publicação de 30 de setembro de 2019 no X, Harris já havia afirmado que o perfil de Trump “deveria ser suspenso”.

Fontes da CNN encaminharam à AFP a conta no X de Jake Tapper que, após a viralização do suposto anúncio de que Harris fecharia a plataforma, fez uma publicação explicando que o vídeo era de 2019 e que em nenhum momento se fez alusão a Elon Musk.

A mensagem inclui a transcrição da entrevista de Harris e o vídeo arquivado. A sequência compartilhada nas publicações virais pode ser vista a partir dos 35 segundos.

O Twitter bloqueou a conta de Trump em janeiro de 2021, citando “o risco de uma maior incitação à violência” após a insurreição no Capitólio dos Estados Unidos em 6 de janeiro daquele ano. Contudo, em novembro de 2022, ela foi restabelecida depois de Musk adquirir a rede social.

Referências

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