Performance feita no Brasil circula como se mostrasse franceses urinando em criança africana

Um vídeo de uma performance sobre exploração laboral no Brasil foi visualizado milhares de vezes nas redes sociais, desde 21 de setembro de 2023, como se exibisse uma criança africana sendo urinada por franceses, após um embaixador da França ter sido expulso do Mali, em 2022. No entanto, a gravação corresponde a uma atuação de uma artista guatemalteca, realizada na Universidade de São Paulo em 2013.

“Vamos tornar isto viral até que as pessoas responsáveis por este abuso dos direitos humanos sejam presas e processadas (...) A cena desumana e chocante de dois homens e uma mulher urinando numa criança africana, numa das aldeias francesas, e a criança, completamente despida, deitada de bruços no chão”, diz uma das publicações que circulam no Facebook e no TikTok.

As mensagens, que também circulam em espanhol e em países africanos de língua portuguesa (1, 2), acrescentam: “Isto ocorreu depois que o estado do Mali expulsou o embaixador francês. Os franceses prenderam um dos malianos numa aldeia francesa e urinaram nele publicamente. A África deve acordar para ver a verdadeira e feia face da França”.

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Captura de tela feita em 27 de setembro de 2023 de uma publicação no Facebook ( .)

Em 1º de janeiro de 2022, o embaixador francês no Mali, Joel Meyer, recebeu uma ordem para abandonar o país, em um forte sinal de deterioração dos laços entre a nação da África ocidental, que havia sido assolada por uma insurgência islâmica, e seu antigo governo colonial.

Porém, o vídeo viral não tem relação com esse fato.

Uma busca reversa por fragmentos da sequência no Google levou a uma publicação do Instituto Hemisférico de Performance e Política, da Universidade de Nova York, sobre uma atuação da artista guatemalteca Regina José Galindo, realizada no Departamento de Artes Cênicas da Universidade de São Paulo, em 2013.

Segundo o site, a performance se chama “Piedra” (Pedra) e retratava “o corpo das mulheres latino-americanas (...), que sobreviveu à conquista e à escravidão, que como uma pedra guardou o ódio e o rancor em sua memória para transformá-lo em energia e em vida”.

Na página, é possível ver fotos da atuação, que coincidem com o vídeo viral:

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Captura de tela feita em 27 de setembro de 2023 de uma publicação no site do Instituto Hemisférico de Performance e Política

Registros na página oficial da artista confirmam o lugar e o momento da obra:

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Captura de tela feita em 27 de setembro de 2023 do site oficial de Regina José Galindo

Uma busca no Google sobre Galindo levou a uma publicação de 2021 da revista Escena, da Universidade da Costa Rica, que analisa suas obras. Nela, explica-se que, em “Piedra”, Galindo “com o corpo nu, coberto de carvão, agachou-se e repousou o tórax sobre suas coxas em um espaço público para simular uma rocha que foi urinada por voluntários”.

Galindo disse à AFP, em 18 de setembro de 2023, que sua obra consistiu em “um trabalho que fala sobre as minas de carvão abertas em todo o Brasil e a exploração que sofrem as mulheres e crianças que ali trabalham”.

Referências

29 de setembro de 2023 Altera formatação do primeiro parágrafo

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