Publicações usam fotos de dois homens diferentes para afirmar que um pastor foi condenado à forca

Três fotos viralizaram nas redes sociais desde 2019 e voltaram a ser compartilhadas em 2021. As postagens assinalam que elas mostram um pastor condenado à morte na Síria por pregar o Evangelho. Mas isso é falso, pois as imagens são de duas pessoas distintas. O homem que sorri antes de morrer é um iraniano condenado por ter assassinado um juiz, enquanto o outro, um pastor, permanece vivo, mas preso.

“Esse Pastor foi condenado a morte na Síria por falar o Evangelho. E vai rindo pra forca pq sabe que já tá chegando a hora de se encontrar com Cristo. Enquanto uns Aqui no Brasil, só basta uma fofoca, que querem logo entregar o cargo e não quer ir mais a Igreja”, assinalam as legendas das publicações compartilhadas mais de 12,9 mil vezes no Facebook em 2019 (1), 2020 (1) e 2021 (1), e no Instagram.

Algumas publicações utilizam somente duas das imagens: a que o homem é visto prestes a ser enforcado e sorrindo, e a que ele é escoltado por agentes de segurança.

Embora os registros sejam autênticos, nenhum deles mostra um pastor cristão executado na Síria.

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Captura de tela feita em 28 de abril de 2021 de uma publicação no Facebook

O homem na forca

Por meio de uma busca reversa no Google, foi possível identificar que o homem que aparece sorrindo com a corda ao redor do pescoço e escoltado por homens encapuzados é Majid Kavousifar, um iraniano que foi executado junto com seu sobrinho em Teerã em 2007, por ter assassinado um juiz em 2005.

Uma série de fotos com crédito à Isna (Agência de Notícias Estudantil Iraniana) foram publicadas em um site de notícias em persa em agosto de 2007.

De fato, a fotografia em que Kavousifar é escoltado foi divulgada em 2 de agosto de 2007 pela Agência de Notícias da República Islâmica com crédito ao fotógrafo Alireza Sotakbar, da Isna.

O texto que acompanha as imagens indica: “Os assassinos do juiz de primeira instância de Teerã Hassan Moqaddas foram enforcados em público nesta quinta-feira no aniversário do assassinato do juiz. O falecido juiz foi morto a tiros em plena luz do dia depois de sair de um prédio da corte no norte de Teerã há dois anos”.

“Os dois assassinos, Majid Kavoosi-Far, 28, e seu primo, Hossein, 24, foram enforcados no local do assassinato, na rua Ahmad-Qasir”, acrescenta o artigo.

A execução de Kavousifar também foi reportada pela AFP. Na comparação feita abaixo é possível identificar os mesmos elementos na foto de Behrouz Mehri, da AFP, e nas imagens viralizadas com a atribuição à condenação à morte de um pastor.

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Comparação feita em 28 de abril de 2021 entre a publicação viralizada (E) e a imagem registrada em 2 de agosto de 2007 de Majid Kavousifar, em Teerã (Behrouz Mehri / AFP)

O homem no púlpito

Uma busca reversa pela terceira foto, que mostra um homem falando em um microfone atrás de um púlpito, levou a matérias publicadas em sites de notícias em diferentes idiomas (1, 2, 3). Trata-se de Youcef Nadarkhani, um pastor cristão que já foi condenado à forca, mas cuja sentença, aplicada no Irã e não na Síria, nunca foi cumprida.

A foto agora viralizada e vista em meios de comunicação foi atribuída à organização Present Truth Ministries, que publicou-a em julho de 2011 ao relatar sobre um veredicto inicial em seu caso.

Filho de pais muçulmanos no Irã, Nadarkhani se converteu ao cristianismo aos 19 anos. Em 2010, foi condenado à forca por apostasia, ou a renúncia de sua fé anterior, como registrado pela Comissão de Liberdade Religiosa Internacional dos Estados Unidos (USCIRF).

No entanto, em meio à represália internacional, a sentença foi revogada, e Nadarkhani foi absolvido em setembro de 2012.

O pastor foi preso novamente em 2016 sob acusação de agir contra a segurança nacional”. Inicialmente condenado a 10 anos de prisão, Nadarkhani teve a pena reduzida a seis anos em junho de 2020, segundo reportado pela ONG International Christian Concern.

Em 22 de fevereiro de 2021, a organização Freedom Now publicou um texto no qual informava que o Grupo de Trabalho em Prisões Arbitrárias das Nações Unidas emitiu um parecer considerando que o governo iraniano está violando as suas obrigações internacionais em direitos humanos com a detenção de Youcef Nadarkhani.

No documento publicado por esse grupo é mencionado que embora o governo iraniano tenha autorizado que 85 mil prisioneiros tirassem uma “licença” devido à pandemia de coronavírus, o mesmo não foi concedido a Nadarkhani sob a justificativa de ter “agido contra a segurança nacional”, o que não se enquadraria nesse critério.

Outras imagens da execução de Majid Kavousifar já foram verificadas pelo AFP Checamos.

Há alguma informação que você gostaria que o serviço de checagem da AFP no Brasil verificasse?

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