É falsa a dublagem em que Xi Jinping supostamente apoia Lula e o STF em resposta às tarifas dos EUA

  • Publicado em 3 de setembro de 2025 às 22:02
  • 4 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
O Ministério das Relações Exteriores da China criticou, em julho de 2025, as tarifas aos produtos brasileiros anunciadas pelos Estados Unidos. Nesse contexto, posts visualizados mais de 300 mil vezes desde 15 de agosto compartilham um vídeo que supostamente mostra o mandatário chinês, Xi Jinping, declarando apoio ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ao Supremo Tribunal Federal (STF), em resposta às tarifas e sanções impostas ao Brasil pelo governo norte-americano. Mas os conteúdos usam uma dublagem falsa. Na gravação original, de dezembro de 2024, Xi Jinping não menciona esses temas.

“Alerta máximo: a China acaba de aniquilar o principal plano de Trump!” é a frase sobreposta ao vídeo no Facebook, no Instagram e no TikTok.

A alegação é compartilhada junto a uma gravação em que o jornalista William Waack diz: “Donald Trump tem um plano simples: é ser o fortão, valentão, e garantir para os Estados Unidos o lugar único de superpotência. Mas todo mundo tem um plano até levar um soco na boca, e Trump levou um hoje”.

Associando a essa fala, na sequência é exibida uma gravação do presidente da China, com a seguinte dublagem, em português: “Gostaria de saudar o povo brasileiro e, em especial, o presidente Lula, e manifestar a solidariedade do povo chinês contra as graves e inadmissíveis ameaças do presidente americano contra as autoridades do Supremo Tribunal Federal, na figura do ministro Alexandre de Moraes, e na aplicação de sanções injustas contra a economia do Brasil. Ontem, liguei para o presidente Lula e disse a ele que a China, como principal parceira econômica do Brasil, não medirá esforços para minimizar os efeitos da Tarifa Trump na economia brasileira”, ouve-se em um trecho do vídeo.

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Captura de tela feita em 1º de setembro de 2025 de uma publicação no TikTok (.)

Em 9 de julho de 2025, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou tarifas econômicas de 50% ao Brasil sob uma justificativa política: defender o ex-presidente Jair Bolsonaro. 

O republicano afirmou que há uma “caça às bruxas” no Brasil contra o ex-mandatário, cuja condenação foi solicitada pela Procuradoria-Geral da República, em 15 de julho, por acusações como “organização criminosa armada” e “golpe de Estado”, com o objetivo de se manter no poder após perder a eleição para Lula em outubro de 2022.

Em 2 de setembro de 2025, o STF iniciou o julgamento de Bolsonaro e de outros sete réus.

A China já manifestou em diversos momentos apoio ao Brasil contra as tarifas impostas pelos Estados Unidos. 

Em 11 de julho de 2025, o Ministério chinês das Relações Exteriores criticou, por meio da sua porta-voz, Mao Ning, as tarifas aplicadas sobre a importação brasileira. “A igualdade de soberania e a não-intervenção em assuntos domésticos são princípios importantes da Carta das Nações Unidas e normas básicas nas relações internacionais”, disse.

Em 6 de agosto de 2025, o chanceler da China, Wang Yi, afirmou que seu país se opõe à “interferência externa injustificada” nos assuntos domésticos do Brasil. 

Mas a gravação viralizada não é verdadeira.

Uma pesquisa no Google pelas palavras ditas por William Waack na sequência viral exibiu a íntegra do comentário no site da CNN Brasil, em 27 de janeiro de 2025, sob o título: “China demole principal plano de Trump e as big techs”. A gravação também está disponível no canal da emissora no YouTube.

O jornalista se referia ao novo modelo de inteligência artificial (IA) desenvolvido pela empresa chinesa DeepSeek que, naquela data, fez com que empresas de tecnologia dos Estados Unidos e da Europa perdessem cerca de US$ 1 trilhão em valor de mercado.

O vídeo de Xi Jinping tampouco tem relação com as medidas impostas pelos Estados Unidos ao Brasil. Uma nova busca usando a captura de tela da gravação do líder chinês no Google Lens exibiu uma reportagem do jornal The Guardian, publicada em 31 de dezembro de 2024, sobre o discurso do mandatário.

Xi Jinping enviou uma mensagem pela passagem de ano e destacou as realizações da China em 2024 — não há menção a Lula, ao STF, a Moraes ou a Trump.

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Comparação feita em 3 de setembro de 2025 entre uma publicação no TikTok (E) e o vídeo publicado pela Embaixada da China no Brasil no X (.)

A íntegra da fala do mandatário chinês e a transcrição do vídeo também foram publicadas no X, no perfil da Embaixada da China no Brasil. 

Referências

  • Comentário de William Waack na CNN Brasil (1, 2)
  • Discurso do presidente chinês, Xi Jinping, em dezembro de 2024 (1, 2)

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