Publicações enganam ao atribuir exercício militar realizado desde 2018 a suposto rompimento da FAB com o governo federal

  • Publicado em 6 de agosto de 2025 às 23:21
  • 4 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
Entre julho e agosto de 2025, aviões e militares dos Estados Unidos participaram de um treinamento conjunto com a Força Aérea Brasileira (FAB), em meio à repercussão da taxa de 50% aplicada pelo presidente norte-americano, Donald Trump, aos produtos brasileiros. Diante disso, publicações nas redes sociais compartilham um vídeo com mais de 300 mil visualizações junto à alegação de que o exercício militar representaria a ruptura da FAB com o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Mas o treinamento acontece desde 2018 e os Estados Unidos participam efetivamente desde 2021. 

“EXÉRCITO BRASILEIRO FAZ ACORDO COM EXÉRCITO AMERICANO. Num gesto que quem abandona lulis, as FFAA fazem acordo com o exército dos EUA. 2 aviões cheios de soldados chegam em Cuiabá”, diz a legenda de um vídeo que circula no X, no Facebook, no Instagram, no Threads e no TikTok

No vídeo, o narrador afirma que “após 48 horas de comunicado oficial que as Forças Armadas Brasileiras decidiram firmar aliança com os Estados Unidos e abandonar Lula totalmente (...). Os Estados Unidos através de Trump faz aceno e manda dois megacargueiros repleto de militares americanos para o Brasil”

Ao final do conteúdo, é informado que as aeronaves pousaram em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, para o exercício militar Tápio 2025. 

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Captura de tela feita em 5 de agosto de 2025 de uma publicação no X (.)

De fato, a Base Aérea de Campo Grande recebeu entre julho e agosto de 2025 aeronaves e militares norte-americanos para um exercício militar, chamado Tápio, para simulações de missões de paz, guerra irregular, guerra eletrônica e ajuda humanitária. O objetivo é fortalecer a cooperação entre a FAB, o Exército, a Marinha e forças estrangeiras.

Mas, diferentemente do que as peças de desinformação levam a crer, esse exercício militar conjunto com os Estados Unidos não representa um rompimento da FAB com o governo brasileiro. 

Uma busca no site da FAB pelo termo “Tápio” levou a diferentes notícias que informam que a operação é realizada desde 2018. 

Em 2 de maio daquele ano, foi noticiado que o Exercício Operacional (EXOP) Tápio iria reunir mais de 700 militares e mais de 20 esquadrões para um treinamento na Base Aérea de Campo Grande. 

Segundo o texto, aquele era o primeiro grande exercício militar desde a reestruturação da FAB e tinha como objetivo preparar os militares para ações de Força Aérea em cenário similar ao de missões de paz da Organização das Nações Unidas (ONU). 

Em maio de 2019, a segunda edição do treinamento foi realizada e, além dos esquadrões aéreos da FAB, e também contou com a participação de outras unidades, como a Marinha do Brasil, o Exército Brasileiro e a Força Aérea dos Estados Unidos (USAF). 

No entanto, foi em 2021 que as outras Forças Armadas e a USAF começaram a participar efetivamente da operação com meios aéreos e militares em missões compartilhadas, que simulam um cenário de guerra irregular. 

Com a integração de militares das outras Forças Armadas e norte-americanos, que também estiveram no Brasil em 2022 e 2023, o treinamento passou a se chamar Exercício Conjunto (EXCON) Tápio. 

Imprensa não publicou rompimento da FAB com governo

A narração do vídeo compartilhado nas peças de desinformação também aponta que fontes militares ouvidas pela imprensa, como a CNN Brasil, afirmam que um “processo de realinhamento estratégico e institucional” das Forças Armadas, que “abandonaram” Lula, ocorre “em reação ao crescente isolamento geopolítico” e pela escalada de tensão com o presidente norte-americano.   

A citação se refere ao aumento da tensão entre Brasília e Washington devido à imposição de uma taxa de 50% sobre as importações brasileiras, anunciada no último dia 9 de julho pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em uma carta endereçada a Lula.  

Na carta, Trump chama de “caça às bruxas” o julgamento do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro, acusado de uma tentativa de golpe de Estado em 2022 para impedir a posse de Lula. 

A taxa entrou em vigor em 6 de agosto com uma lista de exceções de quase 700 produtos. 

O governo de Trump também revogou os vistos de oito magistrados do Supremo Tribunal Federal (STF), corte que julga o caso Bolsonaro, e aplicou sanções econômicas pela Lei Magnitsky ao ministro Alexandre de Moraes. 

Contudo, também não é verdadeiro que a imprensa noticiou um rompimento da FAB diante desse cenário. 

Na aba de notas oficiais do site da FAB não foram encontrados documentos que informem sobre tal rompimento. 

Uma busca com o termo “militar” no site da CNN Brasil tampouco levou a notícias que abordem informações do tipo.  

Em 23 de julho de 2025, o veículo noticiou que, frente à escalada da tensão entre Washington e Brasília devido ao tarifaço de Trump, as Forças Armadas brasileiras estariam preocupadas com o efeito da medida em negócios e exercícios militares conjuntos. 

Em outra notícia, publicada em 29 de julho, os militares ouvidos pela reportagem reafirmaram a preocupação com os impactos nos projetos estratégicos da base industrial de defesa. 

Mas em nenhum dos textos é abordada uma suposta ruptura da FAB com o governo Lula. 

Esse conteúdo também foi checado pelo Estadão Verifica

Referências

  • Notícias sobre o exercício Tápio (1, 2, 3, 4, 5, 6)
  • Notícias da CNN Brasil sobre Forças Armadas e o tarifaço (1, 2

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