Publicações deturpam decisão do STJ sobre furto de celular

  • Publicado em 16 de junho de 2025 às 19:28
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  • Por AFP Brasil
Em abril de 2025, o ministro Antonio Saldanha, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), concedeu a um homem condenado por roubo em primeira instância um habeas corpus para desclassificar o delito. Em maio de 2025, publicações com mais de 100 mil visualizações repercutiram nas redes sociais a alegação de que a corte decidiu que “tomar o celular bruscamente da mão da vítima não configura o crime de roubo”. Contudo, as publicações omitem que o crime foi tipificado como furto — decisão que conta com precedentes.

O Ministro Antônio Saldanha, do STJ, afirmou que ‘tomar o celular bruscamente da mão da vítima não configura o crime de roubo.’ O STF / STJ se tornaram um escritório de advocacia do crime organizado”, diz a legenda de uma publicação no X. Conteúdos semelhantes circulam no Instagram, no Facebook e no Kwai.

A alegação começou a circular depois que a deputada estadual Índia Armelau (PL-RJ) repercutiu uma decisão do STJ, na qual um homem condenado por roubo na primeira instância teve a sentença reclassificada como furto. 

Ou seja, se o vagabundo, ordinário, não estiver com uma faca, não estiver com uma arma, esquece que não é roubo. Você ‘tá’ fazendo um favor pra vítima da sociedade, você ‘tá’ entregando o celular pra ele”, afirmou a deputada, ao ler uma notícia sobre a decisão em um vídeo publicado em suas redes sociais.

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Captura de tela feita em 12 de junho de 2025 de uma publicação no X (.)

Mas as publicações enganam ao dar a entender que o STJ decidiu que não houve crime no caso citado.

Entenda o caso 

Segundo o processo do STJ, o réu foi preso em flagrante em 2019 pelo delito de furto após tomar o celular de uma mulher utilizando força. Mas ele foi condenado pelo crime de roubo pelo Tribunal de Justiça de Alagoas em 2023.

O furto está previsto no artigo 155 do Código Penal e é descrito como “subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel”. Já o roubo está no artigo 157 e se diferencia do furto pelo emprego de “grave ameaça ou violência a pessoa”.

Procurada pelo AFP Checamos, a assessoria de imprensa do STJ explicou que a defesa e a acusação concordaram em enquadrar o crime como furto. Entretanto, o juiz de primeiro grau optou por tipificar o crime como roubo simples. “Ele entendeu que houve violência na ação pela intimidação que o agente impôs à vítima”, disse em nota.

A Defensoria Pública de Alagoas recorreu e o caso foi analisado pelo ministro Antonio Saldanha, do STJ, que, em abril de 2025, desclassificou o crime de roubo por furto por arrebatamento. O ministro justificou a decisão pelo entendimento de que o réu não exerceu “grave ameaça ou violência contra a vítima, tendo o ato violento sido direcionado exclusivamente às coisas”.

Precedente de 2020

Para justificar a decisão, o ministro Saldanha citou como precedente o Agravo em Recurso Especial (AREsp) nº 1604296, de 2020.

O recurso em questão foi movido pelo Ministério Público, que buscava enquadrar de furto para roubo um caso de arrebatamento de bolsa. A corte entendeu que não havia motivo para classificar o crime como roubo porque a violência foi dirigida exclusivamente ao objeto da vítima.

Ao votar, o relator do processo afirmou que, de acordo com a jurisprudência, “o crime de roubo se diferencia do furto pelo emprego de violência, física ou moral, dirigida contra o detentor da coisa, ou seja, contra pessoa”.

A assessoria do STJ apontou que há 6 acórdãos e 156 decisões monocráticas sobre furto por arrebatamento e que, conforme os precedentes, a corte entende que “o arrebatamento de objeto preso ao corpo da vítima, comprometendo sua integridade física, caracteriza o crime de roubo, não de furto. Porém, se a força é empregada sobre o bem, não sobre a pessoa, e esta não se machuca, a tipificação é de furto por arrebatamento”.

Referências

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