É falso que Miriam Leitão foi acusada de assalto a bancos e beneficiada pela Lei da Anistia

  • Publicado em 29 de novembro de 2024 às 19:35
  • 4 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
A jornalista Miriam Leitão se posicionou a favor da punição dos envolvidos na tentativa de golpe de Estado no Brasil em 2022. Diante disso, publicações com mais de 200 mil interações nas redes apontam uma suposta contradição, alegando que ela foi absolvida pela Lei da Anistia após ter sido presa por assaltar agências bancárias à mão armada durante a ditadura militar. Mas a jornalista foi presa no período por integrar o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), à época clandestino, e absolvida em 1974, cinco anos antes da promulgação da Lei da Anistia.  

“Amélia foi anistiada pela Lei da Anistia. Acusada de assaltos a agências bancárias com revólver 38 na mão. Não devolveu o dinheiro e nem foi presa. Agora resolve dizer NÃO à anistia dos Patriotas que estavam com Bíblia nas mãos. Amélia trabalha na Globo…”, lê-se na publicação que compartilha uma ficha criminal no Instagram, no Facebook, no YouTube e no X

Na imagem é possível ler o nome “Miriam Azevedo de Almeida Leitão” e “CODINOME: AMÉLIA”

A alegação de que Leitão teria sido beneficiada pela Lei da Anistia também circula no TikTok e no Telegram.

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O conteúdo começou a circular após a jornalista se posicionar (1, 2) a favor da punição para os militares presos por uma operação que investiga uma suposta tentativa de golpe de Estado em 2022. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 36 pessoas também foram indiciados como parte da investigação. 

A peça de desinformação também faz referência à discussão para anistiar os presos pelos atos de 8 de janeiro, quando apoiadores do ex-mandatário atacaram as sedes dos Três Poderes em Brasília, uma semana após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 

Mas, diferentemente do que alegam os conteúdos virais, a jornalista não foi anistiada pela lei e tampouco foi acusada de assaltar bancos à mão armada. 

Presa na ditadura militar 

Uma busca no Google pelos termos “Miriam Leitão” e “prisão” levou a uma publicação do projeto Documentos Revelados, que torna públicos documentos do Superior Tribunal Militar (STM), com a mesma imagem da ficha criminal vista nas mensagens compartilhadas. 

O texto informa que Miriam Leitão foi presa durante a ditadura militar em dezembro de 1972, junto do ex-marido Marcelo Netto, em Vitória, Espírito Santo. O site também publicou uma parte da entrevista de Leitão para o Observatório da Imprensa sobre as torturas que sofreu, grávida, durante os três meses em que ficou detida. 

Outra busca no Google, agora com os termos “documentos” e “ditadura”, levou ao projeto Brasil Nunca Mais, que também disponibiliza processos do STM do período militar. 

Uma busca no site com o nome da jornalista levou a informações sobre sua detenção.

A página descreve que Leitão era do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), à época clandestino, e que foi acusada junto de outros integrantes, pelo Ministério Público Militar, de “agrupamento prejudicial à segurança nacional e propaganda subversiva”. A jornalista foi absolvida da acusação em 1974. 

Já a Lei da Anistia, citada nas publicações virais, foi promulgada em 28 de agosto de 1979 para conceder anistia aos presos políticos da ditadura. Ou seja, cinco anos após a absolvição da jornalista.

O Checamos não identificou registros que informem que Leitão já foi acusada por assalto à mão armada. 

Alegação antiga

A alegação de que a jornalista teria sido presa por roubar bancos com uso de armas circula ao menos desde 2018 e já foi verificada pelo Checamos. À época, as peças de desinformação alegavam que Leitão havia assaltado o “Banco Banespa da Rua Iguatemi, em São Paulo” em “06/Outubro/1968”.

O Checamos não encontrou nenhum registro sobre o assalto citado nas publicações. No entanto, identificou em pesquisa na Hemeroteca da Biblioteca Nacional um exemplar do periódico Tribuna da Imprensa, de 7-8 de dezembro de 1968, que cita um assalto ao banco.

O texto informa que o assalto reproduziu “a mesma tática usada há dois meses”, quando “oito homens, armados de revólveres e metralhadoras portáteis, assaltaram novamente o Banco do Estado de São Paulo, agência Iguatemi, situada na rua do mesmo nome, nº 1.364”

Embora seja uma descrição de outro assalto, a citação a um crime parecido “há dois meses” coincide com a data mencionada nas peças de desinformação. 

Em outubro de 1968, Miriam Leitão tinha 15 anos e ainda morava em Caratinga, Minas Gerais. 

Com a alegação circulando novamente, a jornalista reforçou ao Fato ou Fake, editoria de checagem de fatos grupo Globo, que as publicações virais são falsas: 

"É uma mentira recorrente. Para as pessoas que tiverem dúvidas sinceras eu gostaria de dar uma prova: em 1968 quando o tal assalto teria acontecido, eu era uma estudante secundarista em Caratinga Minas Gerais, de 15 anos, e nunca havia ido a São Paulo”, explicou. 

Leitão também esclareceu que não solicitou a sua anistia porque não foi condenada: “Nunca pedi, nem jamais recebi, indenização ou pensão pelas torturas sofridas."

Essa alegação também foi verificada por Estadão Verifica, UOL Confere e Reuters

Referências 

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