É falso que Miriam Leitão foi acusada de assalto a bancos e beneficiada pela Lei da Anistia
- Publicado em 29 de novembro de 2024 às 19:35
- 4 minutos de leitura
- Por AFP Brasil
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“Amélia foi anistiada pela Lei da Anistia. Acusada de assaltos a agências bancárias com revólver 38 na mão. Não devolveu o dinheiro e nem foi presa. Agora resolve dizer NÃO à anistia dos Patriotas que estavam com Bíblia nas mãos. Amélia trabalha na Globo…”, lê-se na publicação que compartilha uma ficha criminal no Instagram, no Facebook, no YouTube e no X.
Na imagem é possível ler o nome “Miriam Azevedo de Almeida Leitão” e “CODINOME: AMÉLIA”.
A alegação de que Leitão teria sido beneficiada pela Lei da Anistia também circula no TikTok e no Telegram.
O conteúdo começou a circular após a jornalista se posicionar (1, 2) a favor da punição para os militares presos por uma operação que investiga uma suposta tentativa de golpe de Estado em 2022. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 36 pessoas também foram indiciados como parte da investigação.
A peça de desinformação também faz referência à discussão para anistiar os presos pelos atos de 8 de janeiro, quando apoiadores do ex-mandatário atacaram as sedes dos Três Poderes em Brasília, uma semana após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Mas, diferentemente do que alegam os conteúdos virais, a jornalista não foi anistiada pela lei e tampouco foi acusada de assaltar bancos à mão armada.
Presa na ditadura militar
Uma busca no Google pelos termos “Miriam Leitão” e “prisão” levou a uma publicação do projeto Documentos Revelados, que torna públicos documentos do Superior Tribunal Militar (STM), com a mesma imagem da ficha criminal vista nas mensagens compartilhadas.
O texto informa que Miriam Leitão foi presa durante a ditadura militar em dezembro de 1972, junto do ex-marido Marcelo Netto, em Vitória, Espírito Santo. O site também publicou uma parte da entrevista de Leitão para o Observatório da Imprensa sobre as torturas que sofreu, grávida, durante os três meses em que ficou detida.
Outra busca no Google, agora com os termos “documentos” e “ditadura”, levou ao projeto Brasil Nunca Mais, que também disponibiliza processos do STM do período militar.
Uma busca no site com o nome da jornalista levou a informações sobre sua detenção.
A página descreve que Leitão era do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), à época clandestino, e que foi acusada junto de outros integrantes, pelo Ministério Público Militar, de “agrupamento prejudicial à segurança nacional e propaganda subversiva”. A jornalista foi absolvida da acusação em 1974.
Já a Lei da Anistia, citada nas publicações virais, foi promulgada em 28 de agosto de 1979 para conceder anistia aos presos políticos da ditadura. Ou seja, cinco anos após a absolvição da jornalista.
O Checamos não identificou registros que informem que Leitão já foi acusada por assalto à mão armada.
Alegação antiga
A alegação de que a jornalista teria sido presa por roubar bancos com uso de armas circula ao menos desde 2018 e já foi verificada pelo Checamos. À época, as peças de desinformação alegavam que Leitão havia assaltado o “Banco Banespa da Rua Iguatemi, em São Paulo” em “06/Outubro/1968”.
O Checamos não encontrou nenhum registro sobre o assalto citado nas publicações. No entanto, identificou em pesquisa na Hemeroteca da Biblioteca Nacional um exemplar do periódico Tribuna da Imprensa, de 7-8 de dezembro de 1968, que cita um assalto ao banco.
O texto informa que o assalto reproduziu “a mesma tática usada há dois meses”, quando “oito homens, armados de revólveres e metralhadoras portáteis, assaltaram novamente o Banco do Estado de São Paulo, agência Iguatemi, situada na rua do mesmo nome, nº 1.364”.
Embora seja uma descrição de outro assalto, a citação a um crime parecido “há dois meses” coincide com a data mencionada nas peças de desinformação.
Em outubro de 1968, Miriam Leitão tinha 15 anos e ainda morava em Caratinga, Minas Gerais.
Com a alegação circulando novamente, a jornalista reforçou ao Fato ou Fake, editoria de checagem de fatos grupo Globo, que as publicações virais são falsas:
"É uma mentira recorrente. Para as pessoas que tiverem dúvidas sinceras eu gostaria de dar uma prova: em 1968 quando o tal assalto teria acontecido, eu era uma estudante secundarista em Caratinga Minas Gerais, de 15 anos, e nunca havia ido a São Paulo”, explicou.
Leitão também esclareceu que não solicitou a sua anistia porque não foi condenada: “Nunca pedi, nem jamais recebi, indenização ou pensão pelas torturas sofridas."
Essa alegação também foi verificada por Estadão Verifica, UOL Confere e Reuters.