“Lulinha” não comprou avião de US$ 50 milhões, e tampouco é sócio da JBS e da Oi

  • Publicado em 27 de novembro de 2024 às 18:23
  • 6 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
Os filhos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) são alvos frequentes de desinformação nas redes sociais. Nesse sentido, publicações visualizadas mais de 290 mil vezes desde 11 de novembro de 2024 compartilham a alegação de que Fábio Luís Lula da Silva, ou “Lulinha”, teria comprado um avião por US$ 50 milhões com dinheiro público, e seria sócio das empresas JBS e Oi. Mas o conteúdo, que circula ao menos desde 2014, é falso: pesquisas em bancos de dados de aviação não mostram registro de que a aeronave tenha pertencido a Lulinha, que também não é sócio das empresas citadas.

Tal pai, tal filho. Avião do filho do Lula. Um Dos Mais caro e luxuoso em sua categoria. Nada Mal para quem Limpava Bosta de Elefante. 50.000.000,00 milhões de dólares. Pago com o dinheiro do povo brasileiro. A Riqueza do LULINHA. Sócio majoritário dos Frigoríficos JBS, Sócio majoritário da Telefonia OI. Aqui um brasileiro que o LULADRÃO tirou da pobreza seu BANDO DE TROUXAS”, diz o texto sobreposto a uma publicação compartilhada no Facebook.

O conteúdo também circula no Instagram, no X e no TikTok, e foi enviado ao WhatsApp do AFP Checamos, para onde os usuários podem encaminhar mensagens vistas em redes sociais, caso duvidem de sua veracidade.

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Captura de tela feita em 22 de novembro de 2024 de uma publicação no TikTok (.)

No conteúdo viral, os dizeres sobre um dos aviões “mais caros” da sua categoria e o “filho do Lula” estão sobrepostos a uma imagem de uma aeronave preta com detalhes em branco e uma fotografia de um dos filhos do presidente, Fábio Luís Lula da Silva.

Mas as alegações são falsas e circulam ao menos desde 2014.

Aeronave Gulfstream

Uma busca reversa pela imagem do avião conduziu a sites de aviação (1, 2) que identificam a aeronave como um “Gulfstream American G-1159A” ou “Gulfstream G-III”, modelo fabricado em 1983, com número de registro, — código alfanumérico que identifica a nacionalidade de uma aeronave — “N933PA”, o mesmo visto na imagem viral.

Uma busca no site FlightAware, que permite consultar dados de aviação e rastrear voos em tempo real, mostrou que o prefixo da aeronave estava ativo em 28 de maio de 2010, sob a propriedade da Wells Fargo Northwest Trustee, uma administradora fiduciária. Nesse tipo de contrato, a empresa administra o título e o registro de uma aeronave, mas não é responsável pela sua operação ou monitoramento. 

Em agosto de 2018, o Comprova, projeto de verificação do qual o AFP Checamos faz parte, apurou que o registro N933PA havia expirado e sido cancelado em 30 de junho de 2014. Com acessos atuais ao FlightAware, é possível confirmar que o número foi atribuído a um novo veículo — de número de série diferente — em julho de 2024.

O site de registros aéreos PlaneLogger estabelece que, até a expiração do prefixo, o avião havia pertencido a uma série de empresas: à Jet Aviation, à própria Gulfstream Aerospace Corporation, à Flo-Sun Aircraft, à NSHE Peru, à Executive Aircraft e, por último, em 2010, à Wells Fargo Bank Northwest Trustee.

A plataforma também indica a mudança do registro da aeronave ao longo do tempo. Em junho de 2013, ela aparece registrada para a Wells Fargo Bank Northwest Trustee em um novo prefixo: “N888SM”. 

Uma nova busca no site FlightAware, dessa vez pelo prefixo N888SM, mostra que, em 2017, a aeronave foi adquirida pela TVPX Ars Inc Trustee, também uma administradora fiduciária. Em fevereiro de 2021, o veículo passou à Airtrade Aviation Corporation e, em 26 de dezembro de 2022, ele foi vendido para um comprador particular em Toluca, no México. 

De maneira semelhante, o site FlightRadar24 informa que o jato atualmente tem um “proprietário particular”. 

Uma pesquisa pelo registro da aeronave na página da Administração Federal de Avião dos Estados Unidos (FAA, na sigla em inglês) confirma que ela foi vendida para um indivíduo no México. 

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Captura de tela feita em 25 de novembro de 2024 de uma consulta aos registros da FAA (.)

No ano de seu lançamento, nos anos 1980, a unidade da Gulfstream G-III custava cerca de US$ 37 milhões — já bem abaixo do preço listado nas publicações virais. Em 2018, quando o conteúdo foi verificado pelo Comprova, três aeronaves do tipo estavam à venda com preço exposto no site Controller, custando entre US$ 1,2 milhão e US$ 1,5 milhão. 

Em 22 de novembro de 2024, o Checamos encontrou três aeronaves à venda no mesmo site, nenhuma delas com o preço exposto.

Sócio majoritário da JBS e da Oi?

Além da alegação acerca da aeronave, as publicações virais também afirmam que Fábio Luís Lula da Silva seria sócio majoritário de duas grandes empresas brasileiras: a companhia do setor alimentício JBS e a empresa de telefonia Oi.

Uma consulta à RedeSim, ferramenta disponibilizada pela Receita Federal, conduziu aos quadros societários das duas empresas. O nome do filho do presidente Lula não consta em nenhum dos dois grupos.

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Captura de tela feita em 25 de novembro de 2024 de uma consulta na RedeSim (.)
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Captura de tela feita em 25 de novembro de 2024 de uma consulta na RedeSim (.)

Uma busca nas listas de diretores e membros dos conselhos e comitês da Oi (1, 2) e da JBS também não encontrou o nome de Fábio Luís. 

Uma nova consulta, dessa vez no CruzaGrafos, plataforma elaborada pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) que permite verificar ligações entre figuras públicas e empresas, também não mostrou qualquer relação entre as empresas — representadas nos conglomerados à esquerda — e Fábio Luís Lula da Silva — visto no pequeno grafo à direita.

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Captura de tela feita em 25 de novembro de 2024 de uma consulta à ferramenta CruzaGrafos (.)

De acordo com a ferramenta, Lulinha é sócio-administrador de três empresas: G4 Entretenimento e Tecnologia Digital Ltda, da qual também é representante legal, FFK Participações Ltda e LLF Tech Participações Ltda, que representa no Brasil. Além disso, ele consta como administrador da BR4 Participações Ltda. 

Este texto faz parte do Projeto Comprova. Participaram jornalistas do Jornal do Commercio. O material foi adaptado pelo AFP Checamos.

Referências

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