A parlamentar Erika Hilton em São Paulo, no Dia Internacional de Luta contra a LGBTfobia, em 17 de maio de 2022 ( AFP / Caio GUATELLI)

Boato de que Erika Hilton será ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos volta a circular em 2024

Publicado em 8 de outubro de 2024 às 21:18
6 minutos de leitura
Por AFP Brasil

A deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) já negou, em 2022, que assumiria o então Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos caso Luiz Inácio Lula da Silva (PT), à época candidato à Presidência, fosse eleito naquele ano. Em 2024, essa alegação voltou a circular dezenas de vezes nas redes sociais, junto à afirmação de que Hilton teria como metas promover a educação sexual para crianças ou oferecer silicone gratuitamente. Isso é falso: além de a pasta citada não existir mais, uma análise das propostas da deputada não mostrou correspondências com as iniciativas descritas.

“A primeira travesti eleita deputada, Erika Hilton, será a ministra da mulher, família e direitos humanos do governo Lula”, diz uma imagem compartilhada no Threads e no Facebook. O conteúdo também circula em forma de vídeo nessa plataforma e no Kwai.

“O convite foi feito nesta Terça-Feira, em uma reunião na sede do PT em SP”, continua a mensagem. “A Deputada tem como meta a criação de projetos como: - Educação Sexual para Crianças a partir de 6 anos em todas as escolas públicas do país, - cirurgias de colocação de silicone gratuitamente pelo SUS, - Tornar crime o impedimento de mulheres trans utilizarem o banheiro feminino, - Bolsa-Travesti, que garante uma renda mínima para todas as mulheres trans de periferia”.

Captura de tela feita em 4 de outubro de 2024 de uma publicação no Facebook (.)

Erika Hilton foi eleita deputada federal em 2022. Em fevereiro de 2024, tornou-se a primeira parlamentar trans a liderar uma bancada no Congresso Nacional.

Uma pesquisa no Google pelos termos “Erika Hilton ministra Lula” mostrou que a alegação de que Hilton seria ministra caso Lula fosse eleito circulou antes do pleito de 2022, no qual o petista concorreu à Presidência. Uma matéria publicada à época pelo veículo Correio Braziliense mostra que a deputada usou suas redes sociais para desmentir o boato.

Além disso, o ministério citado nas mensagens virais — Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) — não existe em 2024. A pasta mencionada foi criada em 2019, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022).

Com a posse de Lula, em 2023, foram criadas duas pastas separadas: o Ministério das Mulheres e o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

Em outubro de 2024, o cargo de ministra das Mulheres é ocupado por Cida Gonçalves, que assumiu em janeiro de 2023.

Já o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania era liderado por Silvio Almeida até o início de setembro de 2024, quando ele foi acusado de ter cometido assédio sexual e foi demitido do posto.

Em 27 de setembro de 2024, a ministra Macaé Evaristo foi empossada como sucessora de Almeida. Até a publicação desta verificação, ela permanece no cargo.

Propostas falsas

A mensagem viral também cita quatro metas de Erika Hilton enquanto suposta ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos: a promoção da educação sexual para crianças a partir de seis anos em todas as escolas públicas do país; a realização de cirurgias de colocação de silicone gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS); tornar crime o impedimento de mulheres trans utilizarem o banheiro feminino; e a criação de um programa que garantiria uma renda mínima para todas as mulheres trans que moram em periferias, que seria chamado “Bolsa-Travesti”.

No site da Câmara dos Deputados, é possível ver todas as propostas de autoria da deputada feitas em 2023, que totalizam 369. Uma análise dessas propostas feita pelo AFP Checamos não identificou nenhuma cuja ementa contivesse os termos “educação sexual”, “silicone” ou “bolsa-travesti”.

Com relação à população transexual, a pesquisa identificou quatro propostas relacionadas dentre as 369. A primeira delas é o PL 5123/2023, que dispõe sobre a criação do programa “Respeito tem Nome”, voltado para a promoção da cidadania de pessoas trans e travestis.

A segunda proposta identificada foi o PL 4886/2023, que propõe instituir o Dia Nacional da Visibilidade Trans.

O terceiro projeto identificado foi o PL 3109/2023, que propõe estabelecer uma reserva de vagas para pessoas trans e travestis nas universidades e demais instituições federais de ensino superior.

A última proposta voltada à população trans foi o PL 1058/2023, que busca garantir atendimento e encaminhamento especializados na Central de Atendimento à Mulher (Disque 180) às mulheres transexuais e travestis vítimas de violência.

Já em 2024, a deputada participou, até o momento da publicação deste texto, de 385 propostas. Da mesma maneira que em 2023, tampouco foram localizados projetos com os termos “educação sexual”, “silicone” ou “bolsa-travesti”.

Com relação a propostas legislativas de 2024 que envolvem a população transexual, o AFP Checamos identificou três projetos de lei (PL) de autoria da deputada: o PL 2668/2024, que dispõe sobre crimes homotransfóbicos nos sistemas de segurança pública; o PL 416/2024, que propõe que em todos os órgãos e entidades da administração pública federal seja fixada uma placa informativa sobre o respeito ao nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas trans e travestis; e o PL 354/2024, que propõe a criação de uma cota de 2% das vagas oferecidas nos concursos públicos e estágios profissionais da administração pública federal para pessoas trans e travestis.

Cirurgias para pessoas trans pelo SUS já é realidade

A mensagem viral afirma que uma das metas de Hilton enquanto ministra seria oferecer “cirurgias de colocação de silicone gratuitamente pelo SUS”, de maneira geral. No caso da população trans, porém, essa possibilidade já existe desde 2013.

A realização de cirurgias voltadas a pessoas transexuais no SUS foi prevista pela Portaria nº 2.803/2013 do Ministério da Saúde. Dentre os procedimentos listados no documento, está incluída a colocação de próteses mamárias de silicone.

Em fevereiro de 2024, Erika Hilton acionou o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) para que o órgão investigasse a paralisação dessas cirurgias nos hospitais do governo do estado de São Paulo. Segundo informações divulgadas pelo jornal Folha de S.Paulo, o procedimento não é realizado na rede estadual paulista desde 2019.

Uso do banheiro feminino por mulheres trans

Com relação ao uso do banheiro feminino por mulheres trans, também citado na mensagem viral, trata-se de uma discussão analisada a nível nacional pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Embora o Supremo tenha, em junho de 2024, encerrado o julgamento de um caso relacionado ao tema sem analisar o mérito da questão, a discussão deve voltar ao plenário da Corte. Isso porque a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) acionou o STF e protocolou cinco ações para garantir que mulheres transexuais possam utilizar banheiros femininos e outros espaços sem discriminação.

Este conteúdo também foi checado por UOL Confere e Aos Fatos.

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