Publicações confundem interesse de 159 instituições em sistema de pagamento russo com Brics Pay

O grupo de países emergentes Brics, do qual o Brasil faz parte, está desenvolvendo um mecanismo financeiro próprio como alternativa à plataforma internacional de pagamentos Swift. Por conta disso, publicações com mais de 38 mil interações nas redes sociais desde 16 de agosto de 2024 afirmam que “159 países” adotaram “o sistema de pagamentos do Brics”. Mas a alegação distorce uma declaração da presidente do Banco Central Russo sobre o interesse de “159 instituições” em outro projeto desenvolvido apenas pela Rússia, o SPFS.

“Cerca de 160 países irão adotar o novo pagamento do Brics, chamado ‘Brics Pay’”, lê-se na publicação compartilhada no Instagram, no Facebook, no Threads, no Kwai e no Telegram

Conteúdo semelhante foi publicado em francês, chinês, inglês, grego, romeno, búlgaro, alemão e eslovaco

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Captura de tela feita em 11 de setembro de 2024 de uma publicação no Instagram (.)

Inicialmente composto por Brasil, Rússia, Índia e China, em 2009, o Brics passou a incluir a África do Sul em 2010. O grupo tornou-se o Brics+ ao expandir-se em 2023 para cinco novos membros: Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Irã, Egito e Etiópia.

O bloco terá a sua 16ª reunião de cúpula, de 22 a 24 de outubro de 2024, na cidade russa de Kazan. Desde 2023, o grupo vem discutindo alternativas ao dólar no comércio internacional. Os países também trabalham para desenvolver uma plataforma financeira internacional para países-membro, o Brics Pay.

Origem da informação

Publicações que circulam em chinês desde agosto de 2024 compartilham um vídeo em que aparece uma publicação do portal Russia Today (RT) afirmando que “159 países” adotaram o sistema Brics. Ao fazer uma busca reversa no Google com fragmentos desse registro da RT, a AFP identificou um conteúdo de 22 de agosto de 2024 do meio de comunicação russo anunciando a retirada do que descreveu como “informações falsas”:

“Em 17 de agosto de 2024, o Russia Today (RT) publicou conteúdo em sua conta oficial do Weibo - ‘159 países adotarão o novo sistema de pagamento do BRICS’. Após verificação, [identificou-se que] esta notícia é uma informação falsa”, afirmou o RT na plataforma chinesa Weibo. “Pedimos sinceras desculpas por publicar esta notícia falsa".

A sucursal francesa do veículo, RT France, já disseminou alegações enganosas verificadas pela AFP. Em 6 de setembro de 2024, autoridades norte-americanas adotaram medidas contra funcionários do RT, acusando-os de interferir nas eleições presidenciais dos Estados Unidos.

“159 participantes” no sistema russo

Uma busca no Google pelos termos “sistema”, “financeiro”, “Brics” e “159”, em inglês, direcionou a uma reportagem publicada em 30 de janeiro de 2024 pela agência de notícias russa Sputnik. 

O texto informa que a presidente do Banco Central Russo, Elvira Nabiullina, disse à agência que “a Rússia tem um sistema de transferências financeiras que é uma alternativa ao Swift. Outros países têm infraestrutura semelhante. Estamos discutindo a interação com tais plataformas”. Ela especificou que “159 participantes estrangeiros de 20 países” haviam aderido ao sistema russo. 

Com as sanções internacionais tomadas contra a Rússia após a invasão da Ucrânia em fevereiro de 2022, a União Europeia excluiu diversos bancos russos do sistema internacional de transações financeiras Swift (Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication), utilizado, por exemplo, para fazer transferências bancárias. 

Nesse contexto, a Rússia está trabalhando para criar uma infraestrutura financeira própria. Os mecanismos em desenvolvimento incluem plataformas para pagamentos - por meio da criação dos cartões “Mir”, que funcionariam como equivalentes às bandeiras Visa e Mastercard - e para transferências, através de um sistema chamado SPFS, em substituição ao Swift. 

Nabiullina se referia, portanto, ao SPFS, e não ao Brics Pay.

Um porta-voz do Brics Pay disse à AFP em 6 de setembro de 2024 que a plataforma “não tinha conhecimento de quaisquer planos de implantação em 159 países, conforme indicado nas publicações enganosas nas redes sociais”. E acrescentou que “o trabalho no Brics Pay está progredindo, mas será um desenvolvimento gradual e sequencial”.

Referências

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