Comitê criado por reforma tributária se destina a gerir um imposto, não substituir Congresso
- Publicado em 23 de agosto de 2024 às 15:26
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- Por AFP Brasil
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A alegação foi publicada originalmente pela influenciadora digital Bárbara Destefani, conhecida por seus canais “Te atualizei”, em alguns de seus perfis, como o X. Destefani já foi apontada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) como propagadora de desinformação e teve suas contas desmonetizadas em 2021.
“Hoje, as leis de tributação no país são discutidas dentro do Congresso, com 513 deputados e 81 senadores. Com a criação desse ‘soviete tributário’, 27 pessoas serão escolhidas para poder fazer a gestão tributária de todos os valores arrecadados no país”, diz a influenciadora no vídeo, replicado por outros usuários no TikTok, no Facebook, no Instagram, e no Kwai.
Parte do conteúdo viral circula junto à hashtag “#sovietetributárionao”, uma alusão a comitês criados na antiga União Soviética, compostos por diferentes representantes da população, que constituíam a base da organização política desse regime.
As publicações se referem à aprovação pela Câmara dos Deputados, em 12 de agosto de 2024, do regime de urgência para a análise do segundo texto de regulamentação da reforma tributária, que institui o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). O texto foi aprovado pela Câmara em 13 de agosto e seguiu para análise do Senado.
O IBS foi um dos impostos instituídos pela reforma tributária promulgada em dezembro de 2023. De competência dos estados e municípios, ele substituirá os atuais ICMS e ISS.
Gestão do IBS
O Projeto de Lei Complementar 108/2024 prevê a regulamentação do comitê com o objetivo de cobrar, fiscalizar e distribuir a arrecadação do IBS entre estados e municípios.
Além disso, se aprovada sua criação, o comitê será responsável, junto à Receita Federal, por definir a metodologia de cálculo da alíquota do imposto "para os regimes específicos", ou seja, aqueles que se aplicam a determinados bens, como combustíveis, e serviços, como hotelaria, entre outros. Essa atribuição está descrita no inciso XIII, do artigo 2º do projeto de lei.
A criação do grupo já havia sido prevista em dezembro de 2023, em meio à aprovação da reforma tributária, instituída pela Emenda Constitucional 132.
As funções de legislar sobre questões tributárias ou gerir outros impostos além do IBS não estão previstas para o grupo, nem no texto de regulamentação nem na emenda constitucional.
Em nota, o governo federal negou que o comitê será responsável por legislar sobre impostos:
“A Emenda Constitucional 132/23 estabeleceu uma nova disciplina para a tributação do consumo no Brasil mediante instituição do IBS e da CBS [Contribuição sobre Bens e Serviços], que serão regidos exclusivamente por lei complementar. Nesta perspectiva, mantém-se nos legislativos estaduais e municipais a competência para legislar sobre a definição de suas respectivas alíquotas”.
O procurador da Fazenda Nacional e autor do livro “Reforma Tributária Comentada e Esquematizada”, Felipe Duque, confirmou ao Checamos que, segundo o projeto de lei, o comitê tratará especificamente do IBS, não de toda a arrecadação tributária do país.
Além disso, reafirmou que a nova instituição não terá a função de criar ou alterar leis, não “substituindo” o Congresso em qualquer de suas funções relativas a tributos. “O Comitê não pode alterar leis tributárias nem criar novos impostos, funções estas que permanecem com o Congresso Nacional”, destacou.
Atualmente, não há qualquer entidade com atribuição semelhante à prevista para o Comitê Gestor do IBS. “[Hoje], cada ente da Federação obtém a sua arrecadação tributária e, a partir disso, ele então aplica no destino onde ele entende que deve aplicar ou onde a Constituição determina”, ressaltou Tathiane Piscitelli, professora da FGV Direito SP ao Checamos.
Com a unificação do imposto, surge a necessidade de uma gestão unificada, pontuou a professora. “Evidente que, se há um tributo unificado para todas essas unidades da federação, é preciso uma gestão unificada. Essa gestão vai ser feita pelo Comitê Gestor do IBS”, explicou.
Composição do comitê
No vídeo viral, a influenciadora também afirma que “27 pessoas serão escolhidas para fazer a gestão tributária de todos os valores arrecadados no país”. Isso também é falso.
Conforme previsto no artigo 8º do projeto de lei, o Conselho Superior do comitê deve ser formado por, ao menos, 54 titulares, além de seus respectivos suplentes. Deles, 27 representarão “cada Estado e o Distrito Federal”, e os outros 27, “o conjunto dos Municípios e do Distrito Federal”.
Esses representantes serão escolhidos pelos chefes do Executivo de cada uma das esferas.
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