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Funai não distribui picanha para indígenas; vídeo viral foi retirado de um perfil de sátira

  • Publicado em 25 de julho de 2024 às 22:00
  • Atualizado em 26 de julho de 2024 às 20:38
  • 4 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
É falso que a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) tenha enviado picanha para um indígena, como alegam publicações nas redes sociais que somam mais de 3,6 mil interações desde 25 de junho de 2024. O vídeo viral foi retirado do perfil de um indígena do povo Waiãpi que produz conteúdos de humor. Além disso, a Funai confirmou à AFP que distribui cestas de alimentos, que não contêm picanha, em situações emergenciais; até o momento, o povo Waiãpi não recebeu esse auxílio na gestão federal atual.

“A picanha não foi pros trouxas fazedores de L, mas foi pra FUNAI usar os índios pra tomar terras”, diz a legenda compartilhada com o vídeo no Facebook, no Instagram, no Threads e no Kwai. A sequência também circula no X e no YouTube com mensagens similares. 

O conteúdo foi enviado ao WhatsApp do AFP Checamos, para onde os usuários podem encaminhar mensagens vistas em redes sociais, caso duvidem da sua veracidade.

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Captura de tela feita em 28 de junho de 2024 de uma publicação no X (.)

A gravação mostra um indígena cortando uma carne em pedaços e distribuindo para três cachorros. No final ele diz: “A Funai mandou 30 picanhas para os meus cachorros”.

O conteúdo é, no entanto, uma sátira. 

Perfil de humor

Em algumas das publicações viralizadas, é possível observar sobre o vídeo a marca d’água do nome de usuário @odaldeia no TikTok. Uma consulta a esse perfil identificou que a sequência foi publicada em 20 de junho de 2024.  

O titular da conta é o influenciador indígena Kauri Waiãpi, que já teve outro conteúdo usado em uma peça de desinformação verificada pela AFP anteriormente.

Na biografia do perfil do influenciador no Kwai é descrito que ele é “criador de comédia”.

Em uma página antiga no site da agência Music2/Mynd, que representa Kauri, há a seguinte descrição sobre o seu conteúdo: “Cria vídeos usando do humor para conscientizar e desmistificar o seu público sobre pautas indígenas”.

Por meio de uma busca nas redes sociais do influenciador pode-se identificar outros conteúdos em que ele cita supostos benefícios concedidos pela Funai — esses sinalizados com a hashtag “humor” (1, 2).

O influenciador já se pronunciou sobre seus conteúdos anteriormente. Em um vídeo publicado em seu canal no YouTube ele conta que começou a trabalhar com internet ao responder com humor algumas perguntas que recebia de usuários. Já em uma publicação no X, ele ironizou as interpretações que fazem de seus conteúdos.

A equipe do AFP Checamos entrou em contato com a assessoria de Kauri, mas não obteve retorno até a publicação desta checagem.

Picanha enviada pela Funai? 

Uma consulta no site da Funai com o termo “cesta de alimentos” levou a uma notícia de abril de 2024 que detalha uma ação de distribuição de cestas básicas no norte do país. O texto informa que o órgão desempenhou um papel de articulação e execução na atividade, mas que as cestas foram disponibilizadas pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS).

Outra busca, dessa vez no Google e com as palavras-chave “cesta básica” e “Waiãpi”, mostrou que a matéria mais recente sobre a distribuição para esse povo indígena data de 27 de outubro de 2021. 

Em entrevista ao AFP Checamos, a diretora de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável da Funai, Lucia Alberta, confirmou que o povo Waiãpi não recebeu cestas básicas na gestão atual: 

“Não entregamos cestas nem em 2023 nem em 2024 para nenhuma aldeia do povo Waiãpi. Ou seja, entende-se que eles estão em segurança alimentar e não necessitam de cestas de alimentos (...) O que tem [de registro e demanda] é de antes do período da pandemia, que todos os povos indígenas do país recebiam”, explicou em 24 de julho de 2024.

A diretora também desmentiu que o órgão tenha enviado peças de picanha para indígenas.

Segundo ela, a Funai atua como auxiliar na execução da distribuição de cestas básicas, mas essa ação é executada por meio do programa ADA, do MDS, quando identificada uma situação de emergência em terras indígenas, como estiagem ou doenças.  

O trâmite acontece da seguinte maneira: “A Funai recebe a convocação das unidades regionais, que recebem dos povos indígenas ou de organizações indigenistas parceiras, identificando uma situação de violação de direitos (...) Encaminhamos esse pedido para o MDS, que recebe e encaminha para a Conab [Companhia Nacional de Abastecimento]. É a Conab quem compra as cestas. Comprou as cestas, volta para a Funai (...) aí entramos em cena novamente para distribuir essas cestas dentro das terras indígenas”.

A Funai somente atua diretamente comprando alimentos e distribuindo para os indígenas em ocasiões pontuais, como eventos comunitários, assembleias e reuniões, explicou.

As cestas de alimentos enviadas pela Conab, normalmente, são compostas por alimentos não perecíveis, como fubá e arroz (1, 2). Na composição dessas cestas há também proteínas, que não são picanha, mas outros tipos de cortes. 

Referências

Complementa informação no 20º parágrafo
26 de julho de 2024 Complementa informação no 20º parágrafo

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