Vídeo não mostra diretor do X revelando “pressão” feita por Moraes, mas jornalista norte-americano

  • Publicado em 10 de maio de 2024 às 19:31
  • 5 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
Em meio ao embate público envolvendo o empresário e proprietário do X, Elon Musk, e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, usuários compartilham uma sequência nas redes sociais em que um suposto diretor da empresa revela ter sido “pressionado” pelo magistrado para ter acesso a dados privados de contas na plataforma. No entanto, a pessoa que aparece nas imagens é o jornalista norte-americano Michael Shellenberger, um dos autores do dossiê “Twitter Files Brazil”, falando sobre uma possível colaboração da rede social com autoridades brasileiras.

“Diretor do X no Brasil faz revelações bombásticas sobre Alexandre de Moraes”, diz o texto sobreposto ao vídeo que circula no Facebook, no Kwai, no TikTok e no YouTube.

O conteúdo também foi enviado ao WhatsApp do AFP Checamos, para onde os usuários podem encaminhar mensagens vistas em redes sociais, caso duvidem de sua veracidade.

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Captura de tela feita em 7 de maio de 2024 de uma publicação no TikTok (.)

Sobreposta à gravação do que parece ser uma entrevista, uma pessoa aparece afirmando: “Diretor do antigo Twitter, o atual X, revela como era pressionado por Alexandre de Moraes para ter dados sigilosos dos usuários e bloqueá-los para que não utilizem o aplicativo”.

Em seguida, o homem que seria o executivo da empresa começa a falar: “Neste caso do Brasil, era uma coisa que eu me senti muito chocado porque o governo, o TSE, eram muito agressivos pedindo a informação do Twitter, do X. Por exemplo, eles queriam informação privada sobre as pessoas, inclusive a informação de números telefônicos e também queriam ler as mensagens privadas das pessoas que utilizaram certos tipos de hashtags reclamando, por exemplo, sobre as eleições”.

E prossegue: “O governo ameaçou o advogado do Twitter brasileiro de perseguição criminal. É uma coisa que eu nunca tinha visto na minha vida. É uma coisa muito incrível. O Elon Musk disse que o Alexandre de Moraes pediu para o X fazer censura das pessoas e dizer que foi o X que decidiu, e não o Alexandre de Moraes. É uma coisa muito incrível, né, o governo querer o X para fazer censura e não tomar a responsabilidade e não dizer que não foi pedido pelo governo”

Por fim, ele critica movimentos que pretendem impedir que Donald Trump e Jair Bolsonaro (PL) sejam candidatos a cargos políticos em seus respectivos países.

O conteúdo circula em meio ao embate público entre Elon Musk e o ministro do STF Alexandre de Moraes. Em 6 de abril de 2024, Musk promoveu uma série de ataques contra o ministro — relator do inquérito das fake news — acusando o magistrado de censurar o X no Brasil e ameaçando não cumprir as determinações judiciais e reativar contas bloqueadas por propagarem desinformação no país. 

O empresário também chamou Moraes de “ditador” e disse que ele “deveria renunciar ou ser destituído”.

Como resultado, o ministro incluiu o bilionário no inquérito das “milícias digitais” por suposta instrumentalização criminosa da plataforma e determinou uma multa de R$ 100 mil por dia para cada conta bloqueada no X que for reativada.

Mas, ao contrário do que indicam as publicações, a pessoa que aparece no vídeo não é um diretor do X no Brasil.

Uma análise do material mostrou que, a partir de 59 segundos do conteúdo viral, a sequência mostra o logotipo do Poder360. Com base nesse indício, uma busca por palavras-chave no Google com os termos “Poder360”, “entrevista” e “Twitter” levou a um vídeo de uma entrevista do portal com o jornalista norte-americano Michael Shellenberger, de onde foi retirado o trecho que acompanha as publicações.

Uma pesquisa no Google por seu nome mostrou que, além de jornalista, Michael Shellenberger é escritor e cofundador do Environmental Progress e do The Breakthrough Institute, além de criador do Public, um projeto de jornalismo independente. 

Em suas redes sociais (1, 2) ele confirma essas informações, sem mencionar o suposto cargo de diretor do X no Brasil.

A mesma busca também levou a mais informações sobre o jornalista no site da Forbes e a um documento oficial do Congresso dos Estados Unidos, onde Shellenberger se apresentou em uma sessão sobre crise climática em 2020. O texto contém suas experiências profissionais e tampouco indica a suposta atuação como diretor do X.

“Twitter Files Brazil”

No final de 2022, após o empresário Elon Musk concluir a compra da plataforma então chamada Twitter (atual X), foram divulgados arquivos que indicaram uma possível colaboração da rede social com a campanha dos democratas nos Estados Unidos em 2020, incluindo um episódio envolvendo o filho do presidente-norte americano Joe Biden. 

Os documentos são baseados em trocas de e-mails entre a empresa e autoridades do país, que mostrariam pedidos para o bloqueio de contas e remoção de conteúdos na rede social, e o caso ficou conhecido como “Twitter Files”.

Em 3 abril de 2024, Michael Shellenberger publicou em sua conta pessoal no X arquivos sobre o Brasil, no que foi chamado “Twitter Files Brazil” (Arquivos do Twitter no Brasil, em tradução para o português). 

Na postagem, o jornalista diz que “o Brasil está envolvido em um caso de ampla repressão da liberdade de expressão comandada pelo ministro do STF Alexandre de Moraes”. Segundo ele, o ministro “procurou transformar as políticas de moderação de conteúdo do Twitter em uma arma contra apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro”.

Nas publicações constam capturas de tela da troca de e-mails entre funcionários do antigo Twitter que comprovariam as supostas pressões exercidas por membros da Suprema Corte para a remoção de contas e conteúdos na plataforma que não seguiam os critérios do Marco Civil da Internet ou que promoviam ataques às instituições, além da divulgação de notícias falsas na rede social.

O AFP Checamos não encontrou registros de pronunciamentos do ministro Alexandre de Moraes ou do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre o caso.

Conteúdo semelhante foi checado pela Agência Lupa.

Referências

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