O então ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, durante sabatina no Senado para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília, em 13 de dezembro de 2023 ( . / Evaristo SA)

Fala de Dino sobre penas alternativas para furtos viraliza sem contexto nas redes

  • Publicado em 7 de fevereiro de 2024 às 21:06
  • 3 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
Em 31 de janeiro de 2024, o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Flávio Dino defendeu que crimes menos graves fossem punidos com penas alternativas à prisão. Desde então, sua fala foi visualizada cerca de 1 milhão de vezes junto à alegação de que Dino “liberou” o furto e crimes similares. Mas, além de nenhuma decisão nesse sentido ter sido tomada até o momento, o ministro não defendeu a abolição de penalidade nesses casos, e sim o uso de alternativas, como prisão domiciliar e monitoramento eletrônico. Dino ressaltou mais de uma vez que isso não se aplicaria a crimes com violência.

“Já pode roubar à vontade”, lê-se em uma publicação compartilhada no TikTok que exibe um trecho de uma matéria da CNN Brasil. O conteúdo circula também no Facebook, no Instagram e no Kwai.

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Captura de tela feita em 6 de fevereiro de 2024 de uma publicação no TikTok (.)

No trecho da matéria da CNN Brasil usado nos conteúdos, é possível ler a chamada “Dino defende fim da prisão para crimes menos graves” e, logo abaixo, a informação de que ele citou, como exemplos, furtos e delitos de trânsito. 

Em seguida, a reportagem exibe um trecho da fala de Flávio Dino: “Nós sabemos, e isto é multissecular, que não é a gravidade propriamente da pena corporal, mas sim a certeza da punição, e punição não é igual à prisão”.

Flávio Dino liderava o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) até ser indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF), cargo que assumirá em 22 de fevereiro. Ele foi substituído pelo ex-ministro do STF Ricardo Lewandowski, que assumiu a pasta em 1º de fevereiro. Até sua posse na Suprema Corte, Dino retorna ao cargo de senador, que havia deixado quando assumiu o MJSP.

A fala em questão foi proferida por Dino durante uma coletiva de imprensa transmitida ao vivo em 31 de janeiro, na qual o ex-ministro do Executivo fez um balanço da segurança pública no Brasil em 2023.

No vídeo completo, é possível ver que, diferentemente do que induzem as publicações, Dino não sugeriu que crimes como furto e assaltos sejam “liberados”, e sim que o Estado passe a aplicar outros tipos de pena como forma de reduzir a população carcerária.

Em sua fala completa, Dino explica: “Nós devemos compreender que [...] as medidas chamadas de alternativas penais  — ou seja, a condenação para penas alternativas — não significam leniência, não significam fraqueza. Significam eficiência: um preso custa, mais ou menos, R$ 4.000 por mês. Um apenado com monitoramento efetivo custa R$ 400”.

“Então você vai encarcerar uma pessoa que não cometeu crime com violência e grave ameaça à pessoa? Não tem racionalidade até do ponto de vista fiscal”, continuou Dino.

Em seguida, o futuro integrante do STF também destaca que isso não seria o equivalente a soltar uma pessoa que cometeu um dos crimes citados: “Agora, claro que você não vai desencarcerar e botar no meio da rua: você tem que ter um sistema de acompanhamento, de monitoramento, para a alternativa penal ser rigorosa”.

Além disso, o conteúdo viralizado omite outro momento em que Dino destaca que esse tipo de punição alternativa ao encarceramento não se aplicaria a crimes graves, como estupro, homicídio e crimes hediondos.

Antes do trecho viral, no início do evento, o futuro integrante do STF também já havia abordado o tema, inclusive utilizando a frase “punição não é sinônimo de prender”.

“A prisão, o cárcere, deve ser reservado a crimes cometidos com violência e grave ameaça à pessoa. [...] O que nós defendemos é o uso proporcional da força. O que nós defendemos é o uso moderado da força, em que crimes mais graves recebem uma resposta penal igualmente grave, e crimes mais leves são respondidos por alternativas penais”, resumiu.

Em 2015, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou uma pesquisa segundo a qual foi constatado que, dos casos analisados, 46,8% dos réus foram condenados a penas privativas de liberdade e 12,2% a penas alternativas. Em alguns países europeus, como Reino Unido e Alemanha, o uso desse tipo de pena alternativa costuma ser muito mais amplo.

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