Lula não vetou “perdão” de Bolsonaro ao Fies; ambos aprovaram renegociação de dívidas

  • Publicado em 20 de dezembro de 2023 às 19:20
  • 5 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
O governo federal sancionou em 1º de novembro de 2023 uma lei que estabelece novas condições para a renegociação de dívidas do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Por conta da medida, publicações visualizadas mais de 1 milhão de vezes nas redes sociais desde 1º de dezembro afirmam que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou o “perdão” a dívidas do Fies concedido pelo ex-mandatário Jair Bolsonaro (PL) e que os estudantes terão que voltar a pagar. Mas em ambos os governos foi aprovado o refinanciamento para inadimplentes sob bases similares.

“A partir de segunda feira, vc já pode pagar a divida que Bolsonaro tinha perdoado!”, aponta o texto sobreposto a vídeos que circulam no Facebook, no Instagram, no TikTok, no Kwai e no X.

O AFP Checamos já verificou uma alegação similar de que Lula teria cancelado a renegociação do Fies aprovada por Bolsonaro.

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Captura de tela feita em 20 de dezembro de 2023 de uma publicação no TikTok ( .)

A sequência que circula é um combinação de vídeos, sendo o primeiro de uma reunião de Lula com o ministro da Educação, Camilo Santana (PT), em que ele anuncia ter sancionado o projeto de lei de renegociação do Fies, em novembro de 2023. Enquanto esse trecho é reproduzido aparecem as seguintes frases na tela: “Lula veta perdão ao FIES dado pelo Bolsonaro”, “Bolsonaro tinha dado o perdão na divida do FIES” e “Lula quer 54 bilhões da dívida do FIES”.

Em seguida é exibido o trecho de uma live de Bolsonaro, de 28 de julho de 2022, em que ele também informa sobre as condições para a renegociação do Fies e diz a frase “anistiado em até 99% do empréstimo”. Nesse há a frase sobreposta “Perdão da dívida do Fies”.

O Fies é um programa do governo federal que permite que estudantes sejam financiados pelo governo para fazerem a graduação, pagando posteriormente esse financiamento.

O vídeo viral começou a circular após o presidente Lula sancionar novas condições para a renegociação de dívidas do Fies, em novembro de 2023, e a aprovação da Comissão de Educação do Senado para a proposta de estudantes abaterem dívidas do Fies com a prestação de serviços públicos.

Contudo, as novas condições não significam que agora estudantes voltarão a pagar, uma vez que a proposta anterior também tratava da renegociação das dívidas com condições iguais às atuais, e não de uma liquidação integral.

Uma busca no Google pelos termos “Fies”, “Lula” e “novembro de 2023” levou a uma notícia do Palácio do Planalto em que é informado que a renegociação do Fies está disponível para os estudantes.

O texto da Resolução nº 55 “dispõe sobre a renegociação de dívidas relativas à cobrança de créditos do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies)” e estabelece cinco grupos que podem se beneficiar com a medida com descontos de 100% nos encargos e 77%, 92%, 99% ou 12% no valor consolidado da dívida, de acordo com o grupo em que o beneficiário se encaixa. A resolução amplia o prazo de amortização para 30 de junho de 2023 e a adesão para até 31 de maio de 2024.

Essa resolução considera o disposto na Lei nº 14.719, de 1º de novembro de 2023, que contém outros artigos sobre a retomada de obras destinadas à educação básica.

Texto aprovado por Bolsonaro

O texto decreta a revogação da Resolução nº 51, de 21 de julho de 2022, instituída por Bolsonaro. Contudo, a resolução revogada tinha o mesmo objetivo da norma atual e não abordava o perdão total das dívidas, como alega o conteúdo viral.

“Estabelecer os requisitos e as condições para realização das transações resolutivas de litígio relativas à cobrança de créditos do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies)”, dispõe a resolução de 2022, o mesmo objetivo que se lê no texto de 2023.

Assim como o instituído pela gestão Lula na Lei nº 14.719, o texto sancionado por Bolsonaro previa o abatimento de 99% do valor da dívida, segundo alguns critérios estabelecidos pela Lei 14.375. Os grupos de beneficiários e os descontos da lei atual também repetem o que foi aprovado por Bolsonaro, com o ajuste de prorrogação da data dos débitos vencidos.

O advogado especialista em Direito Estudantil Henrique Rodrigues explicou que, na verdade, a lei do governo atual “praticamente replicou o mesmo que foi concedido no governo anterior”. E ressaltou que ambas as medidas não concedem o perdão total às dívidas.

Uma diferença entre as resoluções é o prazo, que foi ampliado com a lei aprovada em 2023, uma vez que a anterior tratava sobre a amortização até 30 de dezembro de 2021 e adesão até 31 de dezembro de 2022.

Além disso, a resolução da gestão Bolsonaro tramitou primeiro como medida provisória, em 2021, e depois foi sancionada como projeto de lei, em 2022, ao contrário de Lula, que tratou sobre o assunto diretamente pela Lei nº 14.719.

Em nota enviada ao AFP Checamos em 13 de dezembro de 2023, o Ministério da Educação confirmou que a atual gestão não “cancelou ‘perdão’ de dívidas do FIES” e ressaltou que a medida aprovada pela gestão anterior não previa o abatimento integral das dívidas.

“Mesmo com essa iniciativa (a medida anterior), 1,280 milhão de graduados não conseguiram pagar o financiamento. Diante desse problema, que afeta a vida financeira dessas pessoas, o Governo Federal lançou o programa (...). Os estudantes que garantiram anteriormente descontos por meio de renegociação com o FIES não perderam os abatimentos e nem terão que pagar quantias a mais, como tentam convencer as peças de desinformação”, reiterou a nota enviada por e-mail.

O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), agente operador do programa, informou ao AFP Checamos por e-mail, em 20 de dezembro de 2023, que foram renegociados 31,15% dos contratos inadimplentes aptos ao benefício em 2022. Com a nova resolução, até o momento da publicação desta checagem, 122.207 contratos foram beneficiados.

A alegação de que Bolsonaro teria perdoado as dívidas do Fies já foi proferida por ele no debate presidencial de 2022, ocasião em que foi desmentido.

Esse conteúdo também foi checado por Aos Fatos, Agência Lupa e Reuters.

Referências

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