Brasil se comprometeu a diminuir a emissão de gás metano, e não a produção agropecuária

  • Publicado em 7 de agosto de 2023 às 16:40
  • 4 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não assinou um documento em que o Brasil se compromete a diminuir a produção agropecuária, como afirmam publicações com mais de 200 mil visualizações nas redes sociais desde 20 de julho de 2023. O conteúdo distorce o termo sobre a redução de emissões de gás metano firmado durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP), em novembro de 2021, durante o mandato de Jair Bolsonaro (PL), e ratificado pelo atual mandatário.

“Representantes do governo Lula concordaram em assinar um documento que compromete o país a cortar sua produção agropecuária nos próximos anos”, diz a legenda de uma publicação no Twitter, agora chamado X.

O conteúdo também circula no Facebook e Telegram.

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Captura de tela feita em 2 de agosto de 2023 de uma publicação no Twitter, agora chamado X ( .)

Alguns dos conteúdos virais compartilham um link para um artigo que cita um termo de compromisso assinado pelo Brasil e outros 12 países. A nota menciona o site da ONG The Global Methane Hub.

“A carta de intenções da organização aparece no site oficial da GMH, e destaca que os setores de alimentação e agricultura deverão trabalhar para reduzir o efeito do gás metano na atmosfera do planeta”, lê-se em um trecho do texto.

Uma busca não mostrou como resultado publicações na imprensa sobre um acordo feito pelo país nesse sentido. Contatado pelo Comprova, projeto do qual o AFP Checamos faz parte, o Ministério da Agricultura não respondeu até a publicação deste artigo.

Uma busca por palavras-chave levou ao termo de compromisso citado no conteúdo viral.

Termo assinado pelo Brasil em abril de 2023

Em 13 e 14 de abril de 2023 foi realizado em Santiago, no Chile, o evento First Ministerial Conference on Low Emission Food Systems (Primeira Conferência Ministerial sobre Sistemas Alimentares de Baixa Emissão, em tradução livre). O Brasil foi um dos 23 países participantes e um dos 13 que assinaram a declaração “Enfrentando o desafio de reduzir o metano na agricultura”.

O documento fala sobre as mudanças climáticas e o papel da agricultura sustentável, “fundamental para o desenvolvimento e a segurança alimentar em um planeta onde 10% da população global enfrenta a fome”. Nele, os signatários se comprometem com dez ações, mas não há menção ao corte da produção agropecuária ou algo semelhante.

Entre as ações propostas estão “avaliar o estado atual das políticas públicas e investimentos no setor e, quando apropriado, redirecionar esforços para aprimorar a inovação e apoiar agricultura, considerando elementos de economia circular, transição justa” e “facilitar e promover as condições favoráveis para a implantação de programas baseados na ciência prática, inovação e tecnologias em linha com a produção sustentável de alimentos e agricultura através do desenho e implementação de programas de adaptação às mudanças climáticas e políticas de mitigação”.

O texto destaca que a declaração “não implicará na adoção de medidas restritivas unilaterais ao comércio, coerentes com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC)”.

Compromisso do Brasil na COP26

A declaração assinada pelo Brasil em abril menciona outro documento que o país também referendou, o Compromisso Global do Metano.

Em novembro 2021, durante a COP26, em Glasgow, na Escócia, foi lançada a iniciativa Global Methane Pledge (GMP), convidando os países a tomarem ações voluntárias para contribuir com o objetivo coletivo de reduzir as emissões de metano em pelo menos 30% até 2030, em comparação com os níveis de 2020.

Nessa ocasião, o Brasil, governado por Bolsonaro, assumiu outros compromissos. O primeiro, de reduzir 50% de suas emissões de gases de efeito estufa (GEE) até 2030, usando como linha de base o ano de 2005 e como referência o Quarto Inventário Nacional de Emissões. O outro, em relação à Declaração dos Líderes de Glasgow sobre Florestas e Uso da Terra, que estabeleceu o objetivo principal de acabar com o desmatamento até 2030.

O terceiro é o Compromisso Global sobre Metano, estabelecendo o objetivo de reduzir as emissões de gás metano em 30% até 2030.

Uma avaliação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e da Coalizão Clima e Ar Limpo, divulgada em 2021, mostra que o metano é o principal contribuinte para a formação do ozônio ao nível do solo, sendo um poluente perigoso do ar e gás de efeito estufa. Segundo a pesquisa, a agricultura é fonte predominante do gás metano, principalmente em razão das emissões de animais, como o esterco, responsável por 32% do metano liberado no meio ambiente.

O gás metano também surge por meio de outras fontes, como o processo de produção de combustíveis fósseis (gás e carvão).

Esse texto faz parte do Projeto Comprova. Participaram jornalistas da Folha de S.Paulo e do Correio do Estado. O material foi adaptado pelo AFP Checamos.

Referências

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