Estas ciclistas trans não venceram uma corrida feminina; a competição admite todos os gêneros

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  • Publicado em 16 de março de 2023 às 20:47
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  • Por AFP Colômbia, AFP Brasil
Desde 2021, a corrida de ciclismo amador de Londres Thunder Crit mudou suas regras, passando a permitir a participação de pessoas trans e não binárias. Uma foto que mostra a atleta trans Emily Bridges no pódio da edição de 2022 dessa competição foi visualizada mais de 240 mil vezes nas redes sociais desde fevereiro de 2023, junto com mensagens que afirmam erroneamente que "dois atletas trans" conquistaram as duas primeiras colocações "em uma competição feminina de ciclismo". Mas a prova não é dividida em categorias feminina e masculina e sim em grupos com performances físicas semelhantes.

"Na Inglaterra dois atletas trans comemoram com um beijo o primeiro e o segundo lugar em uma competição feminina de ciclismo (Thundercrit). Em terceiro lugar ficou uma mulher que levou sua filha para o pódio", diz uma das publicações compartilhadas no Facebook, no Instagram, no Twitter e no TikTok.

O texto acrescenta: "Mulheres levaram séculos pra conquistar um espaço de destaque nos esportes pra agora os homens irem lá vestido de mulher e tirar isso delas".

O conteúdo também circula em espanhol.

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Captura de tela feita em 15 de março de 2023 de uma publicação no Facebook ( .)

A fotografia viral mostra três ciclistas em um pódio. As vencedoras do primeiro e do segundo lugar estão se beijando, enquanto a vencedora do terceiro lugar segura um bebê nos braços.

Uma busca reversa pela imagem no Google levou a um comunicado à imprensa, de junho de 2022, que inclui a mesma imagem e registra os resultados daquele ano da corrida Thunder Crit. O logotipo da competição também pode ser observado nos prêmios exibidos por pessoas no pódio.

Segundo o jornal inglês Daily Mail, pessoas criticaram nas redes sociais que as mulheres trans Emily Bridges e Lilly Chant venceram a competição contra a jovem mãe Jo Smith.

Corrida inclusiva

Ao contrário do que sugerem as publicações, a corrida Thunder Crit não possui uma categoria exclusivamente feminina ou masculina. De acordo com as regras divulgadas em seu site, a corrida é descrita como "inclusiva".

“Estamos comprometidos em criar um ambiente de corrida divertido e acolhedor para todos, independentemente de etnia, sexualidade ou gênero”, diz a organização.

Conforme explicado na página da competição, em 2021 o seu formato mudou, com a criação das categorias"Thunder" e “Lightning". Na primeira, os homens cisgêneros, ou seja, aqueles cuja identidade de gênero coincide com seu sexo biológico, enfrentam homens trans e pessoas não binárias com “uma performance física que se alinha com a de seus concorrentes cis”.

Já na segunda categoria, mulheres cisgênero competem com mulheres trans e pessoas não binárias com características físicas semelhantes. É, portanto, a performance física que diferencia as categorias e não os gêneros dos participantes.

A organização explica que esse tipo de classificação pode confundir, mas oferece canais de contato para definir em qual categoria os interessados podem participar.

Consultada pela AFP em 24 de fevereiro de 2023, a organização afirmou: “A competição não tem categorias de gênero e todos os competidores são informados das regras antes de participar”.

O resultado da categoria “Lightning", na sexta edição, realizada em 3 de junho de 2022, apontou Bridges como a vencedora. Ela aparece na foto beijando Chant, ambas mulheres trans. O terceiro lugar foi ocupado pela mulher cisgênero Jo Smith.

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Uma pesquisa no Google mostrou que, após ser inicialmente liberada pela União Ciclística Internacional em 2021, Bridges foi declarada "não elegível" para participar da categoria feminina do campeonato nacional britânico daquele ano, na prova omnium, apesar de ter se submetido a terapia hormonal para baixar seus níveis de testosterona.

Com uma outra busca no Google verificou-se que Smith, a corredora cisgênero que conquistou o terceiro lugar no Thunder Crit 2022, foi a vencedora nas edições de 2016 e 2017. Além disso, em uma publicação no Twitter em 4 de junho daquele ano, ou seja, um dia depois da corrida, ela disse estar "encantada" com o pódio.

"A todos que me enviaram mensagens sobre meu pódio no Thundercrit ontem, obrigada pela preocupação, mas estou encantada com meu pódio, muito orgulhosa de fazer parte da equipe que organiza um evento tão inclusivo e emocionante, e orgulhosa por competir com competidoras tão incríveis", escreveu em inglês.

Ela pediu, ainda, que direcionassem a "preocupação" com o futuro do ciclismo feminino para melhorar a cobertura televisiva, os salários e as oportunidades para ciclistas profissionais, em vez de com "uma corrida neutra em termos de gênero".

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