A autorização concedida pela Anvisa foi para pesquisa com hidroxicloroquina no tratamento da COVID-19

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  • Publicado em 31 de março de 2020 às 21:43
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  • Por AFP Brasil
Publicações compartilhadas nas redes sociais mais de 23 mil vezes desde 29 de março de 2020 afirmam que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou a cloroquina/hidroxicloroquina, inclusive com a indicação de posologia, para tratar a COVID-19, doença causada pelo SARS-CoV2. Essa alegação, no entanto, é enganosa, pois a autorização dada por este órgão se refere apenas a pesquisas com a hidroxicloroquina. O Ministério da Saúde, por sua vez, permitiu o uso da cloroquina, ou hidroxicloroquina, em casos graves, mas apenas em ambiente hospitalar.

“Enquanto a imprensa espalha a desgraça [o presidente Jair] Bolsonaro e [o ministro da Saúde Luiz Henrique] Mandetta trabalham pelo Brasil”, dizem as legendas das publicações, compartilhadas mais de 23 mil vezes no Facebook (1, 2, 3), além de replicadas no Instagram (1, 2) e no Twitter (1) desde o último dia 29 de março. As postagens contêm uma imagem que mistura uma foto do presidente Jair Bolsonaro, com a do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e o texto: “Liberação da cloroquina/hidroxicloroquina pela Anvisa, já com posologia para tratamento da COVID-19”.

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Captura de tela feita em 30 de março de 2020 de uma publicação no Facebook

Uma busca pelas palavras “cloroquina Anvisa” no Google levou a uma publicação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária de 27 de março deste ano cujo título é: “COVID-19: liberada pesquisa com hidroxicloroquina”.

No texto, a Anvisa explica que a pesquisa com hidroxicloroquina para o tratamento da COVID-19 foi liberada e esta licença permite ao Hospital Israelita Albert Einstein e colaboradores avançarem nos estudos em busca da cura da doença. Indica, ainda, que “a cloroquina existe há mais de 80 anos e foi desenvolvida como um medicamento antimalárico. Já a hidroxicloroquina existe desde 1955 e é semelhante à cloroquina, mas menos tóxica”.

Em e-mail ao AFP Checamos, a Anvisa negou, contudo, que houvesse uma liberação, ou indicação de dosagem, como afirmam as postagens viralizadas: “O que fizemos na última semana foi uma autorização para uma pesquisa que está sendo conduzida pelo Hospital Albert Einstein com o uso da hidroxicloroquina”.

A autorização emitida por essa agência governamental possibilita a realização do chamado ensaio clínico, que consiste em analisar os efeitos de medicamentos “em voluntários humanos” de acordo com o “método científico”. Ainda segundo a explicação, “os resultados obtidos nesses estudos determinam a autorização e a subsequente comercialização do medicamento ou de uma nova indicação”.

A Anvisa também publicou uma nota em 19 de março, com atualização em 30 de março, explicando que medicamentos que contêm hidroxicloroquina são registrados para o tratamento de artrite, lúpus eritematoso, doenças fotossensíveis e malária.

Além disso, indicou que os estudos sobre o uso dessas substâncias no tratamento da COVID-19, embora promissores, ainda não são conclusivos. Por isso, “não há recomendação da Anvisa, no momento, para a sua utilização em pacientes infectados, ou mesmo como forma de prevenção à contaminação, pelo novo coronavírus”.

Em contato por e-mail com a assessoria de imprensa do Ministério da Saúde, por sua vez, foi explicado que teve início na semana passada a distribuição aos estados de “3,4 milhões de unidades dos medicamentos cloroquina e hidroxicloroquina para uso em pacientes com formas graves da COVID-19.

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“O protocolo prevê cinco dias de tratamento e é indicado apenas para pacientes hospitalizados. A cloroquina e hidroxicloroquina irão complementar todos os outros suportes utilizados no tratamento do paciente no Brasil, como assistência ventilatória e medicações para os sintomas, como febre e mal-estar. Tanto a cloroquina e a hidroxicloroquina não são indicadas para prevenir a doença e nem tratar casos leves”, indicou o ministério.

Ainda por e-mail, a assessoria ratificou que o ministro Mandetta alertou às pessoas para que não busquem o medicamento por conta própria. “Quero fazer um pedido à população: não usem esse medicamento fora do ambiente hospitalar. Esse medicamento tem muitos efeitos colaterais que podem prejudicar a saúde”, assinalou.

Com o primeiro caso do novo coronavírus registrado no Brasil em 26 de fevereiro, cerca de 4.500 pessoas já foram infectadas com a COVID-19 pouco mais de um mês depois, e o número de mortes chegou a 159, com a maior parte delas registrada no estado de São Paulo, de acordo com os dados do Ministério da Saúde atualizados até 30 de março.

O número de pessoas infectadas no mundo ultrapassa 800 mil, em 184 países e territórios, com mais de 40 mil mortes.

Em resumo, é enganoso que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária tenha liberado a cloroquina, ou hidroxicloroquina, inclusive com a indicação de dosagem, para o tratamento da COVID-19, como afirmam as publicações viralizadas, pois a Anvisa deu permissão apenas para pesquisas. O Ministério da Saúde tem usado este medicamento para tratar casos graves, sendo que toda a administração da substância é feita em ambiente hospitalar.

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