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Não há registro de que a Ford tenha encerrado globalmente a produção de veículos de passageiros
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- Publicado em 22 de janeiro de 2021 às 17:59
- Atualizado em 26 de janeiro de 2021 às 18:39
- 5 minutos de leitura
- Por AFP Brasil
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“NÃO É NO BRASIL! A decisão da Ford, tomada há dois anos, foi parar de produzir carros de passageiros no MUNDO!!!! Eles NÃO ganham dinheiro com Ka, Fiesta, Focus, etc. Desistiram de competir com asiáticos e europeus. A Ford vai produzir apenas caminhonetes e o Mustang. NO MUNDO!!!”, afirma uma das publicações compartilhadas no Facebook (1, 2, 3), no Twitter e no Instagram logo após o anúncio feito pela empresa norte-americana de que encerraria sua produção no Brasil.
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Algumas das publicações são acompanhadas por uma captura de tela de uma notícia da NBC News, de 26 de abril de 2018, com o título “Ford encerrará toda produção de veículos de passageiros, exceto a do Mustang” (tradução do inglês). A matéria, entretanto, traz informações sobre a produção nos Estados Unidos, sem mencionar a produção global da companhia.
Decisão global?
No último dia 11 de janeiro, a Ford comunicou o fechamento de suas três fábricas no Brasil, em Camaçari (BA), Taubaté (SP) e Horizonte (CE). Em seu comunicado, a automotora anunciou “uma reestruturação de suas operações na região que permitirá ter um modelo de negócios ágil e sustentável no Brasil e América do Sul” e mencionou entraves para continuar atuando no país: “A pandemia global do Covid-19 ampliou os desafios do negócio, com persistente capacidade ociosa da indústria e redução das vendas na América do Sul, especialmente no Brasil”.
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(AFP / Rafael Martins)
No comunicado sobre o fechamento das fábricas, titulado “Ford Avança na Reestruturação da América do Sul”, não há qualquer menção sobre o encerramento da produção de veículos para passageiros na região ou no mundo.
O AFP Checamos contactou a Ford para obter mais detalhes sobre a saída da empresa do Brasil, mas a assessoria não se pronunciou.
Em uma busca no Google, também não é possível encontrar nenhum registro de a Ford tenha informado sobre o fim da fabricação de veículos de passageiros globalmente ou no Brasil. Nada nesse sentido foi encontrado no site da empresa.
Apesar de deixar de produzir carros no Brasil, a Ford anunciou um investimento de 580 milhões de dólares na Argentina a fim de ampliar a produção de veículos que serão, inclusive, vendidos ao Brasil. Em novembro do ano passado, o governo uruguaio anunciou o retorno da montadora ao Uruguai, com um investimento de 50 milhões.
No comunicado, a companhia diz que continuará atendendo a região com seu portfólio global de veículos e que planeja acelerar o lançamento de diversos novos modelos conectados e eletrificados.
A montadora mencionou quatro modelos no comunicado: “Reforçamos que além da confirmação da produção na nova geração da Ford Ranger, do lançamento da inédita família Bronco, da nova geração do Mustang Mach 1 e do utilitário Transit, a Ford planeja anunciar em breve novos modelos para o Brasil”.
Essa informação contraria, portanto, a alegação das publicações de que “a Ford vai produzir apenas caminhonetes e o Mustang”, já que desses, apenas a picape Ranger é uma ‘caminhonete’. O Bronco é um SUV e o Transit é um utilitário. Embora popularmente possam ser confundidos, os veículos SUV e os utilitários se diferenciam das caminhonetes sobretudo por terem a carroceria fechada.
Com o fechamento das fábricas no Brasil, saem de linha também os modelos Ka e Ecosport, que eram produzidos em Camaçari (BA). Os veículos sedãs continuam, contudo, sendo produzidos nas fábricas da Europa.
Após o comunicado feito pela Ford no Brasil, o Ministério da Economia lamentou em nota a decisão, ressaltando que ela “destoa da forte recuperação observada na maioria dos setores da indústria no país”. O presidente Jair Bolsonaro afirmou que a empresa deixou o país porque queria subsídios para sua permanência. A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) ressaltou que o setor não defende novos subsídios, e sim competitividade.
Europeus e asiáticos
As publicações também afirmam que a Ford estaria desistindo de competir com outros fabricantes de veículos europeus e asiáticos. Para o coordenador de Cursos Automotivos da Fundação Getúlio Vargas, Antônio Jorge Martins, ouvido pelo Comprova, do qual a AFP faz parte, isso não procede. “O que motivou e está motivando essa reestruturação mundial da Ford, não resta dúvida, é uma decisão estratégica no sentido de fazer com que a empresa comece não somente a produzir em todos os locais onde estará presente, mas ofertar produtos com maior conteúdo tecnológico”, avalia.
“Na medida em que o setor como um todo está exigindo investimento pesado, principalmente em termos de veículos autônomos e veículos elétricos, não há como todas as empresas caminharem em todas as direções. Isso fez com que a Ford escolhesse um nicho. A reestruturação ser motivada por uma decisão de deixar de competir com Ásia ou Europa, na minha opinião, não faz sentido”, acrescentou.
Em resumo, não se pode afirmar que a decisão da Ford em sair do Brasil faça parte de uma estratégia global da empresa deixar de produzir veículos de passageiros. Em comunicado, a empresa explicitou que fechará suas fábricas no país pela capacidade ociosa da indústria e pela queda de vendas no mercado brasileiro. Apesar de ter saído do Brasil, a Ford manterá sua produção nos países vizinhos Uruguai e Argentina.
Esse texto faz parte do Projeto Comprova. Participaram jornalistas da GZH, do Coletivo Negro Unipampa São Borja e do Diário do Nordeste. O material foi adaptado pelo AFP Checamos.
EDIT 26/01: acrescenta menção à parceria com o Projeto Comprova