
“PL da adultização” não confere a Lula o poder de banir redes sociais do Brasil
- Publicado em 27 de agosto de 2025 às 17:36
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- Por AFP Brasil
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“Urgente: Motta aprovou o regime de urgência para um projeto que autoriza Lula a derrubar redes sociais por completo, com o argumento de proteger crianças”, lê-se em um vídeo que circula no Facebook, no Instagram, no X, no TikTok e no Kwai.

O conteúdo é acompanhado de uma gravação da votação a respeito da urgência do PL 2628/2022, na qual o presidente da Câmara, o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) determinou que fosse feita uma votação simbólica. A velocidade com a qual a urgência da proposta foi aprovada, em 19 de agosto, gerou protestos da oposição, com o partido Novo pedindo o registro dos votos dos deputados em detrimento da votação simbólica — solicitação que não foi atendida por Motta.
Um dia depois, em 20 de agosto, o PL 2628/2022 foi aprovado pela Câmara e encaminhado ao Senado, para avaliação dos senadores.
Não é verdade, porém, que o texto aprovado pelos deputados confere a Lula ou ao Poder Executivo a prerrogativa de banir uma rede social por completo do país, como alegam as publicações.
A versão final do PL 2628/2022 aprovada na Câmara estabelece uma série de obrigações às redes sociais com relação aos usuários menores de idade, incluindo a disponibilização de ferramentas de controle parental, a aprimoração da verificação da idade dos usuários e a remoção imediata de conteúdos que violem os direitos da criança e dos adolescentes (mesmo sem ordem judicial).
No capítulo XV da proposta estão previstas as possíveis sanções a plataformas e outros provedores que não se adequarem às novas regras. Essas sanções são listadas gradativamente, começando com penalidades mais leves nos incisos I e II — como advertências e multas — e chegando até a uma suspensão das atividades e a um eventual banimento de operações em solo nacional nos incisos III e IV.
Em seguida, o texto define que as penalidades mais leves serão aplicadas por uma “autoridade administrativa autônoma” e que as decisões envolvendo a suspensão de atividades ou o banimento do Brasil serão tomadas pela Justiça:
Segundo o parágrafo 5: “As penalidades previstas nos incisos I e II do caput serão aplicadas pela autoridade administrativa autônoma de proteção dos direitos de crianças e de adolescentes no ambiente digital e as previstas nos incisos III e IV do caput deste artigo serão aplicadas pelo Poder Judiciário”.
“O PL 2628 prevê o banimento de uma rede social como uma das sanções possíveis, mas sua aplicação não é automática nem arbitrária. Essa medida extrema somente pode ser determinada pelo Poder Judiciário, mediante processo judicial que respeite integralmente o contraditório e a ampla defesa”, disse ao AFP Checamos o deputado Jadyel Alencar (Republicanos-PI), relator da matéria na Câmara.
O parlamentar classificou as alegações de que o PL permitiria uma censura das redes sociais como “completamente improcedentes”.
“Uma leitura atenta do texto como um todo permite observar que apenas conteúdos violadores serão retirados do ar independentemente de decisão judicial, havendo um procedimento estabelecido para identificar e coibir abusos, e um rol definido de legitimados a exercê-lo”, acrescentou.
Na visão de Alexander Coelho, sócio do Godke Advogados e especialista em Direito Digital e Cibersegurança, o projeto é passível de críticas com relação a uma possível instrumentalização do que foi proposto. “Um ponto sensível é a operacionalização: transferir às plataformas a tarefa de verificar também dados e remover conteúdo de forma imediata. Isso é temeroso e pode resultar em bloqueios arbitrários, remoções automáticas e isso vai influenciar em manifestações legítimas”, pontua.
Com relação à “autoridade administrativa autônoma” citada na proposta — a quem caberia decisões como advertências e aplicação de multas — Coelho explica que não há definição oficial a respeito de qual órgão exerceria esse papel:
“Se a gente for pensar em uma autoridade que tenha base para isso, eu chutaria aqui a ANPD [Autoridade Nacional de Produção de Dados]. Ela está sendo cotada também para ser uma espécie de órgão regulador para a inteligência artificial porque é um órgão estritamente técnico, e isso é fundamental”.
Questionado pelo AFP Checamos se enxerga algum indício de inconstitucionalidade no texto do PL 2628/2022, Coelho disse que não.
“Inconstitucionalidade, não. Mas sim [vejo indícios] de que isso possa interferir, infringir nessas garantias constitucionais. A gente não sabe como isso vai ser feito, quem vai fiscalizar. Se for a ANPD, eu acho que seria o mais acertado”, concluiu.
Referências
- Transmissão no YouTube da sessão de votação do PL 2628/2022
- Versão final do texto do PL 2628/2022 aprovado pela Câmara dos Deputados