
Reportagem do Jornal Nacional não “inocentou” Bolsonaro ao afirmar que GLO é constitucional
- Publicado em 23 de maio de 2025 às 19:14
- 4 minutos de leitura
- Por AFP Brasil
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“‘Golpe’ com a Constituição”, diz a legenda do vídeo publicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro no X e no Facebook, onde atingiu mais de 2 milhões de visualizações. A gravação exibe uma matéria do Jornal Nacional sobre os depoimentos que os envolvidos na suposta tentativa de golpe de Estado prestaram à Primeira Turma do STF no último dia 19 de maio.
Na sequência, um repórter da Globo diz: “O último a prestar depoimento foi o ex-comandante do Exército, general Marco Antônio Freire Gomes. Freire Gomes falou sobre a reunião no fim de 2022 em que Bolsonaro teria apresentado, segundo ele, um estudo sobre o GLO, estado de sítio e de defesa. Instrumentos que estão previstos na Constituição”.

O conteúdo também foi compartilhado pelo deputado federal Chrisóstomo de Moura (PL) e por outros usuários no Telegram, no Kwai, no Threads e no Instagram. O vídeo também foi encaminhado ao WhatsApp do AFP Checamos, para onde os usuários podem enviar mensagens vistas em redes sociais, caso duvidem de sua veracidade.
Conteúdo editado
Jair Bolsonaro e outras 30 pessoas são réus no STF por tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado democrático de direito, organização criminosa, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
O trecho da matéria do Jornal Nacional cita a apresentação que Bolsonaro teria feito ao então comandante do Exército Marco Antônio Freire Gomes de uma minuta com instrumentos jurídicos que serviriam para contestar o resultado das eleições de 2022. Segundo as investigações, a intenção era decretar estado de sítio e de defesa e a Operação de Garantia da Lei e da Ordem.
Por meio de uma busca pelos termos “Jornal Nacional”, “STF” e “depoimentos”, o Checamos localizou a matéria original, publicada em 19 de maio de 2025. Na gravação, o repórter complementa que, apesar de os mecanismos estarem previstos na Constituição, eles não respaldam uma ruptura institucional.
O que diz a Constituição
As operações de GLO são reguladas pelo artigo 142 da Constituição, pela Lei Complementar 97, de 1999, e pelo Decreto 3.897, de 2001. Elas são acionadas em casos de esgotamento das forças tradicionais de segurança pública e concedem temporariamente poder de polícia aos militares. A última vez que a GLO foi acionada foi em novembro de 2024, quando o presidente Lula decretou o emprego da medida no Rio de Janeiro durante a realização da cúpula do G20.
Ao AFP Checamos, o professor de direito constitucional e administrativo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Daniel Capecchi explicou que a medida “constitui uma intervenção pontual para resolver um problema concreto, e não um mandato para que as Forças Armadas interfiram na política”.
O estado de defesa, por sua vez, está previsto no artigo 136 da Constituição e é acionado para preservar ou restabelecer a “ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza”.
Em casos de “comoção de grave repercussão nacional” ou ineficácia do estado de defesa, o estado de sítio pode ser decretado, conforme estabelece o artigo 137 da Constituição.
Ambos os instrumentos podem limitar alguns direitos como o sigilo de correspondência, de comunicação e o direito de reunião.
Capecchi ressalta que essas medidas precisam passar pela avaliação do Congresso Nacional e têm restrições em relação ao período de execução: o estado de defesa pode ser decretado por 30 dias e renovado apenas uma vez, e o de sítio pode ser prorrogado indefinidamente, mas sempre por períodos sucessivos de 30 dias.
“Nenhum desses institutos pode ser utilizado para violar a ordem democrática. Sua função é justamente a contrária: garantir que a ordem constitucional seja protegida. A tentativa de deturpá-los representa uma forma abusiva de corromper o texto constitucional”, reitera.
Outros acontecimentos
Além da minuta citada, apresentada a Freire Gomes, a denúncia contra Bolsonaro e seus aliados envolve outros acontecimentos ocorridos entre 2021 e o início de 2023.
Entre eles estão ataques à legitimidade do sistema eleitoral, operações da Polícia Rodoviária Federal que teriam tentado impedir eleitores de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de votar no segundo turno de 2022 e um plano de assassinato de Lula, Geraldo Alckmin (PSB) e do ministro Alexandre de Moraes.
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