
Eduardo Bolsonaro pediu licença temporariamente da Câmara dos Deputados, e não renunciou
- Publicado em 21 de março de 2025 às 21:04
- 4 minutos de leitura
- Por AFP Brasil
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“Eduardo Bolsonaro renuncia ao cargo de deputado federal”, dizem publicações que compartilham um vídeo no Facebook, no Instagram, no X, no Threads e no TikTok.
Na gravação publicada em suas redes sociais, o deputado anunciou que irá se licenciar temporariamente do cargo e permanecerá nos Estados Unidos para “focar em buscar as justas punições que Alexandre de Moraes e a sua ‘gestapo’ da Polícia Federal merecem”.

O anúncio da licença do parlamentar e filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) veio após integrantes do Partido dos Trabalhadores (PT) protocolarem uma notícia-crime no Supremo Tribunal Federal (STF) que pedia a apreensão de seu passaporte, sob a justificativa de que o deputado teria atuado contra “a ordem pública e a soberania nacional” em viagens aos Estados Unidos.
O parlamentar — um dos principais defensores da anistia aos presos pelo ataque às sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023 — viajou quatro vezes aos Estados Unidos em 2025 para defender seu pai, denunciado por tentativa de golpe de Estado, e para articular sanções, com aliados políticos, ao ministro do STF Alexandre de Moraes.
Após o anúncio da licença, a Procuradoria-Geral da República negou abrir uma investigação sobre a notícia-crime, que foi arquivada pelo STF.
Contudo, por mais que o deputado tenha declarado à CNN Brasil que considera abdicar totalmente de seu mandato, o anúncio feito em março de 2025 não é uma renúncia, como alegam as publicações.
Licença de mandato é temporária, enquanto renúncia é definitiva
Segundo o artigo 235 do regimento interno da Câmara dos Deputados — documento que rege o funcionamento da casa legislativa —, parlamentares podem solicitar licença de seu mandato para cumprir missão de caráter diplomático ou cultural, tratamento de saúde ou para tratar de interesse particular. Também são previstas licenças-maternidade e paternidade.
“Licenciar-se do cargo de deputado significa se afastar temporariamente das funções inerentes aos deputados, como votar, discursar e participar das atividades parlamentares. Por outro lado, quando licenciado, o deputado não fica sujeito a sanções como perda de mandato por faltas às sessões, por exemplo”, explica Antonio Carlos de Freitas Junior, doutor em Direito Constitucional pela Universidade de São Paulo (USP) e professor na Fundação Santo André.
A licença de interesse particular, como é o caso de Eduardo Bolsonaro, não é remunerada e tem prazo determinado: não pode ultrapassar 120 dias por sessão legislativa, que é o ano de trabalho da Câmara, explica Freitas Junior.
O afastamento dentro desse prazo não acarreta em perda de mandato, segundo o artigo 56, inciso II, da Constituição Federal. Freitas Junior, no entanto, reitera que “não há previsão regimental” para a prorrogação desse período.
“Sendo assim, qualquer autorização diferente deste dispositivo faria com que o deputado perdesse o mandato”, afirmou, explicando que, caso o afastamento ultrapasse os 120 dias, o suplente é convocado a ocupar a vaga, o gabinete do deputado é desfeito e os assessores são exonerados.
Para o professor, as “licenças não podem ser interpretadas como renúncias de forma alguma”, uma vez que a renúncia significa “abdicar ao cargo (...) sem possibilidade de volta”.
Formalização na Câmara
A forma como a licença e a renúncia são formalizadas na Câmara também se diferem.
O regimento da Casa determina que a licença deve ser apresentada em requerimento fundamentado ao presidente, que é quem concede o afastamento, e lida na primeira sessão após o seu recebimento.
Eduardo Bolsonaro formalizou o seu pedido de licença em 20 de março de 2025, dois dias após o seu anúncio, segundo informado pela assessoria da Câmara dos Deputados à AFP por e-mail, em 21 de março de 2025.
Ainda de acordo com a nota, o parlamentar apresentou uma licença de saúde de dois dias e a licença de interesse particular de 120 dias, totalizando 122 dias de afastamento.
Como determinado pelo regimento e pela Constituição, um suplente será convocado para ocupar a vaga durante seu afastamento. A renúncia, por sua vez, não depende de aprovação da Casa, como consta no artigo 239 do regimento interno.
Prevista no capítulo III, ela se torna “efetiva e irretratável”, ou seja, definitiva, após a apresentação do seu pedido à Mesa e a publicação no Diário da Câmara ou lida no expediente.
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