Frase minimizando vítimas da covid-19 não foi escrita por Fernanda Torres
- Publicado em 9 de janeiro de 2025 às 18:45
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- Por AFP Brasil
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“Dane-se o povo e os cadáveres, se o vírus cumprir ‘sua missão’ de ‘abreviar’ o governo, tudo está bem”, diz a frase atribuída à Torres em uma imagem que circula junto a sua fotografia no Facebook, no Instagram, no Threads, no X, no Kwai, no TikTok e no Telegram.
O conteúdo circula desde 2020, mas voltou a ser compartilhado após Torres ganhar o Globo de Ouro de “Melhor Atriz de Drama”, em 5 de janeiro, por sua performance no filme “Ainda Estou Aqui”. Dirigido por Walter Salles, o longa conta a história de Eunice Paiva, que lida com o desaparecimento de seu marido, o deputado Rubens Paiva, após ter sido levado para interrogatório por agentes da ditadura militar brasileira na década de 1970.
Uma pesquisa pelas palavras-chave “fernanda torres dane se o povo cadáveres” na ferramenta Biblioteca de Conteúdo da Meta identificou que o conteúdo mais antigo publicado no Facebook a respeito da suposta fala da atriz data de 27 de março de 2020.
Nessa publicação, é reproduzido um trecho de um texto atribuído a “José Linhares Jr” e que contém a frase supostamente dita pela atriz.
Uma busca por “José Linhares Jr” no Google levou a um site de um jornalista com o nome citado. Uma pesquisa nesse blog por “Fernanda Torres” levou a um artigo de 27 de março de 2020 intitulado: “Atriz da Globo diz ‘torcer’ pelo coronavírus em artigo”.
No texto, Linhares Jr reproduz integralmente um artigo escrito por Fernanda Torres para o jornal Folha de S.Paulo em 22 de março daquele ano, chamado “Ninguém sairá o mesmo desta quarentena”. Antes da reprodução na íntegra do artigo, porém, Linhares Junior opina sobre o texto da atriz, afirmando:
“Abaixo seguem trechos do artigo transloucado da atriz que, em minha opinião, é uma espécie de louvação ao vírus que aterroriza o povo. Dane-se o povo e os cadáveres, se o vírus cumprir ‘sua missão’ de ‘abreviar’ o governo, tudo está bem.”
Já o artigo de Torres em questão não contém, em nenhum momento, a frase “dane-se o povo e os cadáveres”, atribuída a ela nas publicações virais. Ao longo da peça, a atriz tece críticas a comportamentos potencialmente perigosos para a saúde da população naquele momento, como os adotados pelo bispo Edir Macedo e pelo então presidente Jair Bolsonaro.
Já o termo “abreviar”, também usado nas publicações virais, foi usado no seguinte trecho pela artista:
“Torço para que o centro ressurja dessa emergência. E que o coronavírus, a exemplo da peste negra na Europa do século 14, venha abreviar o obscurantismo medieval travestido de liberal em que nos metemos.”
Em 5 de abril de 2020, Torres escreveu um novo artigo para a Folha de S.Paulo, no qual comenta algumas das críticas feitas a seu texto anterior:
“Na semana passada, somada à expectativa indigesta do que virá, tive a infelicidade de ver um artigo que escrevi aqui, neste espaço, virar alvo das redes insociáveis”, escreveu a artista. “Era um texto sobre a peste negra, que terminava falando das transformações ocorridas na Europa trecentista, depois de passada a tragédia. Em nenhum momento tratei a calamidade como algo benquisto”.
Nesse segundo artigo, Torres também comentou algumas das publicações que circularam à época, dizendo: “Os ‘fake posts’ afirmavam que eu torcia para que o vírus matasse multidões”.
Este conteúdo também foi verificado por Aos Fatos, Uol Confere, Reuters e Estadão Verifica.
Referências
- Artigo publicado por José Linhares Junior
- Artigos publicados por Fernanda Torres na Folha de S.Paulo (1, 2)