Haddad defende taxar grandes heranças, mas Tebet não sugeriu alíquota de 30%

  • Publicado em 25 de março de 2024 às 17:29
  • 4 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet (MDB), não sugeriu 30% de imposto sobre herança, ao contrário do que alegam publicações com mais de 4,6 milhões de visualizações nas redes sociais. A alegação, que já havia circulado em fevereiro de 2024, voltou a ser difundida em março com um vídeo do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), defendendo um aumento nessa tributação. Na verdade, Tebet disse em um debate em 2020 que, naquele momento, seria difícil a aprovação de uma proposta desse tipo. Já Haddad defendeu o aumento da taxação de grandes heranças.

A ministra do Planejamento já sugeriu 30% de imposto para os herdeiros. Numa fazenda de 1.000 hectares, 300 iriam para a turma do MST. O mesmo aconteceria nas cidades, com casas e apartamentos para o MTST”, diz a legenda de um vídeo publicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em suas redes sociais (1, 2, 3).

Na gravação, Fernando Haddad diz: “O imposto sobre herança no Brasil, ridiculamente baixo. O imposto sobre herança, ele precisa aumentar, ele precisa aumentar no mundo inteiro. Não é bom nem pro herdeiro. O cara que não sabe o que é a vida. O cara que herda um bilhão não vai saber o que é a vida”.

O conteúdo também foi compartilhado por outros usuários no Telegram, no TikTok, no Instagram e no Facebook.

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Captura de tela feita em 21 de março de 2024 de uma publicação no Facebook (.)

Tebet e o imposto sobre herança

A alegação de que a ministra do Planejamento, Simone Tebet, defendeu uma alíquota de 30% no imposto sobre herança foi verificada anteriormente pelo AFP Checamos.

As publicações distorciam um trecho da participação da então senadora em um debate sobre o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), tributo que incide sobre a transferência de bens em caso de falecimento ou doações, promovido pelo Congresso em Foco em junho de 2020. O evento discutiu o imposto sobre a herança no Brasil e os desafios para o avanço de uma reforma tributária. 

Países como Irlanda, França, Reino Unido, Alemanha, EUA e Japão tem alíquotas entre 30 e 55% sobre herança e doação, fazendo com que os mais ricos, que têm maior capacidade de contribuir, paguem, proporcionalmente, mais impostos que os mais pobres. O que falta para o Brasil implantar o mesmo?”, diz a descrição da transmissão.

Na ocasião, Tebet foi indagada sobre quais eram as chances de que projetos relacionados a um aumento do imposto sobre herança avançassem no Congresso.

No caso do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação, seria uma majoração de alíquota que hoje é até 8% como máxima, chegando na proposta, obviamente, que está sendo apresentada aqui — não vou entrar no mérito se acho muito, ou pouco — de até 30%. Então, sairíamos de 8% para 30% como alíquota (...) Se você me perguntar qual é a chance hoje de se aprovar isoladamente esse imposto, eu diria que quase zero”, respondeu.

A partir de 40 minutos e 36 segundos da transmissão, a então senadora defendeu, ainda, que a base de cálculo do ITCMD tem que se adequar à realidade de cada estado.

Em estados como o meu, onde as grandes fortunas se dão por propriedades rurais (...), quando você aumenta demais essa alíquota, você tem o efeito contrário. Você tem uma concentração de renda muito grande e uma concentração de propriedade daquele que herdou e não tem mais nada. Se você vai tributar de 25 a 30 por cento e vai fazer com que aqueles herdeiros tenham que vender um terço da sua propriedade para poder pagar o imposto”.

Ele [o herdeiro] vai vender pra quem? Para aqueles que já são latifundiários, para aqueles grandes ou médios que vão estar aumentando a sua renda e a sua propriedade”, completa.

Portanto, Tebet não chegou a defender a proposta de aumentar a alíquota do ITCMD para 30%.

O AFP Checamos também não localizou nenhuma declaração dada pela ministra à imprensa defendendo a alíquota de 30%.

Fala de Haddad

Por meio de uma pesquisa pelas palavras-chave “Haddad”, “herança” e “podcast”, o Checamos localizou o vídeo compartilhado nas publicações.

Em entrevista dada ao podcast Inteligência Ltda. em julho de 2022, Haddad defendeu o aumento da taxação de heranças de grandes fortunas. “Eu não estou falando de herança do cara ter dois apartamentos e deixar um pra cada filho. Não é disso que eu estou falando. Eu estou falando de fortunas de 500 milhões, 1 bilhão, 2 bilhões.”

Durante a conversa, Haddad não chega a propor uma alíquota.

Reforma tributária mantém alíquota máxima de 8%

O artigo 155 da Constituição Federal define que as alíquotas máximas do ITCMD são fixadas pelo Senado Federal. A Resolução nº 9/1992, por sua vez, fixa esse limite em 8%.

Essa cobrança é prevista no Código Tributário Nacional e tem como finalidade a arrecadação de recursos financeiros para a utilização pelos estados. Dessa forma, cada estado tem autonomia para definir a alíquota do imposto, respeitando o limite de 8%.

Em dezembro de 2023, o Congresso promulgou a primeira reforma do sistema tributário no regime democrático, pauta defendida desde o início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O texto aprovado também não alterou a alíquota máxima de 8% no ITCMD. A reforma apenas definiu que o imposto será cobrado no local de domicílio do falecido ou do doador e que não será recolhido “sobre as transmissões e as doações para as instituições sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social”.

Referências

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