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Vídeo é tirado de contexto para sugerir que Barroso quer "confiscar" investimentos da classe média
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- Publicado em 11 de maio de 2023 às 22:09
- 4 minutos de leitura
- Por AFP Brasil
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“Uma ‘Expropriação’ no atacado está sendo gestada no STF. Significa que todos investimentos, privatizações, contratos na Bolsa e investimentos agora pode sofrer CONFISCO mas é pelo social”, diz uma das publicações compartilhadas no Facebook e no Kwai junto a um vídeo em que Barroso defende sua posição em uma votação do STF.
Recorrendo à mesma gravação, outros usuários alegam que o STF pretende criar uma lei para colocar “a taxa de juros abaixo da poupança”.
O conteúdo também foi encaminhado ao WhatsApp do AFP Checamos, para onde os usuários podem enviar temas vistos em redes sociais, se duvidarem de sua veracidade.
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No entanto, nenhuma das duas alegações compartilhadas pelas publicações virais podem ser depreendidas da fala do magistrado.
Uma busca no Google pelos termos “Barroso”, “investimentos” e “classe média” levou a uma matéria sobre o voto do ministro no julgamento, realizado em 20 de abril de 2023, de uma ação requerida pelo partido Solidariedade que questiona o uso da taxa referencial (a taxa de juros aplicada a algumas modalidades de investimentos, como a caderneta de poupança) para o reajuste dos depósitos do FGTS.
Segundo o texto, o ministro ressaltou que a remuneração por depósitos no FGTS está muito abaixo de outras oferecidas pelo mercado e rende menos até do que a caderneta de poupança.
Uma pesquisa pela data do julgamento e pelos termos “FGTS” e “STF” levou à transmissão da sessão da Suprema Corte, na qual é possível conferir o voto de Barroso na íntegra.
Ao contrário do que sugerem as publicações virais, o magistrado refutou a justificativa apresentada pela União e pelo Banco Central do Brasil (Bacen) de que o rendimento do FGTS é baixo porque os recursos do fundo são usados para financiar projetos de interesse público.
Aos 23 minutos e 49 segundos, Barroso diz: “É essa a pergunta que temos que fazer: se consideramos legítimo que a poupança dos trabalhadores [o FGTS] seja remunerada de maneira desfavorável em relação à menor rentabilidade do mercado, que é a da caderneta de poupança, para financiar projetos de interesse público”.
Mais adiante, aos 25 minutos e 3 segundos da sessão, Barroso prossegue com a fala viralizada fora de contexto, comparando o argumento trazido pela União e pelo Bacen ao debate com a hipótese meramente ilustrativa de a classe média também receber rendimentos menores em suas aplicações para que se investisse em políticas públicas:
“Aqui, eu pediria, presidente, às pessoas de classe média alta, uma gota de empatia, que não é difícil nesse caso. Imagine a alta classe média brasileira, que investe em renda fixa, em fundos de ações, em fundos de multimercado e em câmbio, e tem lá os seus investimentos, se de repente viesse uma regra que dissesse assim: ‘todas essas suas aplicações terão uma rentabilidade pré-determinada, abaixo da poupança, porque o país está precisando fazer investimentos sociais importantes’. O que aconteceria se hoje se editasse esta norma dizendo isso? O mundo ia cair. ‘Confisco, violação ao direito de propriedade, coletivismo’, daí para baixo”.
Barroso continua, deixando clara a comparação:
“Pois é exatamente isso que está acontecendo aqui, é exatamente isso que se faz aqui. Uma aplicação financeira compulsória muito semelhante à poupança em que os cotistas são forçados a aceitar uma remuneração extremamente baixa e inferior a qualquer outra aplicação de mercado sem ter liquidez. Porque a poupança, o titular da poupança pode tirar o dinheiro lá e colocar em ações, se ele quiser, colocar em câmbio, mas o titular do FGTS não pode”.
Em nenhum momento da sessão Barroso defendeu qualquer tipo de confisco ou que outros tipos de investimento sejam remunerados a uma taxa abaixo da praticada com as cadernetas de poupança.
As publicações virais foram desmentidas pelo STF.
O conteúdo também foi verificado pelo Projeto Comprova, pela Reuters e pelo Boatos.org.