Decreto de Participação Social é falsamente relacionado ao fim da propriedade privada

  • Este artigo tem mais de um ano
  • Publicado em 10 de fevereiro de 2023 às 20:51
  • 3 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
O decreto que instituiu o Sistema de Participação Social em janeiro de 2023 não tem relação com o fim da propriedade privada, ao contrário do que afirmam usuários em publicações compartilhadas centenas de vezes desde o último dia 6 de fevereiro nas redes sociais. Na verdade, ele visa aumentar a atuação da sociedade civil nas políticas públicas, o que é garantido pela Constituição. Além disso, seria ilegal e inconstitucional acabar com o direito de propriedade no país.

"Saiu no diário oficial hoje que o governo vai decidir quem eh o dono da propiedade do que vc tem. Chama de decreto de ‘participação social’ Isto foi um decreto assinado hoje. Foi assim que começou na Venezuela. Começaram com a censura e depois o confisco de propriedades”, diz uma mensagem que circula no Facebook, Instagram, LinkedIn, Telegram e Twitter.

Muitas das publicações são acompanhadas por uma captura de tela do Decreto nº 11.407, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 31 de janeiro de 2023, instituindo o Sistema de Participação Social em órgãos do governo federal.

Image
Captura de tela feita em 9 de fevereiro de 2023 de uma publicação no Twitter ( .)

A alegação também foi encaminhada para o WhatsApp do AFP Checamos, para onde usuários podem enviar conteúdos vistos nas redes sociais.

No entanto, o decreto não faz qualquer menção ao direito de propriedade.

O que diz o decreto?

Com cinco artigos, o decreto citado nas publicações virais institui o “Sistema de Participação Social” na administração pública federal.

Segundo o texto, isso tem como objetivo “estruturar, coordenar e articular as relações do Governo federal com os diferentes segmentos da sociedade civil na aplicação das políticas públicas”.

Nada é dito sobre o suposto fim da propriedade privada.

O decreto “não acaba com a propriedade privada nem minimamente”, confirmou ao Checamos o professor de direito constitucional na Faculdade Getúlio Vargas (FGV), Dimitri Dimoulis.

Além disso, o direito de propriedade é garantido pela Constituição Federal e pelo Código Civil. Deste modo, segundo Dimoulis, não seria possível acabar com esse direito através de um decreto.

Também em 31 de janeiro de 2023, Lula assinou um segundo decreto que instituiu o Conselho de Participação Social. O texto detalha que o órgão irá ajudar o presidente da República “no diálogo com organizações da sociedade civil”. Da mesma maneira, não há menção ao suposto fim da propriedade privada.

O conselho será composto por representantes de movimentos e entidades sociais e se reunirá a cada três meses. Já o sistema será interministerial, sendo que cada ministério terá uma assessoria responsável por sua área.

A participação, ou controle social, é garantida de diversas formas pela Constituição e o país já teve diferentes órgãos atuando nesse sentido.

O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), por exemplo, foi criado em 1993 e era composto por representantes da sociedade. O órgão foi extinto em 2019, durante a gestão de Jair Bolsonaro, e reinstalado pelo atual governo.

Expropriações na Venezuela

As publicações mencionam a Venezuela para defender a alegação de que os novos decretos ferem o direito à propriedade privada.

Em 2006, no governo de Hugo Chavéz, foram criados os Conselhos Comunais com o objetivo de aumentar a participação da população na política. Mas esses conselhos não têm relação com desapropriações de terras.

As expropriações acontecem no país desde o ano 2000 e foram facilitadas por leis como a de Segurança e Soberania Agroalimentar e a de Defesa das Pessoas no Acesso a Bens e Serviços.

Há alguma informação que você gostaria que o serviço de checagem da AFP no Brasil verificasse?

Entre em contato conosco