STF não decidiu que furto de celular não é mais crime; decisão pontual é distorcida nas redes

  • Este artigo tem mais de um ano
  • Publicado em 27 de janeiro de 2023 às 22:44
  • 3 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
Não é verdade que o Supremo Tribunal Federal (STF) tenha decidido que o furto de celulares deixará de ser crime no Brasil. Postagens compartilhadas milhares de vezes nas redes sociais desde o último dia 14 de janeiro repercutem essa alegação com base em uma matéria jornalística. Contudo, a reportagem não é atual: ela foi veiculada em maio de 2017 e tratava sobre um caso específico julgado pelo STF. O ato de furtar continua configurando crime no Brasil, de acordo com o Código Penal.

“Furtar o seu celular, não será mais crime. É Fazuéli que se diz?”, afirma uma das publicações compartilhadas no Facebook, no Instagram, no Twitter, no Kwai e no TikTok.

Image
Captura de tela feita em 26 de janeiro de 2023 de uma publicação no Facebook ( .)

Ao longo de mais de três minutos de reportagem, apresentadores e repórteres afirmam que “furtar aparelho de telefone celular pode deixar de ser crime” em razão de uma decisão do Supremo Tribunal Federal.

Eles explicam que, segundo a determinação da Suprema Corte, “o furto de um aparelho de menos de R$ 500,00 encaixa-se no princípio de insignificância”, que se aplica quando “o crime cometido é tão desprezível que não vale a pena acionar o direito penal”.

Os vídeos contêm um texto sobreposto à gravação que associa a decisão do STF com a vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições de 2022: “Faz o L. Furtar celular não será mais crime” e “Quando isso acontecer com você faz o L”, em referência ao símbolo usado por apoiadores do petista.

No entanto, uma busca reversa por capturas de tela da sequência usando a ferramenta InVid-WeVerify* levou à reportagem compartilhada nas redes sociais do programa “Balanço Geral”, transmitido pela TV Record, em 26 de julho de 2017, cinco anos antes de Lula voltar à Presidência.

Além disso, o furto não deixou de ser crime no Brasil e está previsto no artigo 155 do Código Penal, sendo classificado como “furto”, “furto qualificado” ou “furto de coisa comum”.

Caso específico

A reportagem compartilhada nas publicações virais citava um caso específico, ocorrido em 2017, quando um homem furtou um aparelho celular no valor de R$ 90,00. Em 16 de maio daquele ano, o STF concedeu o habeas corpus ao infrator, ou seja, ele não foi punido pelo ato.

Em entrevista ao AFP Checamos em 25 de janeiro, o advogado criminalista João Arantes afirmou que como a decisão sobre o caso foi no “âmbito de um Habeas Corpus, ela só se aplica ao caso individual que estava sendo julgado”. Sendo assim, o parecer dos magistrados de que o furto do celular não resultaria em prisão só se aplicou ao caso em julgamento.

Arantes relembra que a pena para furto é de “1 a 4 anos de reclusão e multa” e se o crime for cometido em determinadas circunstâncias, a pena pode ser ainda maior.

Princípio da insignificância

Ao decidirem sobre o caso do furto do aparelho celular de R$ 90,00, os ministros apelaram para o “princípio da insignificância”, que é quando ações são consideradas penalmente insignificantes.

Arantes complementa que, na maior parte dos países democráticos, existe o entendimento de que é desproporcional “responsabilizar alguém criminalmente quando a lesão ou ofensa que teria sido praticada não atinge um nível mínimo de gravidade”.

“Nos crimes contra o patrimônio, como é o caso do furto, essa falta do mínimo de gravidade necessário se traduz principalmente na exigência de que a ação tenha sido praticada sem a utilização de violência física ou grave ameaça contra a vítima, bem como no valor reduzido do bem furtado – no caso noticiado, por exemplo, o valor do aparelho celular furtado era de R$ 90,00”, finaliza.

Procurado pelo AFP Checamos, o Supremo Tribunal Federal reiterou que a decisão foi tomada em maio de 2017 em um julgamento específico de roubo de celular: “Diante do valor do bem envolvido (R$ 90,00), a 2ª Turma do STF considerou possível, nesse caso específico, aplicar o princípio da insignificância, e determinou o encerramento da ação penal especificamente dessa pessoa, considerando as peculiaridades do caso”.

Há alguma informação que você gostaria que o serviço de checagem da AFP no Brasil verificasse?

Entre em contato conosco