Esta bandeira de cabelo foi hasteada na Martinica, anos antes da morte de Mahsa Amini no Irã

A bandeira feita de cabelo vista em uma fotografia, que tremula em um céu com nuvens, é parte de uma obra de 2014 da artista belga Edith Dekyndt. Não foi criada, portanto, como símbolo dos protestos surgidos no Irã após a morte de Mahsa Amini, como sugerem publicações compartilhadas mais de 1000 vezes nas redes sociais desde 25 de setembro de 2022. Dekyndt explicou em uma entrevista em 2020 que seu trabalho representa o passado colonial da ilha francesa da Martinica, no Caribe.

“Mulheres do Iran fazem bandeira dos seus cabelos. Viva as mulheres do Iran!”, diz uma das publicações que circula com a foto no Facebook e Twitter.

Conteúdo similar também foi difundido em hindu, inglês, turco, espanhol e catalão.

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Captura de tela feita em 18 de outubro de 2022 de uma publicação no Facebook ( .)

As publicações começaram a circular após os protestos no Irã pela morte, em 16 de setembro de 2022, de Mahsa Amini, uma curda iraniana de 22 anos, após ser detida pela polícia da moral por descumprir o código de vestimenta para mulheres iranianas.

A morte gerou uma onda de manifestações contra o governo da República Islâmica, nos quais as mulheres queimaram seus véus e cortaram os cabelos. O movimento se estendeu ao Curdistão iraniano, região natal de Amini, e também alcançou escolas, universidades e inclusive refinarias de petróleo. Os protestos representam um dos maiores desafios que as autoridades do país enfrentam desde a Revolução Islâmica de 1979.

Um mês depois do falecimento da jovem, mais de 120 pessoas foram mortas na repressão aos protestos, segundo a ONG Iran Human Rights (IHR).

Uma bandeira em homenagem às mobilizações?

Uma busca reversa da imagem da bandeira no Google mostrou que é um fragmento de um vídeo da artista visual belga Edith Dekyndt intitulado em francês “Ombre indigène” (Sombra indígena, em português) em 2014.

A imagem apareceu em uma entrevista em junho de 2020 com a legenda: “Edith Dekyndt, Ombre indigène, vídeo, 2014”.

Uma foto similar foi publicada no site do centro de arte contemporânea Wiels de Bruxelas, em virtude de uma exposição de Dekyndt em 2016.

Na página 31 do catálogo da exposição, aparece a descrição da obra: “Uma bandeira feita de cabelo foi cravada no solo e filmada sobre rochas na costa de Diamant, Martinica. Ali, precisamente, na noite de 8 de abril de 1830, um barco clandestino de escravos que transportava cem cativos africanos foi arrastado até as rochas antes de ser completamente destruído”.

A ilha caribenha da Martinica é uma região ultramarina da França e, historicamente, um porto de escala para barcos de escravos.

Na entrevista de 2020, Dekyndt disse que se inspirou no trabalho do autor e filósofo Edouard Glissant, um dos escritores mais importantes do Caribe francês e cujos textos refletem sobre o colonialismo, a escravidão, o racismo e a diversidade cultural.

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Captura de tela feita em 17 de outubro de 2022 do catálogo da exposição de Edith Dekyndt de 2016 ( .)

A videoinstalação de Dekyndt pode ser vista nesta sequência de sua exposição de 2016 em Wiels, disponível no site da artista.

Magali Wyns, porta-voz da galeria Greta Meert, um espaço de arte em Bruxelas que representa Dekyndt, confirmou que a peça não tem relação com os protestos no Irã pela morte de Mahsa Amini.

“A obra intitulada ‘Ombre Indigène Part 2 (Île de la Martinique)’ é uma videoinstalação, não uma imagem, criada em 2014 por Edith Dekyndt”, disse Wyns à AFP por e-mail.

A AFP já verificou conteúdo relacionado com as manifestações no Irã em 2022.

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