O ex-deputado Jean Wyllys não foi intimado a depor no caso da facada contra Jair Bolsonaro

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  • Publicado em 7 de janeiro de 2022 às 20:21
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  • Por AFP Brasil
Publicações compartilhadas mais de 7.500 vezes desde novembro de 2021 asseguram que o ex-deputado federal Jean Wyllys foi intimado a depor no caso do atentado sofrido em Minas Gerais por Jair Bolsonaro, hoje presidente, em setembro de 2018. Segundo as mensagens, Wyllys teria desaparecido logo após receber a intimação. Isso é falso. À AFP, o Ministério Público Federal de Minas Gerais e o advogado do ex-deputado informaram não ter convocado o ex-deputado para prestar depoimento. A equipe de checagem da AFP tampouco encontrou menção à suposta intimação em documentos públicos sobre o caso. 

“Intimado para depor sobre o caso Adélio, Jean Wyllys desaparece”, começa o texto sobreposto a uma foto do ex-deputado pelo PSOL, hoje filiado ao PT, que foi amplamente compartilhada no Facebook (1, 2, 3). 

“Desaparecido, desde o dia 02 de novembro esta pessoa não é mais encontrada no endereço de Barcelona, na Espanha… Quem tiver informações ligue para a Interpol…”, continua a mensagem viralizada. Conteúdo semelhante também circula no Twitter

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Captura de tela feita em 4 de janeiro de 2022 de uma publicação no Facebook

As publicações fazem referência ao atentado sofrido pelo então candidato à Presidência Jair Bolsonaro em 6 de setembro de 2018, em Juiz de Fora (MG). Nesta data, Bolsonaro foi esfaqueado por Adélio Bispo enquanto participava de um evento de campanha. 

Adélio foi detido no mesmo dia e submetido a dois inquéritos policiais conduzidos pela Polícia Federal de Minas Gerais. A equipe de checagem da AFP consultou documentos públicos sobre esses dois inquéritos e não encontrou qualquer intimação envolvendo Jean Wyllys. 

“Nenhuma intimação”

Realizado nos 30 dias após a facada, o primeiro inquérito concluiu que o agressor agiu sozinho descartando, a partir das evidências colhidas, o envolvimento de terceiros no ataque. 

Um relatório do juiz federal Bruno Savino, da 3ª Vara Federal de Juiz de Fora - que julgou a ação penal referente ao atentado - resume as diligências realizadas nessa investigação. No documento, não é mencionado que o ex-deputado tenha sido intimado a depor. 

Ao fim dessa investigação, a polícia determinou a abertura de um segundo inquérito para avaliar mais detalhadamente a existência de mandantes, idealizadores, instigadores, ou financiadores do crime.

O jornal O Estado de S. Paulo divulgou um relatório parcial desta segunda investigação em maio de 2020. Na página 55 são detalhados os depoimentos e entrevistas realizadas com “contatos, colegas de trabalho, familiares e demais conhecidos” de Adélio Bispo. Entre diversas pessoas listadas, não consta o nome do ex-deputado. 

Esse inquérito foi arquivado temporariamente em junho de 2020 a pedido do Ministério Público Federal (MPF), que considerou que as investigações realizadas até o momento indicavam que Adélio não teve cúmplices. 

O juiz responsável pelo caso determinou, no entanto, que o inquérito poderia ser reaberto se algumas diligências pendentes fossem autorizadas, como a quebra de sigilo dos advogados que se apresentaram para fazer a defesa de Adélio. Isso aconteceu em novembro de 2021, quando a investigação foi reaberta

A equipe de checagem da AFP não encontrou, tampouco, qualquer registro de que Jean Wyllys tenha sido intimado a depor até a data de publicação desta checagem. 

O Ministério Público Federal em Minas Gerais também informou à AFP “tratar-se de notícia falsa”, em comunicação encaminhada pela Procuradoria da República em Minas. “Não houve nenhuma intimação da nossa parte”.

Procurada, a Polícia Federal informou somente que “não divulga a identidade de pessoas intimadas”.

Ao Checamos, o advogado de Jean Wyllys,  Lucas Mourão, negou a intimação e disse se tratar de uma “notícia fraudulenta”. 

Tentativa da defesa

A única menção a Jean Wyllys encontrada nos documentos sobre o atentado fala sobre a tentativa dos advogados de Adélio Bispo de convocar o ex-deputado - assim como outros políticos e personalidades públicas associadas à esquerda no Brasil - para testemunhar em defesa do agressor. 

Como registrado nessa checagem da AFP, os advogados de Adélio indicaram como potenciais testemunhas o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2011), a cantora Preta Gil, o jornalista Reinaldo Azevedo e os então deputados federais Jean Wyllys e Maria do Rosário. 

Em dezembro de 2018, um dos advogados de Adélio Bispo, Zanone Manuel de Oliveira Júnior, explicou à AFP que escolheu as testemunhas para que as mesmas pudessem depor “sobre o discurso de ódio de Bolsonaro que, segundo o próprio Adélio, foi o que motivou seu ato”.

O Ministério Público Federal negou, contudo, o pedido da defesa, e nenhum desses políticos ou personalidades foram convocados a depor - como registrado no relatório do juiz federal Bruno Savino e em matérias publicadas na imprensa na época. 

Desaparecido?

As publicações afirmam, ainda, que Jean Wyllys estaria “desaparecido” desde o dia 2 de novembro de 2021. No entanto, o ex-deputado tem publicado frequentemente no Facebook, Instagram e Twitter durante esse período. 

No último dia 24 de dezembro, Wyllys compartilhou no Instagram um vídeo com suas expectativas para 2022 e escreveu, na legenda, que estava “em casa”. 

As matérias mais recentes (1, 2, 3) sobre o ex-deputado também mencionam que ele está morando em Barcelona, onde é doutorando em Ciência Política. 

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