Tratamento alternativo para câncer de mama não substitui intervenção cirúrgica em todos os casos
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- Publicado em 4 de janeiro de 2022 às 23:39
- Atualizado em 6 de janeiro de 2022 às 16:57
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- Por AFP Brasil
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“Câncer no seio não precisa mais fazer cirurgia. Presidente Bolsonaro vai autorizar a importação dessa tecnologia de Israel. Embora chamado de machista, foi o único presidente que se lembrou em primeiro lugar das mulheres… Vamos divulgar!”, diz a mensagem compartilhada no Facebook (1, 2, 3), Instagram (1, 2) e Twitter (1, 2, 3).
Apesar de algumas publicações viralizadas não deixarem claro qual é a técnica que supostamente será importada, outras (1 e 2) usam o mesmo texto associado a um vídeo sobre um método pouco invasivo de tratamento do câncer de mama, chamado crioablação. A técnica consiste na eliminação do tumor através de seu congelamento.
Efetivamente existem instituições israelenses que usam a tecnologia da crioablação no tratamento de alguns tipos de câncer ⎼ entre eles o câncer de mama ⎼ como a IceCure. Em seu site, a instituição informa que o sistema pode ser usado para o “tratamento de tumores benignos e malignos de mama, bem como de câncer renal, pulmonar e ósseo”.
Entretanto, em uma busca na internet, feita em 3 de janeiro de 2022 com as palavras-chave “bolsonaro importação tratamento câncer mama”, não foram encontradas informações sobre a suposta importação pelo presidente Jair Bolsonaro de uma nova tecnologia de Israel que poderia ser utilizada no lugar de intervenções cirúrgicas.
Dentre os resultados, chegou-se apenas a uma notícia de 22 de outubro de 2021, tratando sobre o Governo Federal ter zerado o Imposto de Importação de medicamentos para diversos tipos de câncer, dentre eles o de mama. Mas não há menção a uma nova tecnologia, tampouco a uma possível substituição das cirurgias por outros tratamentos.
Ao Checamos, o Ministério da Saúde informou em 5 de janeiro de 2022 que a crioablação vem sendo testada no tratamento de lesões de mama, “no entanto, ainda não está indicada para tratamento do câncer de mama, dependendo ainda de mais estudos científicos para assegurar a eficiência do método”.
Quanto à incorporação da tecnologia no SUS (Sistema Único de Saúde), o Ministério indicou que “a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) não recebeu solicitação para avaliação desse procedimento”.
O que dizem os especialistas?
A Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM) esclarece em nota que essa técnica “é indicada APENAS PARA mulheres com tumores pequenos (preferencialmente menores que 1cm), únicos, e sem metástases em linfonodos axilares”. Segundo o texto:
Em uma busca pelas palavras-chaves “crioablação” e “congelamento” no site do Instituto Nacional do Câncer (Inca), órgão auxiliar do Ministério da Saúde no desenvolvimento de ações para a prevenção e controle do câncer, não foram obtidos resultados.
Em dois artigos sobre o câncer de mama, tanto na versão para a população, quanto para profissionais de saúde, o instituto divide os possíveis tratamentos da doença em duas modalidades, mas nenhuma inclui a crioablação.
A primeira modalidade mencionada é o “tratamento local” ⎼ que abrange cirurgia, radioterapia, bem como a reconstrução mamária. Já a segunda consiste no “tratamento sistêmico” ⎼ que também inclui a quimioterapia, assim como a hormonioterapia e terapia biológica.
Ao Checamos, o Inca informou em 4 de janeiro de 2022 que “técnicas como a crioablação não substituem os tratamentos atuais para câncer de mama, como quimioterapia, radioterapia e cirurgia”. Isso porque, segundo o instituto, esse método depende “ainda de mais estudos científicos para assegurar a eficiência”.
No mesmo sentido, a Organização Mundial da Saúde (OMS) explica em seu site que o tratamento para o câncer de mama “geralmente consiste em cirurgia e radioterapia para controle da doença (...) e terapia sistêmica (medicamentos anticâncer administrados por via oral ou intravenosa) para tratar e/ou reduzir o risco de propagação do câncer (metástase)”.
Há registros na internet do uso de crioablação pelo Hospital Sírio-Libanês, de São Paulo. Ao Checamos, Marcos Menezes, radiologista e coordenador do centro de intervenção do hospital, reiterou, em 3 de janeiro de 2022, que faltam evidências científicas para utilizar a crioablação como substituta da cirurgia no tratamento de câncer de mama:
Procurado, o Ministério da Saúde não respondeu até a publicação desta reportagem.
Esta verificação foi realizada com base em informações científicas e oficiais disponíveis na data desta publicação.
6 de janeiro de 2022 Acrescenta o posicionamento do Ministério da Saúde enviado em 5 de janeiro de 2022.