Média não é forma adequada de avaliar desempenho da Selic, dizem especialistas

  • Publicado em 7 de janeiro de 2025 às 19:54
  • 4 minutos de leitura
  • Por AFP Brasil
Desde que assumiu seu terceiro mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pressiona o Banco Central (BC) do Brasil a reduzir a taxa básica de juros do país — a taxa Selic. Nesse contexto, uma imagem que compara as médias dessa taxa nos diferentes governos brasileiros acumula mais de 4,6 mil interações nas redes sociais desde julho de 2024. Embora a imagem traga números corretos, especialistas explicam que usar a média da Selic para comparar diferentes administrações não é o mais adequado, pois essa medida omite detalhes importantes sobre o comportamento da taxa de juros.

“Como foi a taxa Selic em cada governo?”, questiona o título da imagem que circula no X, no Facebook, no Instagram e no TikTok. Logo abaixo, a imagem traz uma comparação entre a “taxa básica de juros média durante o mandato” de oito diferentes governos. 

De acordo com o conteúdo, a média da Selic durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (1999-2002) foi de 19,8%; já no primeiro mandato de Lula (2003-2006), foi de 18,4%; no segundo governo do petista (2007-2010), caiu para 11%; no primeiro governo Dilma (2011-2014), a média foi de 9,9%; no segundo mandato de Dilma, de 2015 a 2016, foi de 13,4%; no governo de Michel Temer (2016-2018) foi de 9,3%; no governo de Jair Bolsonaro, de 6,3%; e no terceiro mandato de Lula, a média da Selic estaria em 12,4%.

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Captura de tela feita em 6 de janeiro de 2025 de uma publicação no X (.)

A taxa Selic, cujo nome vem da sigla do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia, é a taxa básica de juros do país e, portanto, influencia todas as outras taxas de juros praticadas no Brasil. Ela é definida periodicamente pelo Comitê de Política Monetária (Copom), do BC, e sua alteração tem impacto no controle da inflação, dentre outros aspectos econômicos. 

De maneira geral, uma diminuição na taxa Selic leva a taxas de juros menores no país, facilitando empréstimos e financiamentos, e estimulando o consumo. Com um maior consumo, a inflação tende a aumentar. De maneira oposta, quando o objetivo é controlar a inflação, a tendência é que o Copom aumente a taxa de juros.

Desde dezembro de 2024, a Selic encontra-se em 12,25%, sendo uma das taxas de juros mais altas do mundo. Em seu terceiro mandato, iniciado em janeiro de 2023, o presidente Lula vem pressionando o BC para reduzir a taxa. 

Nesse contexto, as publicações nas redes sociais comparam a média da taxa Selic durante os mandatos de diferentes presidentes, mostrando que essa média foi menor nos governos de Michel Temer e de Jair Bolsonaro.

Uma análise feita pelo AFP Checamos a partir do histórico da taxa, disponibilizado pelo BC, mostrou que, numericamente, os valores mostrados na imagem viral estão corretos.

No entanto, especialistas ouvidos pelo Comprova — projeto de verificação colaborativo do qual o AFP Checamos faz parte — explicam que comparar a média das taxas não é uma análise adequada.

Em julho de 2023, o Comprova analisou outro conteúdo desinformativo semelhante, que também apresentava uma comparação entre as médias da Selic nos diferentes governos. 

Na ocasião, o professor do Insper André Filipe de Moraes Batista disse ao Comprova que “a média não é o instrumento mais adequado para mensurar a complexidade dessa questão”. Segundo o docente, seria mais interessante olhar quanto a taxa estava quando determinado presidente assumiu o cargo e como estava quando saiu.

Aplicando esse critério ao governo de Jair Bolsonaro — que possui a menor média do conteúdo viral —nota-se, por exemplo, que a Selic estava em 6,5% quando o ex-mandatário assumiu o cargo, e subiu para 13,75% ao final de seu governo. 

“Colocar um grupo de 30 pessoas que recebem um salário mínimo junto com Bill Gates em uma sala vai fazer essas pessoas virarem milionárias, em média. Mas isso não significa que em suas particularidades, de fato, elas são”, afirmou Batista.

Veja como estava a taxa Selic ao início e ao final de cada governo citado na imagem viral:

De maneira semelhante, a doutora em Economia Arilda Teixeira reforçou que a média da Selic não deve ser usada para comparar a economia de governos e pontuou que é necessário considerar o impacto da pandemia sobre a taxa Selic durante o governo Bolsonaro. 

“Reduziu-se o consumo, então, é lógico que os preços caíram em uma proporção e intensidade acima do que vinha acontecendo antes”, afirmou.

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