É enganosa a alegação de que o STJ decidiu que o porte de arma para traficantes não é crime
- Publicado em 6 de dezembro de 2024 às 22:15
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- Por AFP Brasil
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“Portar uma arma ilegalmente para… Proteger sua família: crime. Traficar drogas: NÃO é crime. Parece piada, mas é só o Judiciário brasileiro”, lê-se em uma publicação feita pelo Partido Novo. Alegações semelhantes circulam no X, no Facebook, no Kwai, no Instagram e no TikTok.
As publicações compartilham capturas de tela de artigos dos sites Conjur e JuriNews que repercutem um entendimento fixado pelo STJ a respeito do porte ou posse ilegal da arma associado ao tráfico de drogas.
A alegação de que o STJ teria permitido o uso de armas para o tráfico circula desde 2021 e já foi verificada pela AFP em 2023. Na época, as publicações distorciam uma decisão sobre um caso de tráfico de drogas em que uma arma foi apreendida.
Entretanto, o tribunal não liberou o uso de armas para traficantes.
Entenda a decisão
Em 27 de novembro de 2024, em votação unânime, o STJ fixou o entendimento de que o uso de arma de fogo para a prática de tráfico de drogas não deve levar a uma condenação pelo crime de posse ou porte ilegal, mas ao aumento da pena do crime de tráfico.
Nesse caso, ocorre a absorção ou consunção, ou seja, a posse ou o porte ilegal da arma é absorvido pelo crime de tráfico de drogas.
“A arma de fogo, nesse contexto, não é considerada um delito autônomo, mas uma ferramenta essencial para a execução do crime principal, ou seja, o tráfico. Dessa forma, a conduta referente à arma de fogo é absorvida pela prática do outro delito, evitando, assim, a duplicidade de punição”, diz um informativo da corte sobre a decisão.
Em entrevista à AFP em 2023, a advogada criminalista e professora da FGV Direito Rio Maíra Fernandes explicou que a absorção “se aplica quando um mesmo fato pode ser abarcado por mais de um tipo penal”: “Se um crime é meio para realização de outro crime-fim, não pode ser o sujeito que os praticou responsabilizado por ambos os crimes”.
A advogada apontou que esse não é o único caso em que pode ocorrer a absorção. “Aplica-se a consunção quando um sujeito invade uma casa para realizar um furto. Nesse caso, ele não responderá por dois delitos, invasão de domicílio e furto. Ele vai responder apenas pelo crime de furto em sua forma qualificada”, exemplificou.
Ainda em 2023, o STJ reiterou ao Checamos que esse entendimento é adotado desde 2012 e que “não se trata de absolvição de crime”.
“O crime de porte ou posse ilegal de arma pode ser absorvido pelo crime de tráfico, se ficar provado que o primeiro está relacionado diretamente à prática do segundo. Se não houver absorção, o acusado poderá ser condenado pelos dois crimes separadamente, com a soma das penas”, informou.
Referências
- Decisões do STJ de 2012, 2021 e 2024
- Informativo do STJ sobre o julgamento de 2024